Acervo: AHJFS. Pasta Família Blohm Doc. 2b.54.1 |
Em uma carta a seus avós que ficaram na Alemanha, Rose Gaertner (1860) comenta que os vestidos trazidos da Alemanha eram usados em ocasiões especiais, solenes e festivas.
Rose Gaertner. |
“Nossos trajes são tão simples. Nós mulheres, vamos com saias e blusas, em geral descalças ou de tamancos naturalmente ficamos alegres. Nos dias de festas, botamos nossas vestes da Alemanha e vamos a Igreja” (SAMETZKY, 1860).
“Vestes da
Alemanha” também pode ser interpretada como sendo o traje típico alemão. Na colônia deixaram de fazer uso das vestes típicas. O alemão usava o traje, o qual carregava significados regionais das regiões do território que seria Alemanha, em 1871. Estes trajes não eram adequados para o clima subtropical, com predominância de temperaturas quentes e úmidas, ou com a situação
econômica da maioria dos imigrantes. Eram geralmente confeccionados com linho e lã.
Hermann Blumenau vendeu uma serraria velha e quebrada ao adolescente Gottlieb Reif, cujo pai Johannes August Reif (sepultado no cemitério luterano de Itoupava Norte/Seca) concertou e então, depois da enchente de 1880, Reif vendeu para a família de Claus Steen. O genealogista de descendente de família pioneira da Colônia Blumenau - Ivar Petersen, que reside há mais de 30 anos em Frankfurt an Main, Alemanha e que acompanha atentamente nossas pesquisas, pois escreve um livro sobre a saga de sua família em Santa Catarina, nos enviou este precioso registro dos Steen, seus antepassados e confirma a história. O registro foi publicado na história de Gottlieb Reif. Registro da Família de Claus Steen - Atrás de pé, da esquerda para a direita: Carl Wilhelm Jens, Wilhelmine Bertha Christine (avó de Petersen), Ana Dorothea Caroline, Hermine Margarethe Friederike e Heinrich Albert Carl. Sentados, da esquerda para a direita: Emil Theodor Nicolaus, ao lado do seu pai Claus Jochim Hinrich, no centro a mãe da esposa dele Margaretha Wilhelmine Johanna Kay, e a esposa dele Catharina Johanna, nata Kay (bisavó de Petersen) e sua filha mais nova Elise Johanna Agnes. Observar como estão vestidos caprichosamente, no entanto as crianças não usam sapatos. |
Mas retornemos ao calçado usado na Colônia Blumenau. Nas primeiras décadas, muitos dos imigrantes confeccionavam seu próprio calçado. O tipo mais fácil de confeccionar e usado, também é usado na Alemanha (até os dias atuais - em algumas regiões), era o tamanco de madeira e couro, chamado de Holzpantoffel, na Alemanha e na Colônia Blumenau. Uma das variações desse tipo de calçado, também era conhecido como Galosche.
Em tempos passados, haviam locais na Europa, onde todo o sapato era feito de madeira e para isto usavam ferramentas especiais. Atualmente é símbolo de algumas destas regiões - como na Holanda por exemplo.
Na imagem abaixo - feita na região de Nürnberg - tipos de "Tamancos" confeccionado artesanalmente na Alemanha - e também nos dias atuais. Muitos destes foram reproduzidos no Brasil, em diferentes recortes de tempo. Podemos observar, que não somente em colônias alemãs, como o tipo Sandale, adotado como calçado feminino somente.
Registro em vídeo que fizemos em maio de 2016, que mostra artesões atuais confeccionando tamancos ou Galoschen.
Registro em vídeo que fizemos em maio de 2016, que mostra artesões atuais confeccionando tamancos ou Galoschen.
Vídeo
Na Colônia Blumenau, usavam as ferramentas que tinha ao seu alcance. Nós vimos pessoas usando este calçado na região e também na Alemanha - até os dias atuais.
Encontramos o depoimento de um imigrante alemão da Colônia Blumenau que deixou de usar o sapato e passou a usar o tamanco feito de madeira e couro - no século XIX.
Foto de Lúcia Hauptli |
"Meu marido me fez perder este hábito, explicando que não era bom consumir muito sal em clima quente. Certamente ele estava certo, pois tive problemas de aclimatização, tendo muita coceira em conseqüência de furúnculos nos pés. Eu não conseguia calçar sapatos e mancava em tamancos de couro cujas pontas, como num lamento, apontavam para o céu. Ao acordar, as dores, o formigamento e as pontadas nos pés eram bastante desagradáveis até me movimentar, então se tornava mais suportável até que um movimento mais brusco provocava novamente dor. Os banhos 11 com água morna e sabão sempre aliviavam. Mas isto também passou. O sangue consistente e a gordura alemã precisavam se adaptar, eu emagreci muitos quilos e, mais tarde, adquiri a tão em moda figura esbelta." (HERMANN, 2003, p.21-22).
Alemanha. |
O desuso do calçado na vida quotidiana dos imigrantes é percebido também na maneira de vestir destes. Esta situação era apreciada, principalmente pelas crianças, pela liberdade proporcionada. Segue texto da carta escrita por Thereze Stutzer, esposa do Pastor Heinrich Albert Friedrich Gustav Stutzer - cunhada de Otto Stutzer, comentando sobre sua
filha, no ano de 1886 (A família retornou para a Alemanha):
"Lá vem minha pequenina e vejo que ela está descalça. Seu maior prazer é tirar as meias e os sapatos para andar livremente. Todas as suas amiguinhas o fazem e Eva as imita. “Mas, minha filha, tu és uma menina alemã!”. Ela sacode a cabeça e lá se vai, e nós então precisamos alcançá-la. Isto aqui é um verdadeiro paraíso para crianças! Elas sempre podem estar ao ar livre! As crianças não precisam de sapato, nem de meias, basta uma blusinha e uma saia (STUTZER, 2002, p. 94).
Colônia Blumenau. |
Colônia Blumenau. |
Assim como se reservavam os vestidos de seda para as ocasiões especiais, os sapatos,
para quem os possuía, eram igualmente usados nas visitas às vilas ou cidades próximas, pois o
seu uso estava condicionado à urbanização e “descalço, o imigrante se sentiria repelido e
humilhado por uma sociedade que associava à ausência do sapato o estigma da
miserabilidade” (WILLEMS, 1946, p.236) e quase sempre era chamado pejorativamente de "colono".
A partir desta questão apontada por WILLENS, há muito que se comentar, uma vez, repetimos, que todos eram colonos, oriundo de uma região onde acontecia a industrialização e a migração campo-cidade. Com o passar do tempo, a expressão "colono" foi sendo usada pejorativamente e de maneira "ignorante" - a partir do entendimento de ignorar. Uma vez, (Ein mal) que todos plantavam, colhiam e criavam animais, em um primeiro momento, a tal ponto que se fez necessário a presença da primeira associação para atender questões de interesses de todos - o Kultuverein. A maioria dos colonos, para fazer seu trabalho no campo, que não se adaptaram a andar de pés descalços, usavam o tamanco. Repetindo, tamanco, usado até os dias atuais na Alemanha.
“O COLONO E O AUTOMÓVEL (VISÃO MIÓPICA)”.
O malfadado colono no Vale do Itajaí sempre foi uma vítima dos pseudo-progressistas.
O colono, diga-se de passagem, foi o verdadeiro esteio, o moto-propulsor de todo o progresso do Vale do Itajaí. Vitima de toda série de contingências, sobreviveu, porque a sua própria resistência ao meio era a condição básica para a sobrevivência do vale. Apreciado um certo exagero, achava-se, em outras épocas, que o colono deveria ser limitado a um trabalho exaustivo, andar de pé no chão, não permitir-se que se educassem, a fim de jamais haver o perigo de faltar alimento na cidade.
Com o aparecimento do automóvel, naturais eram as aspirações de todos de poderem possuir um carro. Os negociantes das colônias eram os primeiros a adquirir, ou sob forma de carro ou sob forma de caminhão. Aos poucos os colonos mais abastados também tentavam entrar na posse do veículo.
Estranha, entretanto, foi a reação de certos citadinos, principalmente alguns mais ilustrados, e, entre esses, inclui-se um cidadão da época que, devido à relativamente pouca capacidade, era favorecido com um cargo público.
Este senhor declarou, certa vez, na presença do articulista, o seguinte: É preciso que se crie uma associação de classe que exerça pressão para que os colonos deixem de ter as manias de certos modernismos, como é o caso de possuírem automóvel. Esta mania de modernismo põe em perigo a sobrevivência da cidade de Blumenau. Sem comentário... (O COLONO, 1981, p. 152).
Residência de Walter Schmidt e o automóvel. |
Para ler mais - Clicar sobre o título abaixo:
Kulturverein - Die Colonie Blumenau - Cooperativismo
Colono no espaço da Colônia Blumenau
Colono no espaço da Colônia Blumenau
Traje típico Westfalen - Alemanha - Presença dos tamancos de madeira. |
Tamancos históricos da Alemanha. |
As imagens comunicam...
Trabalhadores da Estrada de Ferro Santa Catarina - Primeiras décadas do século 20 - Os senhores situado no direita - estão de tamancos. |
Interior da Colônia Blumenau - Arquivo Histórico de Rio do Sul. |
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Tradicionais tamancos fabricados atualmente...
Atualmente, encontramos pessoas da área rural que ainda fazem uso dos tamancos, semelhantes àqueles usados no século XIX e início do século XX em toda a região. São encontrados em casas comerciais que comercializam produtos e ferramentas agrícolas.
Muitos estocam em casa, para uso futuro como vimos na residência dos Feller em Rodeio.
Também na Alemanha, ainda fazem uso deste calçado, mas não somente nas regiões rurais e onde praticam a agricultura. Chegamos a fazer registro dos pés de um músico da banda alemã Michael Maier und seine Blasmusikfreunde, em outubro de 2014.
Tamanco dentro da tendência - usados por jovens Alemanha atual e também na Áustria. |
Vídeo
Tamanco dentro da tendência - usados por jovens Alemanha atual e também na Áustria. |
15° Encontro de Grupos de Stammtisch - Vila Itoupava. |
15° Encontro de Grupos de Stammtisch - Vila Itoupava |
Detalhe da foto anterior |
Pesquisando sobre o traje histórico da região da Westfalen - oeste da Alemanha, descobrimos que também lá, até hoje, usam os tamancos, junto com seu traje ou Tracht.
Leia mais sobre - clicando sobre o título Nordrhein-Westfalen - Alemanha
Em nossas pesquisas na Alemanha, em 2016, visitamos o Fränkisches Freilandmuseum, localizado na cidade de Bad Windsheim - cidade histórica da Baviera. Em uma das mais 100 edificações do acervo, encontramos o sapateiro fazendo exatamente este calçado.
Em nossas pesquisas na Alemanha, em 2016, visitamos o Fränkisches Freilandmuseum, localizado na cidade de Bad Windsheim - cidade histórica da Baviera. Em uma das mais 100 edificações do acervo, encontramos o sapateiro fazendo exatamente este calçado.
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- KLEINE, Karl. A chegada em Blumenau. Tradução: Brigitte Kretzschmar. Blumenau em Cadernos, Blumenau, t.XLI, n.11/12, nov./dez. 2000.
- RENAUX, Maria Luiza. O papel da mulher no Vale do Itajaí, 1850-1950. Blumenau: FURB, 1995.
- SAMETZKY, Rose. Carta [aos avós na Alemanha]. Colônia Blumenau, 1860. Arquivo Histórico José Ferreira da Silva. Fundo memória da cidade. Coleção famílias. Família Gaertner, 3.G.13.doc.3.1860.
- STUTZER, Thereze; Huber, Valburga (Org.). Tradução: Valburga Huber. Marie Luise. Blumenau: Cultura em Movimento, 2002.
- WILLEMS, Emilio. A cultura dos alemães no Brasil: estudo antropológico dos imigrantes alemães e seus descendentes no Brasil. Companhia Editora Nacional, 1946.
Eu sou Angelina Wittmann, Arquiteta e Mestre em Urbanismo, História e Arquitetura da Cidade.
Contatos:
@angewittmann (Instagram)
@AngelWittmann (Twiter)
Onde consigo esse tamanco pra comprar. Preciso para um grupo italiano
ResponderExcluirBoa noite, em lojas tipo agropecuério em Blumenau, cidades vizinhas, como indaial, Pomerode, Timbó...etc
ExcluirTambém deve ter no Distrito de Vila Itoupava - Blumenau.
Abraços.