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Inglês nascido em 15 de abril de 1924 comemora seu aniversário com uma turnê pela Europa, à frente da orquestra Academy of St. Martin in the Fields. Com ela, Marriner redefiniu a interpretação do repertório barroco.
No início da década de 1960, Neville Marriner e sua Academy of St. Martin in the Fields estabeleceram novos parâmetros para a execução da música barroca. Suas gravações ao vivo de concertos de Händel, Corelli e Vivaldi soavam novas e excitantes: há muito, a "música antiga" não irradiava tanta vitalidade e frescor.
Marriner batizou sua orquestra de câmara especializada no repertório barroco e clássico com o nome da igreja londrina de Saint Martin-in-the-Fields, onde realizou seu primeiro concerto. A partir dos anos 70, o inglês tornou-se um regente disputado, tendo ocupado o posto de maestro titular da Los Angeles Chamber Orchestra, da Minnesota Orchestra e da Orquestra Sinfônica da Rádio de Stuttgart.
Aos 90 anos, Neville Marriner ainda é uma presença assídua no pódio. "Eu morreria se parasse de reger", afirmou recentemente ao jornal alemão Frankfurter Allgemeine Zeitung. E, embora mundialmente aclamado, ele se considera sempre como um artesão, um operário da música, a serviço dos compositores.
Início como violinista
"Na música, é preciso começar a aprender de lá de baixo", é a recomendação de Marriner aos jovens músicos. Ele começou a própria carreira como violinista. Após se formar pelo Royal College of Music de Londres, tocou na London Symphony Orchestra sob a batuta de eminências como Arturo Toscanini, Wilhelm Furtwängler e Herbert von Karajan.
Já nessa época, começou a se interessar intensamente pela música pré-clássica, dos períodos barroco e renascentista. Na década de 50, esse repertório ou era totalmente ignorado pelas grandes orquestras sinfônicas, ou executado com páthos romântico.
"Na época, até mesmo Mozart era tocado muito mais lento e pesado, por orquestras gigantescas e músicos entediados", recordaria mais tarde. "Tal modo de execução tirava toda a vitalidade dessa música."
Sem qualquer intenção de fundar um conjunto ou mesmo de dar concertos, Marriner passou a convidar regularmente instrumentistas conhecidos à sua casa, para executarem juntos música dos séculos 17 e 18, em convivência democrática.
"Nós tocávamos simplesmente por prazer, todos queríamos ter responsabilidade própria, mais do que era possível numa orquestra normal. Na Academy, cada músico podia opinar e colocar sua visão pessoal. E isso era extremamente divertido."
Práticas históricas em instrumentos modernos
Desde o fim da Segunda Guerra Mundial, Marriner conhecia o jovem musicólogo Robin Thurston Dart, que – assim como ele – rejeitava as interpretações romantizadas das peças barrocas e procurava se orientar pelas fontes históricas sobre a prática de execução musical.
Dart se tornou o principal elemento impulsionador da "orquestra de sala de estar" de Neville Marriner. "Ele nos ensinou a encarar essa música com outro estilo, e nós descobrimos como ela podia ser maravilhosa."
Contudo, enquanto o musicólogo, mais tarde, insistiria na adoção de instrumentos históricos como forma de garantir a autenticidade, Marriner e seus amigos não queriam renunciar a seus violinos, violas e violoncelos modernos. E assim a Academy desenvolveu uma "prática mista de interpretação musical".
"Na época decidimos, por um lado, nos orientar segundo as mais recentes descobertas sobre a interpretação histórica, mas adaptando-as à execução em instrumentos modernos." Esse estilo se tornou a marca registrada da Academy of St. Martin in the Fields e de seu fundador.
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Assumindo o pódio do maestro
O democrático conjunto fez seu primeiro concerto em público em 1959. Os álbuns lançados logo em seguida – que incluíam compositores então praticamente desconhecidos, como Albicastro, Geminiani ou Torelli – se tornaram sucesso de vendas. No rádio, nenhuma outra orquestra de câmara era tão tocada quanto a Academy: Neville Marriner descobrira uma lacuna de mercado.
"As pessoas estavam simplesmente curiosas sobre a música barroca, e o seu apetite era insaciável", conta o maestro. "Nós éramos um conjunto bem jovial, dinâmico, e dava para se escutar isso nos nossos concertos e gravações. De repente, Haydn, Mozart, Beethoven soavam completamente diferente de como com uma orquestra sinfônica."
Ao longo dos anos, a Academy foi se expandindo. No início, Marriner ainda a dirigia como spalla, a partir da estante do primeiro violino. Porém com o aumento numérico tornou-se necessária a presença de um regente.
O impulso decisivo partiu do famoso maestro Pierre Monteux (o qual, entre outros feitos, em 1913 fora o responsável pela estreia da Sagração da Primavera, de Stravinsky). Após um concerto, ele foi até Marriner e perguntou por que ele não regia. Em seguida, convidou-o a frequentar um curso avançado em sua escola para regentes e instrumentistas de orquestra, nos Estados Unidos.
"Essa era uma coisa que eu, na verdade, jamais cogitara. Eu me sentia, de fato, muito bem no papel de primeiro violino líder. Mas logo notei que a batuta possui qualidades mágicas: depois de tê-la na mão uma vez, eu não queria mais largar."
Enquanto chefe de orquestra, Marriner fez sua a máxima de Monteux: "Nada de movimentos desnecessários ao reger, tenha a partitura na cabeça, e não a cabeça na partitura." Até hoje ele conquista toda orquestra sem grande alarde, rege com gestos econômicos, porém decididos, em constante contato visual com seus músicos.
"A maioria das orquestras odeia regentes que ficam remando o tempo todo com os braços", observa. "Com isso, pode ser que eles divirtam o público, mas na orquestra, só causam confusão."
Saudável através da música
Dez anos atrás, em seu 80º aniversário, a intenção de Marriner era reduzir suas atividades profissionais. Porém a "magia da batuta" não o deixou, e ele segue sendo solicitado pelas grandes orquestras internacionais. Até meados deste ano, estará com a Academy of St. Martin in the Fields em turnê de aniversário pela Europa.
O nonagenário ainda rege a "menina dos seus olhos" com incrível "vivacidade e gentileza", como constatou surpreso o crítico do Daily Telegraph John Allison.
"Tenho uma saúde mais ou menos boa", revela o maestro com um sorriso. "Como nos últimos 60 anos tenho estado sempre em turnês, para mim isso virou uma forma de programa de fitness. Tem gente que lê muito ou faz palavras cruzadas, para manter a mente alerta. Eu faço isso ao me ocupar constantemente da música."
- Autoria Marita Berg / Augusto Valente
- Edição Roselaine Wandscheer
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