Deutsche Welle
Na região de Eichsfeld, museu relembra a vida na área limítrofe entre as antigas Alemanhas Ocidental e Oriental. Divisão do país persistiu por mais de 40 anos.
Quem viaja hoje da pequena cidade alemã Duderstadt em direção ao leste do país tem o caminho livre. Mas lá, há pouco mais de 20 anos, ficava a fronteira entre as duas Alemanhas (Oriental e Ocidental) – uma área altamente vigiada. O Museu da Fronteira Eichsfeld, localizado na região, procura trazer informações sobre este capítulo obscuro da história alemã, para que ele não caia no esquecimento.
Mais de quatro mil peças expostas em 1200 metros quadrados resgatam a sensação de viver na fronteira entre as duas Alemanhas. Situado num prédio onde antigamente funcionava o controle de fronteiras Worbis, o museu chama a atenção com seu prédio moderno, mas que remete à estética do chamado "socialismo realmente existente". "E do lado de fora temos instalações de fronteira originais expostas numa área de 300 metros", diz Ben Thustek, diretor pedagógico do museu.
País dividido
A partir de 1949, uma fronteira de 1400 quilômetros de extensão passou a separar as duas Alemanhas – de início de maneira nem tão rígida como se imagina. Várias das imagens reproduzidas na exposição mostram que a linha fronteiriça entre os dois blocos políticos (ocidental e oriental) existia de início somente nas cabeças dos políticos e militares.
No começo, os moradores de um lado podiam circular pelo outro lado praticamente sem problemas. Os agricultores da região, por exemplo, cuidavam de suas terras localizadas em muitos casos do outro lado da fronteira oficial. Somente a partir de 1952 é que a então República Democrática Alemã (RDA) passou a controlar as fronteiras, pois o número de pessoas que estavam deixando o país para viver no lado ocidental aumentava a cada dia.
Foi criada então uma "zona proibida" junto à fronteira, com cinco quilômetros de largura. Dentro desta zona, foi estabelecida uma "faixa de proteção" de 500 metros de largura e outra faixa de controle, com 10 metros de largura, de onde era vigiado o fluxo de pessoas entre as Alemanhas Ocidental e Oriental. "Quem cruzar a fronteira deve ser detido ou eliminado", dizia um documento de instrução aos soldados que patrulhavam a fronteira na época, hoje exposto no museu.
Vida na fronteira
Prédio do Museu da Fronteira
"Área periférica das zonas de ocupação" era a forma como os alemães ocidentais ironizavam as faixas de terra que ficavam próximas à fronteira com a RDA. "Sob o ponto de vista ocidental, o mundo acabava claramente aqui", diz Ben Thustek. "As pessoas que moravam na região nunca aceitaram isso. Elas sempre insistiam numa abertura da fronteira", completa o diretor pedagógico do museu.
Durante muito tempo, essa fronteira foi um ponto procurado regularmente por turistas, destino de muitos ônibus da Alemanha Ocidental e de outros países, cheios de visitantes curiosos para ver de perto a Alemanha Oriental. Fotos do museu mostram casais de noivos na área de fronteira. Uma forma de celebrarem com parentes da "outra" Alemanha.
Mas enquanto os alemães ocidentais podiam se movimentar livremente até a fronteira, a vida do outro lado era altamente regulamentada. Os alemães orientais só podiam se aproximar da fronteira com um passe especial. Estabelecimentos comerciais, bares e cinemas nesta região fronteiriça foram pouco a pouco fechando as portas. Quem morava na zona proibida tinha que ter um carimbo especial na carteira de identidade para poder chegar em casa.
Por todos os lados havia espiões da polícia política da RDA, a Stasi. Eram permitidos até controles policiais em residências, mesmo quando não previamente anunciados. Para atrair moradores a essas áreas, o governo da RDA instalou indústrias. Em Leinefelde, por exemplo, foi criada a maior tecelagem da Europa na época.
No entanto, a sensação de segregação não era eliminada pelo incentivo financeiro. A partir de 1972, o governo da Alemanha Oriental passou a aceitar um "reduzido fluxo de pessoas na fronteira", do qual o cidadão poderia participar – algo que não era, contudo, fácil: o requerimento para a viagem tinha que ser entregue com seis semanas de antecedência e muitos pedidos eram simplesmente negados sem qualquer explicação. Na hora da volta para casa, depois de um passeio pela Alemanha Ocidental, muitos alemães orientais tinham as mercadorias que haviam adquirido no lado ocidental confiscadas e também livros proibidos na RDA apreendidos.
"Ação Parasitas"
Em 1952, a Stasi conduziu o que chamou de "Ação Parasitas" na região de fronteira do país. Cerca de 15 mil pessoas que viviam na área fronteiriça de cinco quilômetros com a Alemanha Ocidental foram obrigados a deixar suas casas. O aviso de evacuação definitiva foi dado só poucas horas antes e aos moradores só foi permitido levar algumas coisas – seus bens foram simplesmente confiscados pelo Estado.
Os postos de controle foram se tornando cada vez mais severos e perigosos – o que fica visível nas peças expostas no museu. Em 1961, aconteceu, apesar disso, uma fuga espetacular em massa de cidadãos da Alemanha Oriental. Na localidade de Böseckendorf, 53 moradores (quase metade dos habitantes do vilarejo) fugiram no meio da madrugada para o Ocidente. O fato envergonhou os líderes da Alemanha Oriental, que acirraram a partir de então ainda mais o controle de fronteira.
O início do fim
Böseckendorf: fuga em massa do vilarejo
A RDA impedia que seus habitantes deixassem o país, usando estratégias de controle caríssimas, que acabaram contribuindo para a própria derrocada do regime. "As despesas homéricas com a segurança das fronteiras certamente contribuíram para fragilizar o governo", acredita Ben Thustek. Outro ponto lembrado pelo museu é a morte de cerca de mil pessoas, assassinadas quando tentavam passar para o lado ocidental. Para aproximadamente 40 mil pessoas, a fuga acabou bem.
Depois de conhecer o museu, o visitante pode passear diretamente pela antiga faixa de fronteira entre os dois países. Num percurso de seis quilômetros, a partir do museu, é possível seguir o caminho paralelo à ex-fronteira de então, onde ainda há resquícios da divisão do país, como uma torre de controle.
Com sua localização precisa, o Museu da Fronteira Eichsfeld reconstrói de maneira detalhada e interessante aos olhares contemporâneos a divisão alemã e a vida naquela que foi possivelmente a faixa de terra mais bem vigiada do mundo. Embora esta não seja, como acentua Thustek, a única meta da instituição, mantida através de recursos privados. "Somos museu, memorial e instituição educativa ao mesmo tempo", completa ele.
Mais de duas décadas depois da queda do muro, o prédio é um lugar importante dedicado à lembrança daquele período histórico, servindo de memorial não somente às vítimas fatais da política de fronteiras da RDA, mas também como registro para todos os que vivenciaram uma Alemanha dividida durante 40 anos.
- Data 09.03.2014
- Autoria Marc von Lüpke-Schwarz (sv)
- Edição Roselaine Wandscheer
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