Angelina Wittmann - Arte-Cultura-História e Antropologia : Andreas Hofer

"Eu não vou trocar a minha vida por uma mentira." Andreas Hofer

Em algumas postagens apresentamos fragmentos da história mundial que mostram ligações com algumas práticas ou, que nos trazem lembranças de algum episódio histórico e ou cultural locais. Muitas pessoas leem esses fragmentos de história e sentem ímpetos de acrescentar mais, tornando-a essa mais completa - o que nos faz contentes e agradecidos.

Em muitas postagens históricas apresentamos imagens (que comunicam) muito antigas. Muitas vezes, não comentamos devidamente sobre alguns personagens importantes de determinadas imagens apresentadas, pelo "foco" do objeto de estudo apresentado.

Um tempo atrás, alguém falou para nós sobre o Schuhplattler, sem maiores esclarecimentos. Desconhecíamos sua origem e imaginamos que mais pessoas também a desconheciam e gostariam de conhecer um pouco mais sobre a coreografia. Pesquisamos e escrevemos sobre a dança milenar e publicamos no Blog.

Para ilustrar o texto do Schuhplattler, entre outras imagens, encontramos uma imagem antiga, reconhecida por Marcelo Augusto de Siqueira - leitor que acompanha as postagens do blog.

Marcelo Augusto escreveu-nos alertando sobre a imagem de Andreas Hofer ser um personagem importante na história da região do Tirol.

Mensagem de Marcelo Augusto de Siqueira:

"Há um artigo que é sobre a Schuhplattler, que gostei muito. Neste post há uma foto com a legenda 'Camponês do Tirol". Este camponês que aparece na foto é um grande herói do Tirol. Chama-se Andreas Hofer (1767-1810). Ele lutou bravamente contra os desmandos de Napoleão e a perseguição que o Imperador francês moveu à esta região, pois era muito católica."

Quem foi Andreas Nikolaus Hofer?

Andreas Hofer foi uma personalidade histórica - filho homem único entre 5 irmãs, de Joseph Hofer e Maria Aigentler. Ficou órfão de mãe quando tinha 3 anos de idade e com 7 anos, ficou órfão de pai.

No início do Século XIX, Tirol era uma região localizada no centro da cadeia dos Alpes. Ao seu oeste estava a Suíça e o Vorarlberg austríaco, ao seu norte estava a Bavaria e ao sul estava a Itália.

Fazia parte de uma província pertencente ao Sacro Império Romano. A região é uma área de montanhas onde seus principais picos tem mais de 3 mil metros de altitude e suas comunicação davam-se pelo vales, principalmente dos vales dos rios Inn e Adige.

A partir de suas características topográficas, geológicas e climáticas - a região fica por períodos grandes coberta de neve. As vilas são distantes uma das outras e nos cruzamentos de estradas e caminhos, haviam pousadas ou albergues/tabernas, onde os viajantes pudessem pousar, como também onde as pessoas obtinham conhecimentos das notícias.

Localização de Sandhof e a capital do Tirol - Innsbruck

Andreas Nikolaus Hofer nasceu no dia 22 de novembro de 1767 em uma dessas pousadas/albergue de propriedade da família na vila de Sandhof. Nesse tempo já tinham nascido três das cinco irmãs de Andreas. Quando Andreas tinha três anos, viúvo, seu pai casa-se novamente, quando falece quatro anos depois, deixando o pequeno e suas irmãs órfãos. Isso aconteceu no ano de 1774.

Sandhof.

Ficou sob tutela de sua irmã mais velha e de seu marido, que também tomaram conta dos negócios do pai - pousada/albergue. O local pertencia a família desde o Século XVII.

Andreas Hofer foi criado dentro dos preceitos religiosos da família - católico romano, desde muito cedo e também na escola e na igreja. Estudou na escola comunal instituída pela Imperatriz Maria Tereza.

Albergue da família Hofer - Com uma história de mais de três séculos - Foto atual
Pretendemos visitar esse local e nossa próxima excursão à região

Alguns anos passados após a morte de seu pai, Andreas saiu de casa e mudou-se para o extremo Sul do Tirol onde passou a trabalhar em outro albergue e tornou-se comerciante de vinho. Aprendeu a língua italiana falada na província, com facilidade.

Quando completou 20 anos, retornou a Sandhof e assumiu a direção do albergue de sua família. A irmã e o cunhado partiram para outra província.

Para tirar os negócios do vermelho, resolveu investir no comércio de vinho, licores e cavalos.

Propriedade dos Hofer - presença da igreja

Casal Hofer

Um anos depois, com a idade de 21 anos, casou-se com Anna Ladurner. O curioso é que o casal também teve seis meninas e um menino.

Andreas era um figura marcante fisicamente e de personalidade. Ficou conhecido pelo apelido: General Barbone - por sua espessa e grande barba negra. Tornou-se uma das figuras mais conhecidas do Sul do Tirol e também, na Áustria e Sul da Alemanha.

Dentro da cultura da região, uma das fortes características era a presença da fé e da grande religiosidade. Eram católicos fervorosos. Em todos os locais próximo às vilas e nas montanhas existiam oratórios, para orações ou mesmo somente uma reverência e reflexão. Os comprimentos entre conhecidos nos caminhos era a troca da expressão "Grüs Gott" (Deus vos abençoe). Isso acontece na região, até os dias atuais.

Joseph II

Todos participavam das missas dominicais na parte da manhã e das procissões, na parte da tarde.

Até que houve uma intervenção oficial nas práticas das pacatas vilas do Tirol. O Imperador Joseph II sancionou várias leis que atingiam diretamente as práticas locais no Tirol. As novas leis visavam nivelar as autoridades locais dentro de nova maneira de administrar, onde os funcionários eram diretamente ligados a Viena.

Joseph II nasceu em Viena no dia 13 de março de 1741 e partiu no dia 20 de fevereiro de 1790. Foi o Imperador Romano-Germânico e Arquiduque da Áustria de 1765 até sua morte- 1790. Além de ser Rei da Hungria, Croácia e Boêmia a partir de 1780. Era o filho mais velho da imperatriz Maria Teresa e seu marido o Imperador Francisco I.

As mudanças impetradas por Joseph II não foram muito bem aceitas no Tirol. E para piorar o quadro político novo, as mudanças administrativas tiveram respingos nas práticas religiosas locais. Joseph II dissolveu conventos das ordens religiosas contemplativas, instituiu somente um seminário - em Innsbruck - capital do Tirol - com professores dotados e aplicando as novas ideias - não bem aceitas no local, também. Chegaram a suspender as peregrinações e procissões - práticas seculares - agora parte da tradição e cultura locais.

Stift Wilten in Innsbruck - Áustria

Nesse tempo de Joseph II, também determinavam quantas velas poderiam ser acesas nas igrejas, quais orações tinham autorização para ser rezadas e quantas badaladas podiam tocar os sinos das igrejas. Isso incomodava profundamente os tiroleses

Houve reações populares contra as reformas de Joseph II. As práticas proibidas foram mantidas e os tiroleses não tomaram conhecimento da lei. Os editos imperiais afixados nos povoados e vilas foram arrancados. Os padres, em seus sermões - maldiziam e evocavam a cólera dos céus sobre o imperador.

Maximiliano Joseph.

Com o início da Guerra da coalizão contra a França, em agosto de 1805 foi nomeado como comandante chefe das forças imperiais do Alpes - o Arquiduque Johann. Foi bem aceito na região. Em novembro, houve a invasão das tropas napoleônicas na cidade de Innsbruck liderados pelo General Ney. Isso aconteceu no início do mês de novembro 1805. No final do mês de novembro, os bávaros tomaram o local. No dia 26 de novembro de 1805, a Áustria assinava o acordo de paz, onde a região do Tirol ficou pertencendo a Bavaria e não mais a Áustria.

Tinha tudo para ser um final feliz, pois Bavaria e Tirol tinham a mesma religião, costumes e língua. Mas não foi bem assim. O rei bávaro Maximiliano Joseph era imbuído de ideias liberais inspiradas nos princípios da Revolução Francesa. Mesmo tendo prometido salvaguardar o direito de propriedade e das pessoas na região do Tirol, o rei bávaro não era bem visto e aceito na região, pois o julgavam um anticlerical e pelos laços que mantinha com o Imperador da Áustria - Joseph II.

De 1806 até 1808, o governo bávaro, inspirados nas novas ideias vigentes do livre-pensamento do século XVII proibiu a Missa do galo, as cerimônias religiosas noturnas, a benção do Santíssimo depois da Missa cantada. Interditou as rogações, as novenas, a Via Sacra, as procissões, que provocaram insurreições no ano de 1809.

Os tiroleses se reuniam secretamente para encontrar uma maneira de salvar o catolicismo na região, como aconteceu em 1807, onde Andreas Hofer também participava.

Também houve, por parte da Baviera, o recrutamento de soldados locais do Tirol para compor o exército bávaro. Isso não foi bem recebido no local, pois a Bavaria pretendia usar o exército para lutar contra a Áustria. Os homens convocados fugiam para as montanhas e não se apresentavam. Teve início, então das revoltas. De todas as vilas alpinas se apresentaram homens para lutar por Deus, pelo Imperador da Áustria e por Tirol.

Hoffer tornou-se o líder e comandante dos rebeldes tiroleses com apoio de outros líderes, como Joseph Speckbacher e o padre Joachim Haspinger.

Os tiroleses venceram duas batalhas contra tropas franco-bávaras. Andreas Hofer foi um dos seus líderes. Inspirava confiança e segurança aos combatentes.

Os tiroleses derrotaram as tropas franco-bávaras na batalha de Bergisel, que transcorreu entre os dias dia 25 de maio até o dia 29 de maio de 1809.

Um intendente austríacos foi nomeado para governar Tirol. Novamente Napoleão derrotou as tropas austríacas na batalha de Wagram no dia 6 de julho de 1809. Novamente Tirol foi cedido à Baviera - aliada da França. Novamente Baviera e França ocuparam Innsbruck militarmente.

Batalha de Wagran.

Andreas Hoper com a bandeira do Tirol.

Andreas Hofer novamente lidera os rebeldes tiroleses. Os franceses oferecem uma recompensa por sua cabeça. Acontece a última e terceira batalha de Bergisel no dia 13 e 14 de agosto do mesmo ano. Mais uma vez Andreas Hofer e os tiroleses derrotaram a tropa francesa sob o comando do comandante Francois Joseph Lefebvre. Os tiroleses retomaram a cidade de Innsbruck.

Hoper solicita que façam preces públicas de ação de graças e promulga um edito determinando que a festa do Sagrado Coração de Jesus deveria ser erigida perpetuamente, em uma solenidade inscrita em vermelho no calendário tirolês.

Andreas Hofer declarou-se Comandante Imperial do Tirol na ausência do governante mediante também, a sua nomeação pelos tiroleses. As autoridades bávaras tinham fugidos e o governo austríaco não tinha nomeado outras. Por dois meses, governou o Tirol em nome do Imperador da Áustria. Formou seu Conselho. Ele anunciou novas leis e impostos e cunhou suas próprias moedas. Também enviou dois homens para a Grã-Bretanha para pedir ajuda. Em 29 de setembro de 1809 recebeu uma medalha do Imperador e outra promessa de que a Áustria não abandonaria o Tirol.

Antes do dia do trabalho, todos participavam de uma missa e depois do dia de trabalho, recitavam o rosário.

As esperanças de Hofer foram destruídas em 14 de outubro de 1809, quando o Tratado de Schönbrunn cedeu novamente o Tirol à Baviera. Foi tudo em vão.

Eugenio de Beauharnais

Eugenio de Beauharnais, general francês que com a ajuda da Baviera infligiu derrotas sucessivas ao povo do Tirol. O general conclamou que os tiroleses entregassem as armas e reconhecessem a autoridade bávara como legítimos governantes do Tirol. Prometido a anistia, Hofer e seus seguidores se renderam no dia 8 de novembro de 1809. Hofer retirou-se para o vale de sua casa.

O Tirol também recebeu a seguinte mensagem do arquiduque Johann:

"Eu devo fazer-vos saber que o desejo de Sua Majestade é de que os tiroleses permaneçam tranquilos e não se sacrifiquem inutilmente."

Ao perceber a "traição" do imperador austríaco, Andreas Hofer ficou transtornado. Arquitetou uma reação contra as tropas franco/bávaros. Não aceitou a decisão "canetada", entre os imperadores austríaco e bávaro. Liderou uma batalha final, onde os tiroleses foram massacrados.

No dia 12 de novembro de 1809, Andreas Hofer recebeu falsos relatos de vitórias austríacas e tentou convocar suas tropas no dia 15 de novembro. Não teve êxito. Os franceses sufocaram a tentativa com a rendição dos rebeldes tiroleses que defendiam sua soberania.

Andreas Hofer escondeu-se nas montanhas no Passeiertal. Os franceses ofereceram uma recompensa de 1500 florins por sua cabeça.

Em seu esconderijo, nas montanhas do Tirol, Andreas Hofer fazia orações, meditava e ofereceu seu sofrimento pela salvação de sua alma e pelas dos que morreram pelo Tirol.

Franz Raffl e soldados franceses.

Seu vizinho e companheiro de ideais Franz Raffl o traiu e revelou seu esconderijo às autoridades pelo valor da recompensa.

Hofer foi capturado por tropas italianas no dia 28 de janeiro de 1810 e foi enviado prisioneiro para Mântua para ser julgado. Foi preso junto com a esposa e o filho que o estavam visitando no momento.

A história conta que oficiais e a corte marcial discordavam sobre a sentença que aplicariam ao prisioneiro até que eles receberam uma mensagem de Milão. Era supostamente uma mensagem do vice-rei, transmitindo a ordem de Napoleão para "dar-lhe um julgamento justo e depois matá-lo".

Andreas Hofer foi executado em Mântua, por um pelotão de fuzilamento no dia 20 de fevereiro de 1810. Ele recusou uma venda ou se ajoelhar, e deu dinheiro a um cabo responsável , dizendo-lhe para "disparar em linha reta".

O Tirol foi dividido e o território de Trento passou para o controle do reino napoleônico da Itália, e chamado de Dipartamento dell'Alto Adige. A parte norte do Tirol passou para o controle do Reino da Baviera com o nome de Südbayern - Baviera do Sul. Durante esse período, houve consideráveis modificações no sistema administrativo da cidade de Trento e uma primeira tentativa foi a italianização dos sobrenomes de origem alemã do Tirol italiano.

Com a queda de Napoleão e o Congresso de Viena, em 1816, o então Condado Principesco do Tirol - Gefürstete Grafschaft Tirol - retornou para o domínio austríaco, ao qual permaneceu unido até o final da Primeira Guerra Mundial (1914 - 1918).

Em 1818, a família de Andreas Hofer recebeu um título de nobreza do imperador da Áustria (Hofer e sua esposa Anna tiveram 7 filhos). Francisco I também concedeu uma pensão à esposa e às filhas e renovou o certificado de nobilitação de seu filho, assegurando sua educação.

Em janeiro de 1823, cinco soldados de um regimento de caçadores levaram os restos mortais de Hofer de volta para o Tirol - cidade de Innsbruck. O Imperado Francisco I determinou que fosse sepultado na igreja da corte. Foi erigido um monumento, com um sua estátua.

Túmulo de Andras Hofer - Igreja da corte - Innsbruck Áustria.

Os tiroleses não esquecem do seu líder até os dias atuais. Também aqueles que não são tiroleses, como foi o caso de Marcelo Augusto de Siqueira, que nos avisou da imagem do herói tirolês, em outra postagem e reconhecido nela.

No Tirol de sua época - após a morte, sua imagem estava dentro de todos lar e em todas as partes, desde no soldadinho de chumbo ou em xícaras de café ou cinzeiros.

Uma estátua gigante de Andreas Hoffer foi inaugurada em Bergisel pelo imperador austríaco Francisco José.

Estátua de Andreas Hoffer de Bergisel.

Em Sandhof foi erigida uma capela ornada com afrescos que narram sua vida.

Em Meran há também uma estátua monumental sua na estação ferroviária no início da Via Andreas Hofer, que foi erigida por tiroleses no ano de 1915.

No ano de 1919 foi assinado o tratado de Saint Germain. A região do trentino e do Alto-Adige passaram a pertencer a Itália. Foi proibido a ter retratos e imagens de Andreas Hofer nessa antiga província do Tirol.

Andreas Hofer tornou-se um símbolo da patriotismo austríaco contra inimigos do Norte. Andreas Hofer tornou-se um mártir na Alemanha e na Áustria e um símbolo contra o poder de Napoleão.

Museu Andreas Hofer.

Em 1945 a administração de Innsbruck renovou o voto ao Sagrado Coração de Jesus feito por Hofer e também, a constituição provincial que foi adotada em 1960. Seu início é assim:

"Fidelidade a Deus" em primeiro lugar, como Andreas Hofer teria feito.

A canção Zu Mantua em Banden (atualmente hino do Estado do Tirol ) conta sua história e de seu destino e execução.

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