domingo, 5 de fevereiro de 2017

Comunidade Neisse Central e o casarão - Sua origem histórica - Apíúna SC

Casarão em estado de ruína,  construído por um blumenauense no Vale do Neisse na década de 1940, no período áureo da extração de madeira no Estado. - Link: Neisse Central - Apiúna.

Para conhecermos um pouco mais sobre a região do Vale do Itajaí, parte do território da grande Colônia Blumenau, vamos apresentar algumas informações sobre o Vale do Ribeirão Neisse, entre os muitos vales compostos por uma estrada colonial e um ribeirão, característica dos caminhos usados pelos pioneiros da Colônia Blumenau e que, em muitos lugares, ainda são visíveis na paisagem, com sua originalidade.
O Vale do Ribeirão Neisse, em especial o trajeto entre a foz do Ribeirão Neisse e a comunidade Neisse Central, está localizado no atual município de Apiúna, que já pertenceu a Indaial, que já pertenceu à Colônia Blumenau, que já pertenceu a Itajaí, que já pertenceu a Porto Belo, que já pertenceu a São Francisco do Sul.
A distância entre a centralidade de Blumenau e a entrada do Vale do Neisse é de cerca de 50 quilômetros e, somando até a comunidade de Neisse Central, completa uma distância de cerca de 70 quilômetros.
Distância que percorremos de Blumenau até a entrada do Vale do Ribeirão Neisse, atualmente parte do território de Apiúna.

Trajeto percorrido no vale do Ribeirão Neisse a partir de Apiúna – até a localização do casarão, na comunidade de Neisse Central.

Trajeto total percorrido entre Blumenau e a Comunidade de Neisse Central, onde está localizado o casarão.

Tudo começou no dia 10 de janeiro, às 18:51h, quando Giovani Lazzarotti nos perguntou sob a fotografia do casarão - postada acima, na página Neisse Central - Apiúna, se nós conhecíamos essa edificação.
Respondemos: 
"Não conhecemos....mas podemos buscar informações. Ela tem características de uma construção da década de 1950, com uso misto...comercial e residencial."
Entramos em contato com um representante da Prefeitura de Apiúna e tentamos marcar uma excussão para o local, o que, por um motivo e outro não acontecia. No dia 4 de fevereiro resolvemos partir e estudar o local e "ler" a história na paisagem.
Antes de mostrarmos o caminho percorrido por nós, até o casarão e sua comunidade, vamos relembrar algumas questões históricas, sociais e geográficas, para melhor compreensão dessa região e dos pioneiros que a moldaram como um embrião de núcleo urbano e o que é, atualmente.
O Vale do Neisse foi observado e registrado pelo agrimensor José Deeke, sobrinho e afilhado do mestre de obras Heinrich Krohberger, em 1905, quando fez o mapa da Colônia Blumenau – chamado “Blumenau e Municípios Vizinhos”.
O mapa da Colônia Blumenau elaborado pelo agrimensor José Deeke em 1905 destaca o Vale do Ribeirão Neisse – Detalhe a seguir.


Detalhe do mapa anterior – Ano: 1905.
Pouso de tropas, no extremo da Colônia Blumenau rumo a Lages. Fonte: WITTMANN, 2010.
Antes da chegada dos primeiros imigrantes alemães à região, feita de forma organizada, na segunda metade do século XIX, não existiam núcleos urbanos, exceto algumas propriedades isoladas de famílias oriundas do litoral da Província de Santa Catarina e de grupos indígenas nativos seminômades que ocupavam uma parte desse território.
Com a ocupação e a fundação dos primeiros núcleos urbanos pelos imigrantes alemães, italianos e poloneses, foi iniciada uma prática de produção social semelhante àquela que vinha sendo feita em seus países de origem, mesmo que de forma rudimentar e com algumas dificuldades.
Exemplificações semelhantes às primeiras edificações na região do Neisse – geralmente de madeira (abundante) e cobertas de palha ou ramos – mais tarde com tabuinhas e depois, com telhas de barro cozido no forno.

Propriedade do interior da Colônia Blumenau no início do século XX.
Um pouco de história

A Prefeitura Municipal de Apiúna apresenta em seu site informações sobre a formação histórica da cidade de Apiúna e sobre a povoação do Vale do Neisse. Complementamos.
Em 1876 chegaram mais 1.078 imigrantes italianos às regiões de Rio dos Cedros, Rodeio e Ascurra vindos das regiões italianas de Milão, Bérgamo, Mântua, Beluno e Verona.
Dois anos mais tarde, em 1878, algumas dessas famílias subiram o rio Itajaí-Açu e se fixaram na região onde atualmente estão localizadas a comunidade de Subida e a sede do município Lontras. Por inúmeros problemas, resolveram retornar e mudaram-se novamente para a localidade de Ascurra, mas também, para uma nova região que é Aquidaban (atual Apiúna).
Após algum tempo de sua chegada à região, também chegaram famílias de filhos de imigrantes alemães e poloneses que migravam regionalmente. Nesse caso, chegavam de regiões próximas ao Stadtplatz da Colônia Blumenau. Lembramos que não é correto, como ocorre em algumas narrativas históricas, até mesmo no site da prefeitura em questão, diferenciar as regiões do Vale do Itajaí – do final do século XIX, como se fossem regiões diferentes – como colônias ou comunidades diferentes. Nesse período histórico, todas essas regiões pertenciam à Colônia Blumenau, portanto eram parte da Colônia Blumenau e comungavam da mesma história.
No destaque, o oficial
Emil Odebrecht.
Em
29 de setembro de 1878, chegaram ao local, cerca de 150 famílias de outros núcleos urbanos da Colônia Blumenau. Essa data ficou caracterizada como a data de fundação da nucleação de Aquidaban, até então conhecida como Bugherbach (Ribeirão do Bugre – em português) – Era muito comum nomear um local com o nome do rio próximo que o alimentava e quase sempre era um afluente do rio Itajaí-Açu e pertencente à grande bacia do Itajaí.
Há confirmação de que o Vale do Neisse, recebeu esse nome em homenagem ao rio com o mesmo nome localizado na Europa que nasce na República Tcheca e, juntamente com o rio Oder, marca o atual limite entre a Alemanha e a Polônia. Muitas famílias de Aquidaban que se instalaram no Vale do Neisse têm sua origem nessa região, antiga Pomerania.
O nome Aquidaban, foi uma homenagem a um Tenente do exército brasileiro que liderou o grupo de “Voluntários da Pátria” da Colônia Blumenau. Seus membros lutaram pelo Brasil na Guerra do Paraguai – Emil Odebrecht.
Aquidaban era o nome do rio, no Paraguai, em cujas margens, em 1º de março de 1870, o exército brasileiro derrubou o líder opositor – Francisco Solano Lopes, durante a Batalha do Riachuelo – caracterizando o fim da guerra.
” O fato marcante da vida da Colônia foi a organização, com colonos blumenauenses, de um batalhão de Voluntários da Pátria que, em outubro daquele ano, seguiu para Desterro, de onde rumou para os campos de luta contra o Paraguai………Havia, entre os imigrantes blumenauenses, alguns homens que, na Alemanha, haviam servido ao exército como oficiais. 
…Grande parte destes voluntários pertencia aos quadros da Sociedade de Atiradores de Blumenau que fora fundada alguns anos antes. Isso influiu para que de seus uniformes constassem características dos atiradores, como seja o chapéu de aba quebrada para cima ao lado direito, em que, em vez de distintivo social, foi pregado o dos Voluntários da Pátria, distintivo no qual constava a coroa imperial constava a coroa imperial encimada por um laço como os dizeres “Voluntários da Pátria”. SILVA, 1988.
A seguir, parte do ofício assinado pelo Diretor interino da Colônia Blumenau, Hermann Wenderburg, em 19 de setembro de 1865. Esse documento foi encontrado no Setor de Documentos Raros da Biblioteca da Universidade Federal de Santa Catarina.
Voluntários da Pátria da Colônia Blumenau. Setor de Documentos Raros da Biblioteca Central da Universidade Federal de Santa Catarina – UFSC. Observamos que muitos dos nomes dos imigrantes alemães, foram “abrasileirados” – como: Emílio / Emil; Carlos / Karl; Rodolfo / Rodolph; Ernesto / Ernest; Guilherme/ Willheim; Henrique/Heinrich; Miguel/Michael; Augusto/August; 
Em 1º de janeiro de 1944, Aquidaban passou a se chamar Apiúna. Na língua tupi-guarani, Apiúna significa “Cabeço Negro”, nome do ponto focal natural na região, ali presente ainda hoje na região e muito bem destacado na paisagem natural, rebatizado também com o nome religioso de Morro Dom Bosco – possuindo 390 m de altura.
Apiúna significa “Cabeço Negro” em Tupi-guarani.



Morro Cabeço Negro, Apiúna.













Como acontecia a distribuição social na Colônia Blumenau?

Relembramos que na metade do século XIX, ao contrário das demais colônias de imigrantes, em outras regiões de Santa Catarina e do Brasil, a divisão do trabalho fazia parte do processo local de ocupação do solo e de povoamento; no Vale do Itajaí, implantado pelo fundador. Para isso acontecer com sucesso, Hermann Blumenau “distribuía” as famílias dos imigrantes de maneira planejada e organizada dentro do grande território da Colônia Blumenau, semelhantemente a uma “linha de produção” fabril com o intuído de promover o desenvolvimento a partir das atividades específicas das pessoas dessas famílias.
Primeiras providências feitas pela família pioneira dentro de um lote colonial: derrubada da mata para abrir espaço para o plantio, para o pasto dos animais e para as instalações, sendo as primeiras casas rudimentares e vernaculares. Quase sempre eram construídas com o material retirado da própria propriedade e usados de acordo com a habilidade daqueles que as construía e conhecimento. Essas casas lembravam muito as casas neolíticas que deram origem à edificação enxaimel na região de onde vieram estas famílias, na Europa. Interior da Colônia Blumenau. Fonte: Arquivo Público Histórico de Rio do Sul.


Primeiras providências feitas pela família pioneira dentro de um lote colonial: derrubada da mata para abrir espaço para o plantio, para o pasto dos animais e para as instalações, sendo as primeiras casas rudimentares e vernaculares. Quase sempre eram construídas com o material retirado da própria propriedade e usados de acordo com a habilidade daqueles que as construía e conhecimento. Essas casas lembravam muito as casas neolíticas que deram origem à edificação enxaimel na região de onde vieram estas famílias, na Europa. Interior da Colônia Blumenau. Fonte: Arquivo Público Histórico de Rio do Sul.
Atividades diferenciadas na sede e no interior da colônia.
A partir da organização espacial, as famílias assentadas mais longe da administração da colônia, do Stadtplatz trabalhavam na terra e podiam desenvolver e fundar novos núcleos urbanos, que produzissem em propriedades rurais e se tornassem, também, consumidores da indústria emergente local. Também comercializavam seu excedente de produção – dentro de um sistema implantado pelo fundador, conhecido na Europa como ideologia dos fisiocráticos.
Construção vernacular do interior da Colônia Blumenau que lembra muito a técnica usada nos embriões da casa enxaimel, construída no período neolítico, 7 mil anos atrás, na região de onde vieram muito dos pioneiros para a colônia. Como se explica isso?
No momento em que Hermann Blumenau “planejou” a Colônia Blumenau, o fez com a mesma visão de um empresário atual. Objetivou resultados, e para isso, organizou espacialmente a colônia. O pesquisador, arquiteto e  professor Vilmar Vidor destacou em seu livro, que a distribuição do trabalho na região talvez parecesse com aspectos socioeconômicos do feudalismo, porém sempre foi estruturada no ideário capitalista.
A divisão do trabalho fazia parte do processo local do povoamento ou seja, o objetivo sócio econômico sobre a implantação de núcleos no nordestes do estado depois de 1850, como já assinalamos, não era outro senão o de produzir (produção agrícola x transformação industrial) e inserir-se no mercado nacional. Em Blumenau a hierarquia social foi estabelecida desde o inicio e as pessoas eram designadas para o espaço geográfico de acordo com seu aporte profissional pela administração local: os agricultores colocados longe da sede administrativa, os artesãos, os comerciantes e os burocratas no centro da colônia. VIDOR, 1975.
A partir desse entendimento, muitas questões são compreendidas, como por exemplo: o projeto ferroviário logo no início de sua história; a distribuição das famílias de imigrantes em todo o território da colônia, a necessidade e urgência com que se providenciou a abertura de muitos caminhos, não somente no interior da colônia; e como se procurou, também, interligar essa com outras regiões.

Mapa dos lotes coloniais de parte da Colônia Blumenau de 1864 – os lotes acompanhavam o “desenho” da bacia hidrográfica do Itajaí – Hermann Blumenau os “distribuía” aos proprietários.


Mapa dos caminhos da década de 1870 feito pelo engenheiro agrimensor Emil Odebrecht que, com seu grupo, abriu as primeiras picadas.
Muitos engenheiros agrimensores viviam na Colônia Blumenau já nas primeiras décadas de sua existência. E finalmente, a ocupação dos vales, oportunizando rios e ribeirões para a drenagem das propriedades rurais, acessibilidade, uso na propriedade – esta questão foi uma das características mais fortes da colonização do Vale do Itajaí (responsável pelo modelo de malha urbana de suas principais cidades) e dotada da herança cultural, com origem nas cidades dos imigrantes – na Europa, quase sempre localizadas às margens de um rio importante.
Passeando pelo rio Itajaí Açu com um grupo, o engenheiro da Companhia Hanseática, Karl Alexander Wettstein conhecido como Dr. Phil Wettstein.
Engenheiro agrimensor Carl August Wunderwald (sentado) e seu equipe em uma de  suas excursões pelos rios Benedito e dos Cedros, para traçar uma estrada entre a Colônia Blumenau e a Colônia Dona Francisca (Joinville). Fonte: Brasiliana Fotográfica – Wunderwald, Carl August, 1814-1868 – Retratos. Thereza Christina Maria – Custódia Biblioteca Nacional (Brasil).
Bacia Hidrográfica do Vale do Itajaí - estruturou a Colônia Blumenau.
Conforme mencionado, em 1876 chegaram os primeiros colonos italianos à região de Aquidaban. Eram imigrantes oriundos do Tirol austríaco. Esses colonos foram acomodados em lotes próximos, entre a confluência dos rios dos Cedros e Benedito, caminho que, rumando para o Sul, voltava à margem do Itajaí-Açu e da estrada que, da mesma confluência, acompanhava o rio dos Cedros.
Povoaram a região que ficou conhecida como “colônia italiana” dentro da Colônia Blumenau, formada, no princípio, pelas nucleações de Rio dos Cedros, Ascurra e Aquidaban (atual Apiúna). A partir de Aquidaban (Apiúna), penetraram no Vale do Rio Neisse, assim como pioneiros de outras etnias, para a exploração da indústria madeireira, já no século XX.


A título de informação, nos primeiros 50 anos de existência da Colônia Blumenau, pela insuficiência dos transportes que a ligavam a outras regiões do País, o mercado expandiu somente em nível local. Mas existiu uma expectativa e movimentações para o desenvolvimento da economia desse mercado e ainda que precária, uma rede de caminhos interna para estabelecer o comércio entre os povoados, que propiciou o desenvolvimento desse mercado interno.
Alto Vale do Itajaí, interposto comercial da Colônia Blumenau. Fonte: Arquivo Público Histórico de Rio do Sul.


FNM com carga de madeira nativa beneficiada após ser
 extraída da mata nativa. Metade do século XX.
A
indústria rural doméstica foi a base da acumulação em um primeiro momento. Esta acumulação, obtida a partir da efetivação da força do trabalho e do sistema de troca simples baseado na produção agropecuária, fez surgir o capital local que foi investido mais tarde na construção do parque fabril regional, iniciando-se com ele o processo de industrialização também no Estado de Santa Catarina.
Com o desenvolvimento desse sistema, a Colônia Blumenau agregou igualmente as atividades de extrativismo e o ciclo da madeira, que rendeu muito aos comerciantes não somente locais, mas em todo o estado de Santa Catarina.
Transporte de madeira - utilizando o leito do rio e tração animal - Alto Vale do Itajaí.

A extração da madeira na região e no Estado aconteceu, com maior intensidade, a partir da década de 1930, mais ou menos na mesma época em que Hartmut Hinsch, descendente de pioneiro alemão que viveu na sede da Colônia Blumenau (sendo comerciante), implantou uma madeireira em uma nucleação urbana fundada por famílias italianas e polonesas, além de pomeranas.
A comunidade ficou conhecida com o nome de Neisse Central, homenageando o rio que existia na Pomerania, junto ao rio Oder.
O Rio Neisse europeu passa pela República Checa (54 km) e marca, com o Oder, a divisa entre a Alemanha e a Polônia (198 km), com um total de 252 km. Tem sua nascente na Boêmia, e deságua no Rio Oder próximo de Gubin. Sua bacia hidrográfica engloba cerca de 4297 km² (incluindo 2197 km² na Polônia).
Originalmente, Neisse é o nome do rio que delimita parte da divisa entre a Alemanha e Polônia. A comunidade da região de Neisse Central teve seu apogeu econômico e se desenvolveu em torno da madeireira de Hartmuth Hinsch localizada na região denominada Neisse Central.
Hartmuth Hinsch nasceu em Blumenau em 19 de junho de 1902, filho do imigrante alemão Carl Eugen Richard Hinsch, nascido em Hannover – ao Sul de Berlin e de Therese Ernestine Ida Metzner nascida em Blumenau, filha do imigrante alemão Friedrich Metzner nascido na cidade de Schönbrunn, estado de Turíngia.
Pais de Hartmuth Hinsch, fundadores
do Laboratório Renascim.
Os pais de
Hartmuth se casaram em 4 de outubro de 1892 em Blumenau e tiveram 8 filhos: Egbert Hinsch (1893–1981), Emma Hinsch (1894– – ), Hertha Hinsch (1896– – ), Hedwig Hinsch (1898– -), Hildegard Hinsch (1899– -), Hartmuth Hinsch (1902–1998), Walter Hinsch (1905–1909) e Margarete Hinsch. 
Carl Eugen Richard Hinsch e Therese Ernestine Ida Metzner, pais de Hartmuth fundaram o tradicional Laboratório Renascim
Hartmuth Hinsch se casou com Irma Hinsch, solteira – Jark. Foi vereador da então emancipada cidade de Indaial, possuía a madeireira em Neisse Central, tinha negócios em Blumenau e propriedade no vale do Neisse.

Neisse Central

A primeira capela – Comunidade Neisse Central – em
torno de uma igreja se desenvolvia uma comunidade – No
final da década de 1960 foi construída a nova e atual capela.
Na época da
madeireira Hinsch, foram construídas na comunidade: uma igreja, uma cancha de bocha, uma escola e viviam ali, em torno de 200 famílias, que tiravam seu ganho mensal na serraria e madeireira, além do trabalho na agricultura autossustentável. A família de Hartmuth Hinsch possuía uma loja comercial de material de construção na cidade de Blumenau – localizada no bairro Itoupava Seca – a conhecida Loja NM. Hinsch foi vereador por duas gestões, na cidade de Indaial, nas décadas de 1950 e 1960, quando já era emancipada de Blumenau.
Construção da nova capela da Neisse Central – Detalhes para as pessoas no campanário – Seguraram o tempo necessário até a cruz estar bem firme com a cura da alvenaria.
Desde o início da exploração madeireira no estado de Santa Catarina, a região do Alto Vale do Itajaí estava entre as regiões catarinenses que mais se destacaram – ao lado do Planalto de Lages, Alto Vale do Rio do Peixe e Planalto Norte.
Foi nesse período de prosperidade local que Hartmuth Hinsch construiu seu casarão ao lado de sua madeireira, em Neisse Central. O uso da edificação era somente residencial. Em sua construção foi usado o que havia de mais moderno para a época, no que tange a tecnologia e materiais.
Residência Hinsch construída ao lado da madeireira, no meio da mata.

A
área do pavimento inferior estava dividida em quatro ambientes sendo que dois deles ficavam à direita – aos fundos deste estava a cozinha e na frente, a sala de jantar, de onde partia um acesso para o porão. O ambiente do meio era onde estava a escada para a área íntima da casa localizada no pavimento superior; e no lado esquerdo estava a sala de estar com uma grande lareira.
A linguagem arquitetônica seguia linhas retas e simétricas presente nas construções regionais neoclássicas, como também a monumentalidade da edificação. O piso foi feito com assoalho de madeira nobre com tábuas de aproximadamente 30 cm de largura. Forros de estuque. Telhados em quatro águas, com estrutura de madeira, cobertos com telhas de barro planas ou germânicas. As paredes são autoportantes, feitas com tijolos maciços, como construíam os italianos na Europa e, também, os imigrantes italianos na região. Não se tem a informação correta da data de sua construção. Observando dados históricos, pode-se afirmar que sua construção aconteceu em um período localizado no início da década de 1940.

As imagens...
Que comunicam - Caminho do Vale do Neisse...  

Início do caminho – próximo à foz do ribeirão Neisse no Itajaí Açu – enxaimel original, enquanto observado a estrutura. Aberturas trocadas por modelos atuais.







Rastros do patrimônio da EFSC - Estrada de Ferro Santa Catarina - Trilhos do trem auxiliando na barreira de contenção Caminho para Neisse Central - Apiúna.











Vargem Grande  - Comunidade do Neisse antes do Neisse Central.

Vargem Grande  - Comunidade do Neisse antes do Neisse Central.
Clima com temperaturas elevadas - nosso agradecimento a  Roberto Wittmann
 que não mede esforços nos trabalhos in loco - também nos levando e acompanhando
aos locais pesquisados.





Famílias de pioneiros italianos.



Paisagem construída impactante com a paisagem pré existente - histórica e construída - Como acontece em outras cidades da região e brasileiras.



Estabelecimento público muito bem conservado com as bandeiras, inclusive da comunidade.


Curiosa edificação pertencente ao Patrimônio Histórico Arquitetônico local - Vale do Neisse. Não é uma edificação que poder-se-ia afirmar ser enxaimel, a partir de sua estrutura de madeira e tão pouco , é uma edificação autoportante. A edificação autoportante (Paredes sem estrutura - auto suportam o peso da construção) feita com tijolos maciços foi um prática da construção dos pioneiros italianos, em sua maioria. Visitamos e pesquisamos, nos tempos de faculdade,  a comunidade de Rio dos Cedros e vimos alguns exemplares por lá. A construção enxaimel, a partir de sua estrutura de madeira, foi trazida pelos povos germânicos. Essa edificação não nem uma coisa e nem outra. É o intercâmbio de técnicas e a indefinição. Muitos aprendiam a construir com e dentro da comunidade.
Detalhe - Ponte pênsil sobre o ribeirão Neissee os eucaliptos atrás - agressão ao local e à mata nativa.








Igreja da Comunidade de Neisse Central

O ciclo   madeireiro se enfraqueceu a partir da década de 1980 na região e também na Comunidade de Neisse Central. A firma fechou em 1988. Atualmente a propriedade pertence aos herdeiros de Hartmuth Hinsch. O número de famílias na comunidade diminuiu. Casas desapareceram da paisagem. Fazem parte da comunidade atual, 75 famílias que se encontram cadastradas na igreja. Muitos trabalham foram da comunidade – em Apiúna.


















Casarão de Hartmuth Hinsch















Porão  - Keller









Por que isso aconteceu? Até então, o estado de Santa Catarina possuía grandes áreas de florestas, as quais foram transformadas em matéria-prima por meio da implantação de grandes indústrias madeireiras. Essa exploração e extrativismo da matéria-prima indiscriminadamente não foi acompanhada pela reposição das áreas desmatadas. Também surgiram legislações de proteção da mata, em muitas regiões, já esgotadas e sem o remanejamento.
Quando começaram as primeiras crises no setor, a matéria-prima era escassa e naturalmente, as serrarias se fecharam. Todo esse processo econômico tem estreitos laços com a história de Neisse Central. Também houve mudanças na legislação ambiental federal, restringindo o corte de espécies nativas em extinção e o “politicamente correto” passou a ser uma prática dentro do discurso sustentável, comum e natural na Alemanha e em outros países, diferentemente na região e no país -ainda muito teórico e sem a devida fiscalização e outras opções de atividades sustentáveis.
Até o ano de 2017, a propriedade e o casarão estavam sob os cuidados de uma família, que guardava o local e nos autorizou a fazer as fotografias.
Pessoas da comunidade gostariam muito de poder ver o histórico casarão – patrimônio histórico arquitetônico recuperado, como um tipo de casa de repouso – pousada, resgatando a história e trazendo visitantes para o local. O poder de decisão e a iniciativa cabe aos atuais proprietários, herdeiros de Hartmuth Hinsch, residentes em Blumenau.





No próximo final de semana, tem Festa na Comunidade de Neisse Central - Um bom momento para conhecer o local que tem sua história na paisagem....







De acordo com o registro do Google Maps 2023, o casarão Hinsch ainda se encontra no local.


Cemitério Luterano de Passo Manso – Blumenau.

Hinsch
faleceu em 12 de maio de 1998 e seu corpo está sepultado no Cemitério Luterano de Passo Manso, Blumenau SC. Observando o levantamento que fizemos nesse cemitério em 2022, há muitos de seus irmãos e também seus pais e esposa sepultados no local.

Rodovia - BR 470
Mensagem recebida em 18 de fevereiro de 2024
Excelente investigação e levantamento nesta postagem, Parabéns. 
Meu pai "Orlando Rodrigues" nasceu próximo a Igreja Nossa Senhora das Graças em maio de 1951, (região que era chamada de Café - Ele ajudou na reforma da Igreja), ele trabalhou na serraria do Hartmuth Hinsch em março de 1970 (está na carteira de trabalho dele), mas antes dele, meu avô "Custódio Rodrigues" (pai do Orlando) que migraram de Brusque para Neisse Central (que está entre as 200 famílias que você comentou que migraram... (meu pai fala que havia mais...). Todos os anos na festa da igreja vamos para lá, e então para mim e meu pai, conversar com quem morou lá é sempre muito nostálgica (inclusive este ano conversei com uma senhora "Leia" com 93 anos de idade e muito lucida, descobri na proza travessuras da minha falecida vó Hulda Belz Rodrigues kkk). Tenho os registros nas carteiras de trabalho deles, caso ajudar a incrementar neste ou demais posts, fico a disposição... 
Obrigado. 
Claudio Rodrigues - Jaraguá do Sul/SC.

Referências
  • Academia de Letras do Brasil de Santa Catarina. Seccional Ibirama. De Hammonia a Ibirama: Retratos de uma História. Organização de  Eliana Vogel Jäger. – Blumenau: 3 de Maio, 2022. 243p.:il.color.
  • BRASILIANA FOTOGRÁFICA. O Engenheiro A. Wunderwald com seus companheiros. Biblioteca Nacional (Brasil. Disponível em: https://brasilianafotografica.bn.gov.br/brasiliana/handle/20.500.12156.1/363 . Acesso em: 4 de abril de 2023 – 7h15.DEEKE, José. A Colônia Hammonia 1879 – 1922 – Dia 8 de novembro, 25 anos de fundação– Blumenau em Cadernos, Tomo XXIX – Nov/Dez, N°11/12 – Blumenau. 1988.
  • GERLACH, Gilberto S.; KADLETZ, Bruno K.; MARCHETTI, Marcondes. Colônia Blumenau no Sul do Brasil. ed. São José: Clube de cinema Nossa Senhora do Desterro, 2019.
  • GIESBRECHT, Mennucci Relph.Estações ferroviárias no Brasil. Disponível em: http://www.estacoesferroviarias.com.br/index.html> Acesso em: 14 jun. 2022.
  • HUMPL, Max. Crônica do vilarejo de Itoupava Seca: Altona: desde a origem até a incorporação à área urbana de Blumenau,ed. Méri Frotschter Kramer e Johannes Kramer (organizadores). Escrito em 2018. Blumenau: Edifurb, 2015. 227 p. : il.
  • ODEBRECHT, Rolf. Cartas de Família – Ensaio Biográfico de Emil Odebrecht e Ensaio Biográfico de seu Filho Oswald Odebrecht Sênior. Rolf Odebrecht, Renate Sybille Odebrecht. 576 p.: Blumenau: Edição do autor, 2006
  • VIDOR, Vilmar. Indústria e urbanização no nordeste de Santa Catarina. Blumenau: Edifurb, 1995. 248p, il.
  • SILVA, José Ferreira. História de Blumenau. -2.ed. – Blumenau: Fundação “Casa Dr. Blumenau”, 1988. – 299 p.
  • WETTSTEIN, Phil. Brasilien und die Deutsch-brasilieniche Kolonie Blumenau. Leipzig: Verlag von Friedrich Engelmann, 1907.
  • WITTMANN, Angelina C. R. A ferrovia no Vale do Itajaí: Estrada de Ferro Santa Catarina: Edifurb, 2010. – 304 p. :il.
  • WITTMANN, Angelina. C.R.: Fachwerk – A técnica Construtiva Enxaimel. – 1.ed. – Blumenau, SC : AmoLer, 2019. – 405 p. : il.
Leituras Complementares - Clicar sobre o título escolhido:
  1. Colônia Blumenau - Blumenau - Desde 1846
  2. Colonizadores da Colônia Blumenau - Trecho do livro: Vale do Itajaí - Hugo Bethlem
  3. Fundação de Blumenau e sua formação a partir dos meios de transportes
  4. Voluntários da Pátria - Imigrantes alemães da Colônia Blumenau na Guerra do Paraguai
Entrevista da comunidade de Ascurra sobre as comunidades no início de sua história...

Sou Angelina Wittmann, Arquiteta e Mestre em Urbanismo, História e Arquitetura da Cidade.
Contatos:
@angewittmann (Instagram)
@AngelWittmann (Twitter)









16 comentários:

  1. Respostas
    1. Os questionamentos nos leva a buscar respostas, com isso descobrimos muitas questões, que nos dão alegria e prazer e mais ainda, quando compartilhamos...Seria bom ver esse local recuperado...com respeito ao seu entorno natural.

      Excluir
    2. Adorei muito a sua publicação, me trouxa grandes recordações, pois morei a 50 metros do casarão e meu pai foi motorista de caminhão do proprietario do Casarão nos anos de 1965...quando eu tinha +- 5 anos.VANDERLEI VIEIRA




      Excluir
    3. Somos responsáveis por nossas memórias!! Fico feliz Vanderlei. Seria muito bom poder ver fotografias dessa época. Abraços.

      Excluir
  2. excelente pesquisa, nossa um documentário maravilhoso. Wunder, wunder.

    ResponderExcluir
    Respostas
    1. histórias ainda presentes nas paisagens. aqui, não porque o homem assim quis, mas porque não lhe chamou atenção o lugar, que é lindo! Esperamos que continue assim, pois percebemos que a natureza está se regenerando.

      Excluir
  3. Como foi bom ler isso, sabendo que eu morei 5 anos na comunidade Jundiá, que fica após a Vargem Grande.

    ResponderExcluir
  4. Parabéns pela pesquisa, gostei de conhecer a história do casarão, já que quando vou para Rio Novo passo na frente e sempre me chamou atenção a construção abandonada.

    ResponderExcluir
    Respostas
    1. Boa noite Bárbara. Seria muito bom a mobilidade da comunidade para que ocorresse o resgate dessa memória, tão importante a todos. Abraços.

      Excluir
  5. Bela pesquisa. Infeliz comentário sobre Pinus e Eucalipto.

    ResponderExcluir
    Respostas
    1. Grata...quanto ao pinus e ao eucalípto, seria bom não precisar comentar, mas infelizmente é comprovado. O remanejo dessa espécie no meio da mata, não permite que as espécies nativas retornem e ocorra a recuperação da mata.Deveria existir locais especiais para o cultivo dessas espécies e não poderia ser no meio da mata (Ainda existente) nativa. Muitos são os que plantam e é ótimo, pois enquanto for utilizado essa matéria prima o resto da matao nativa sobrevive. Abraços

      Excluir
  6. Ótima reportagem! Já que foi mencionado o Sr. Emil Odebrecht, pelo que me consta a esposa do Sr. Hinsch dono do casarão é uma Odebrecht, acho até que da família do Sr. Emil. Não seria difícil de pesquisar. Fica a Dica. Alvaro.

    ResponderExcluir
  7. Excelente investigação e levantamento nesta postagem, Parabéns. Meu pai "Orlando Rodrigues" nasceu próximo a Igreja Nossa Senhora das Graças em Maio de 1951 (região que era chamada de Café - Ele ajudou na reforma da Igreja), ele trabalhou na serraria do Hartmuth Hinsch em Março de 1970 (está na carteira de trabalho dele), mas antes dele, meu avô "Custódio Rodrigues" (pai do Orlando) que migraram de Brusque para Neisse Central (que está entre as 200 famílias que você comentou que migra... meu pai fala que havia mais...). Todos os anos na festa da igreja vamos para lá, e então para mim e meu pai, conversar com quem morou lá é sempre muito nostálgica (inclusive este ano conversei com uma senhora "Leia" com 93 anos de idade e muito lucida, descobri na proza travessuras da minha falecida vó Hulda Belz Rodrigues kkk). Tenho os registros nas carteiras de trabalho deles, caso ajudar a incrementar neste ou demais posts, fico a disposição... Obrigado. Claudio Rodrigues - Jaraguá do Sul/SC.

    ResponderExcluir
    Respostas
    1. Quanta história! Por favor, encaminhar o registros da carteira de trabalho digitalizado para o e mail angewitt@hotmail.com
      Muito obrigado e ficamos felizes em receber "ecos" dessa história. Abraços de Blumenau.

      Excluir
    2. Quando é a festa da igreja, Claudio Rodrigues?

      Excluir