domingo, 25 de agosto de 2024

Um nome - uma história e o 1° cemitério católico de Blumenau realocado - Por José Ferreira da Silva


O primeiro Cemitério Católico de Blumenau estava localizado aos fundos da Igreja Matriz, quando ainda era o edifício neogótico projetado e construído por Heinrich Krochberger, inaugurado em 24 de janeiro de 1876, quando o pároco era o Padre José Maria Jacobs.

A antiga Igreja Matriz de Blumenau antes da reforma, da ampliação e colocação dos novos sinos - Acervo do IBGE .
Igreja Matriz de Blumenau projetada por Krohberger e
após reformas efetuadas entre 1920 e 1928.
Relembrando, em 1854 chegaram os primeiros alemães católicos na Colônia Blumenau. Oito destes eram austríacos, como a personagem do texto que mostramos assinado por José Ferreira da Silva. Em 1864, foi construída a primeira capela, na qual o primeiro Padre a oficiar uma missa, foi o Padre de Gaspar Alberto Francisco Gattone. O Padre Gattone foi um grande incentivador, junto ao fundador da Colônia Blumenau sobre a importância de se construir uma comunidade católica no Stadtplatz de Blumenau. Incentivou a construção da Capela, onde foi celebrada sua primeira missa em  25 de janeiro de 1865 junto com a 1° Festa em honra ao Padroeiro São Paulo Apóstolo.
Hermann Blumenau desejava uma comunidade católica para conseguir a emancipação da Vila junto ao Imperador D. Pedro II católico e também a necessidade do curato, como acontecia em todo o império. Blumenau era praticamente 100% luterana. Blumenau foi atrás disso e contratou Krohberger para construir o novo edifício da igreja católica local, também no estilo Neogótico, como a luterana localizada no Stadtplatz
Em setembro de 1868, foi colocada a pedra fundamental da Igreja Matriz projetada por Heinrich Krohberger, no mesmo local da atual Catedral. Em 1873, através da Lei Provincial 694, de 31 de julho, foi criada a Freguesia de São Paulo Apóstolo. 
Três anos depois chegou o Padre José Maria Jacobs, o primeiro pároco da comunidade, que em 24 de janeiro de 1876 abençoou a nova igreja. Atrás dela, logo também surgia o cemitério, no morro aos fundos.
Ao contrário do histórico Cemitério Luterano Centro que preserva nomes da história de Blumenau e também se manteve no seu local de origem desde os primeiros anos de história de Blumenau, o Cemitério Católico, foi realocado através do translado das pessoas sepultadas do local, em sua maioria, para o atual Cemitério São José,  durante o vicariato de Frei Daniel Hostin, cujos trabalhos foram iniciados em 1862 e se prolongaram até a metade do século XX. 
Quando Pe. José Maria Jacobs chegou na comunidade, havia somente 5 famílias católicas (61 pessoas) no centro da Colônia Blumenau, número que mudou menos, de 10 anos após, com a chegada dos imigrantes austríacos e italianos.

...este morro era o responsável pela situação da igreja, muito perto da rua 15 de novembro, que passa uns sete metros mais abaixo; também já havia prejudicado o alinhamento da capela do Convento, obrigando a construção a estreitar-se para os fundos. Não seria possível demolir a igreja antiga antes que a nova já pudesse ser usada; além disso a construção nova deveria ficar um pouco mais retirada da rua. Antes de mais nada, tinha o morro de desaparecer. Desde longa data já vinha sendo cavado no referido morro, mas o trabalho era árduo, pois não havia apenas terra, mas blocos de pedra e estratificações irregulares em diversos graus de formação e dureza. O trabalho exigia o emprego constante de picareta e alavanca; só em parte e com moderação podia ser feito uso de explosivos, assim mesmo arriscando as vidraças e o telhado da capela do Convento e das demais construções. Foi o Rev. Pe. Frei Joaquim Orth que, durante sua estada aqui como guardião e vigário, resolveu retomar definitivamente o trabalho de arrasamento do morro. Comprou um caminhão próprio para transporte de terra e contratou uma turma de operários, que trabalhavam ativamente desde 1º de julho de 1949 até dezembro de 1951. Finalmente, a 16 de fevereiro de 1953 foi retirado o último caminhão de entulho...”. Frei Valdemar do Amaral - dezembro de 1956.

O ex-prefeito de Blumenau José Ferreira da Silva, nome que contribuiu muito pela organização e preservação documental histórica de Blumenau,  escreveu um artigo que conta a história de uma família austríaca e o cemitério católico antigo de Blumenau. É um relato interessante e parte de uma história que praticamente é inexistente,  a partir do início do século XX.

Segue o texto de Ferreira da Silva:

O velho cemitério católico de Blumenau ficava por detrás da Igreja Matriz, numa elevação de onde se avistava toda a parte leste, acompanhando a grande curva do  Itajaí que forma a chamada Ponta Aguda.
Para o saneamento e urbanização do local, que fica mesmo no coração da cidade, foi necessário demolir o campo santo e arrasar a colina.
A velha cidade dos mortos era um lugar pitoresco, com os seus ciprestes anosos, as suas azáleas vermelhas sempre em flor, os seus milhares de lírios brancos saturando o ambiente de agradável perfume. Era um recanto de paz, de tranquilidade, com as suas cruzes e monumentos a assinalar a derradeira morada dos que a morte ia colhendo na sua faina im piedosa, inexorável. 
Ali não estavam enterrados, apenas, os primeiros colonos que, como Doutor Blumenau à frente, concorreram para o engrandecimento da Colônia. Nem todas aquelas sepulturas guardavam restos de imigrantes, de seus descendentes que viveram a vida simples e pura, monótona e produtiva do camponês ativo, laborioso.
Therese Stutzer.
 Algumas escondiam segredos de vidas aventurosas; outras, romances de amor, outras, exemplos de fé, de sacrifício, de resignação.
Eu conheci ali um túmulo que sempre me chamava a atenção. Era de tijolos e cimento e trazia uma lapide de mármore branco com esta inscrição em alemão, em letras góticas, douradas: "Aqui descansa, no Senhor, Leontina, baronesa de Wendlingen, nata Condessa Palacку".
Não era para menos que despertasse a curiosidade de qualquer um, um  epitáfio assim tão aristocrático na burguesa e pacata Blumenau de anos atrás.
E eu nunca viria a conhecer o romance daquela, cujos restos ali descansavam, se não me tivesse vindo as mãos o livro de Teresa Stutzer "Am Rande des brazilianischen Urwaldes". 
Essa escritora, que viveu alguns anos em Blumenau, conta-nos a historia emocionante da baronesa Leontina, um romance comovente, um exemplo de como a Providência tece os destinos dos homens, à revelia destes, destinos ás vezes caprichosos, que se cumprem å risca, por mais absurdos que pareçam nos seus detalhes. Um romance que começa numa modesta aldeia da Áustria e vem terminar na bucólica Blumenau, embalada ao doce murmúrio das águas calmas do majestoso Itajaí.
Em meio ao calor, à fervilhante alegria de uma noite de baile na corte do grã-duque Maximiliano da Áustria, Leontina, dama de companhia da grã-duquesa Carlota, conheceu o jovem tenente de Wendlingen. Este, descendente de nobre estirpe de grandes oficiais do exército austríaco, não sendo o primogênito, teve que ingressar na carreira das armas e, em 1864, era Ajudantes-de-ordens de Maximiliano que, deveras, o estimava. 

D. Carlota da Bélgica.

Ferdinand Maximilian Joseph Maria.
Leontina e o Tenente amaram -se. E amaram-se como dois jovens belos, cheios de vida e saúde, podiam amar-se, Ambos, porém eram pobres, embora descendentes de famílias abastadas.
Quis o destino que Napoleão Bonaparte voltasse as suas vistas à Corte Austríaca para ali encontrar um imperador para o México, recentemente conquistado. O grã- duque Maximiliano foi o escolhido. Este, de principio, tentou opor embargos à honrosa escolha. Sabia bem a quanto se arriscava, acedendo aos caprichos do corso. A ambição de Carlota, porém, soube demovê-lo. Chegava, enfim, à concretização de sonhos sempre acalentados, de ostentar à fronte a coroa imperial. Imperatriz do México! E Maximiliano acedeu. E, no mesmo dia em que, com pompas jamais vistas, foi ele proclamado Imperador do México, Leontina e Wendlingen, agraciados com títulos e doações, uniam para sempre os seus destinos. Casaram-se. Casaram-se e foram escolhidos para fazerem parte da comitiva que deveria acompanhar os novos soberanos ao seu posto no Novo Mundo
A bordo do navio que transportava a luzida corte, muita gente ia pensativa, apreensiva, cheia de maus. presságios. Assim o imperador. Mas Leontina e o jovem esposo iam alegres, felizes. O futuro não os preocupava. Debruçados à amurada do barco, de mãos dadas, encaravam o céu e o oceano; azuis e intermináveis, com a despreocupação de quem só pensa no seu amor e na sua felicidade. Wendlingen fora o primeiro e único amor de Leontina que, de um convento, viera para o serviço da grã-duquesa. Amava-o, pois, com a enternecida pureza dos anjos. E viveram felizes, muito felizes, nos primeiros tempos.
Depois, veio a catástrofe. A revolta, a prisão do imperador e dos da sua corte, inclusive Leontina e Wendlingen. A fortaleza de Quaretaro, a sentença de morte, luto e lágrimas.
Na sua grande dor, Leontina tudo fez para salvar o imperador e o esposo, Arrojou-se aos pés de Juarez, lavou-lhe com lágrimas as botas grosseiras, implorou, pediu desesperadamente. Juarez mandou riscar os nomes da corajosa dama e de Wendlingen da lista dos que seriam fuzilados. Mas o imperador morreu corajosamente, traspassado pelas balas do pelotão de fuzilamento.
Desapareceram, porém, das lindas faces de Leontina as róseas cores que lhe davam tanta graça e tanto encanto. Nem já o filhinho, fruto de um grande e abençoado amor, conseguia fazer-lhe voltar o sorriso aos lábios emurchecidos. Wendlingen ouviu falar que no Rio de Janeiro talvez conseguisse ser admitido como oficial do exército imperial. Obtida a devida permissão, embarcou-se com a esposa e o filho para a capital brasileira. Longos dias, semanas e meses de angustiosa espera. As jóias e objetos de uso doméstico iam sendo vendidos um atrás do outro. E a saúde de Leontina, dia a dia, se tornava mais precária. Não lhe saía da mente a horrível cena a que assistira em Quaretaro. Ia definhando, como a flor arrancada à haste em que desabrochara. Wendlingen, um dia, ao beijá-la, sentiu que a febre queimava os lábios da esposa amada. Sem mais esperanças de emprego no Rio, seguiu o conselho de patrícios seus que lhe recomendavam viesse para o Sul, onde um clima mais ameno e um convívio mais íntimo com gente de origem e fala germânicas, talvez trouxessem à infeliz Leontina algum lenitivo. E, assim, a desgraçada família veio ter a Blumenau. Mas, Leontina já não era nem mesmo a sombra do que fora. Os beijos ardentes e apaixona- dos do marido tentavam reanimá-la. Mas, ela morria aos poucos. Morria delirando, falando ora em seus dias de felicidade, ora nos tempos do convento, cantando salmos entre volutas de incenso a subirem, com ela, para o altar do Senhor. Pouco depois, expirou nos braços do esposo amado.
E seu corpo foi repousar à sombra dos ciprestes do velho cemitério colonial.
Wendlingen embarcou o filhinho num navio, de volta à Áustria, para que seu irmão mais velho e os parentes de Leontina se encarregassem da sua educação,
E ele, o infeliz Ajudante de Sua Majestade, o Imperador do México, conseguiu um lugar de professor de primeiras letras e, todas as tardes, depois de dar cumprimento às obrigações do cargo, subia vagarosamente a colina e ia sentar-se junto ao túmulo de Leontina, relembrando o seu amor, chorando a sua saudade... José Ferreira da Silva

Leontina, baronesa de Wendlingen (Baden-Württemberg), Condessa Palacку (Techoslováquia) e era conhecida como Austríaca.

Wendlingen é uma cidade da Alemanha, localizada no distrito de Esslingen, na região administrativa de Stuttgart, estado de Baden-Württemberg. A cidade foi criada através da fusão de duas comunidades em 1940.

Wendlingen.

A atual cidade de Wendlingen am Neckar foi criada em 1° de abril de 1940 a partir das comunidades anteriormente independentes de Wendlingen com Bodelshofen e Unterboihingen em 6 de junho de 1939 por ordem do governador do Reich de Württemberg , Wilhelm Murr . Nesse momento foi adotado o nome de Wendlingen am Neckar.
Após a Segunda Guerra Mundial, recebeu uma grande população de migrantes de famílias alemãs de Egerland, Tchecoslováquia que teve como consequência um aumento significativo da população. Em 27 de agosto de 1966, a cidade de Wendlingen am Neckar assumiu o patrocínio dos Egerländer, em Baden-Württemberg. Com esta população da Tchecoslováquia veio a tradição do Festival de São Vicente da cidade de Eger, em Staufer. Desde 1952, o Festival de São Vicente tem sido celebrado continuamente com o Egerländer Gmoi e as associações locais e de trajes tradicionais como um dos maiores festivais tradicionais de Baden-Württemberg.
Em 15 de dezembro de 1964, o governo do estado de Baden-Württemberg deu ao município de Wendlingen am Neckar, no antigo distrito de Nürtingen, o estatos de “cidade”. 

Colocamos um pouco sobre a cidade da família nobre do marido da personagem histórica apontada por Ferreira da Silva, LeontinaWendlingen, porque sua história tem ligação com a história dos migrantes de Egerland e de onde o nome de solteira de Leontina, tem ligação, pois Ferreira a denominou Condessa Palacку, nome de uma cidade que é a atual cidade da República Tcheca Olomouc e onde está a Universidade Palacку, podendo, portanto ter sido a terra natal da família de Leontina.

Curiosidade: 
D. Maria Amélia de Bragança
Ferdinand Maximilian Joseph Maria, o Imperador do México, foi primo de D. Pedro II. Era o irmão mais novo do imperador Francisco José I da Áustria. Após uma distinta carreira na marinha austríaca, ele aceitou a oferta de Napoleão III da França para ascender ao trono mexicano.
Maximiliano foi marinheiro por vários anos, vivendo bastante tempo em alto-mar; conheceu a princesa D. Maria Amélia de Bragança, filha de D. Pedro I do Brasil e D. Amélia de Leuchtenberg. apaixonaram-se e ele teria planejado se casar com a princesa brasileira, mas ela faleceu antes, na Ilha da Madeira, em 1853. De luto com a perda, Maximiliano passou a usar um anel contendo um cacho de cabelo da falecida princesa.
Gostaríamos de ter tido a oportunidade de fotografar o túmulo  histórico, junto a Catedral São Paulo Apóstolo, de Blumenau, de Leontina, a baronesa de Wendlingen, nascida Condessa Palacку.

Um Registro para a História!

Eu sou Angelina Wittmann, Arquiteta e Mestre em Urbanismo, História e Arquitetura da Cidade.
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                           Cultura História Antropologia 
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