sexta-feira, 3 de agosto de 2018

Arquitetura Hans Broos - Obra inacabada - Prefeitura Municipal de Rio do Sul - desde 1960

Prefeitura Municipal de Rio do Sul SC - Projeto e obra executada - Entregue no ano de 1960.
Conhecemos Hans Broos devagarzinho. O primeiro contato aconteceu na década de 1990, em um sarau de arte, na Galeria de Arte da artista plástica Freya Groos, com a qual o arquiteto mantinha estreita parceria na definição dos projetos contando com a arte cerâmica de Groos.
Este encontro foi casual e efêmero. Depois, na metade da próxima década, no Campus da Universidade Federal de Santa Catarina – UFSC, dentro do curso de Mestrado Urbanismo, História e Arquitetura da Cidade, participamos de debates sobre sua vastíssima obra, pouco estudada em nosso próprio curso de graduação de Arquitetura e Urbanismo – FURB, na cidade de Blumenau
Começamos a estudar sua obra na cidade de Blumenau
Em um determinado dia, no ano de 2010, soubemos ao acaso, que o arquiteto Hans Broos se encontrava em sua residência no Bairro Boa Vista – Blumenau. Sem hesitação, fomos visitá-lo sem um aviso prévio. Deparamo-nos com uma pessoa extremamente simples, gentil e dotada de um profundo conhecimento sobre vários temas.
Foto feita pela câmara do Notebook, quando mostrávamos seu
funcionamento ao arquiteto - ele preferia o método manual para criar.
Conversamos muito sobre arquitetura e também, sobre as cidades. Neste momento percebemos e compreendemos muito de sua obra, a qual já conhecíamos. Compreendemos a importância da integração e harmonia entre a obra construída e a obra natural. Compreendemos a sua busca da integração e equilíbrio entre o brutalismo e a natureza - como se se completassem e formassem um conjunto muito agradável, complementares e que simultaneamente, despertava em nós, o desejo de nos inserimos no local como parte do espaço. Poesia em forma de arquitetura seria a nossa definição sobre sua maneira de organizar e criar seus espaços a partir de todo conhecimento técnico que lhe sobrava.   
Cia Hering – Bom Retiro Blumenau. Integração com a paisagem natural e a paisagem histórica preexistente, com harmonia.
Cia Hering – Bom Retiro Blumenau. Integração com a paisagem natural e a paisagem histórica preexistente, com harmonia.
Sua obra ainda permanece e transpira a delicadeza que o concreto armado necessita para a plena harmonização de sua intervenção com os elementos da paisagem natural – da delicada paisagem natural. Eis que ocorre o equilíbrio. 
Hans Broos está vivo em sua obra – que permanece. 
Ou poderá estar, quando a obra for concluída de acordo com seu projeto.

Prefeitura Municipal de Rio do Sul - Prefeito Helmuth Baumgarten

“A obra arquitetônica de Hans Broos compreende a centralidade da ideia de luz. A forma do objeto evidencia as pretensões no uso daquela, através dos materiais utilizados na construção, das texturas, do formato das aberturas. A luz pode converter o objeto em algo leve, dinâmico, expansivo, desmaterializado, ou compacto, que salienta arestas e a massa construída. Pode criar efeitos, reflexos, sombras, enfocar contrastes, diluir limites entre interior e exterior. ” (DAUFENBACH, p 25)

Em poucas palavras, DAUFENBACH descreve a poesia da arquitetura e, que está presente na obra de Hans Broos, inserida no espaço cuidadosamente preparado para recebe-la. São consideradas questões, como a dualidade entre o concreto e o natural, cheios e vazios e a luz. Lemos e reconhecemos o “traço” do arquiteto em suas formas delineadas a partir do concreto armado inserido no meio natural.
Quando estivemos na cidade de Rio do Sul no início ano de 2018, foi nos apresentado o edifício da Prefeitura Prefeito Helmuth Baumgarten – Prefeitura Municipal de Rio do Sul, como sendo uma das obras de Hans Broos. Ficamos confusos, pois sentimos a falta da “centralidade da luz”, da “leveza”, do “movimento”, e da forma da arquitetura de Hans Broos – descritas por Daufenbach. 
Não reconhecemos presentes no edifício da Prefeitura Municipal de Rio do Sul – os traços da arquitetura de Hans Broos. Não se poderia considerar uma legítima obra do arquiteto, porque seu projeto não foi concluído e, portanto, não contem a linguagem característica das obras do arquiteto, presente na volumetria apresentada no edifício público riusulense.
Prefeitura Municipal de Rio do Sul

Antiga Prefeitura Municipal de Rio do Sul
O atual edifício da Prefeitura Municipal de Rio do Sul projetado por Hans Broos, que substituiu a antiga e histórica prefeitura construída na linguagem neoclássica com características da arquitetura alemã, foi projetado a partir do ano de 1958 e “inaugurado” em 1960 - inacabado. 


Nova Prefeitura Municipal de Rio do Sul - momento da  "inauguração" - inacabada.
Ao observarmos mais detalhadamente o edifício em questão, afirmamos que não foi concluído o projeto original de Hans Broos, bem como, posteriormente esse recebeu intervenções destoantes da linguagem predominante da obra, terminando por descaracterizar o projeto do arquiteto. 
A pesquisadora da obra de Broos, e arquiteta Karine Daufenbach escreveu sobre o projeto original da Prefeitura Municipal de Rio do Sul em sua Tese, esclarecendo que a escada não receberia guarda corpo, com o tem atualmente, mas a proposta é que fosse envidraçada. Segue:
“O volume da caixa de escadas envidraçadas evoca uma sensação dinâmica do espaço, pela absorção da luminosidade através das superfícies envidraçadas e pela própria noção de movimento materializado pelas escadas.
A luz já não é mais admitida somente em contrastes com a sombra, nem em seus efeitos pictóricos; aqui ela é chamada a fazer parte da própria construção, um elemento ativo do projeto, que intenciona superar qualquer separação entre interior e exterior.
A estrutura é localizada junto às paredes internas e laterais; às demais vedações é reservado o contato com o exterior; eliminam-se as paredes, um convite à continuidade entre o espaço interno e externo, em amplo contato com a natureza. A paisagem não é mais admitida como algo remoto, mas como organismo participativo da construção. O espaço volta a ser uma realidade concreta e corpórea, um elemento ativo do projeto. Na Prefeitura de Rio do Sul: Broos persegue o ideal de leveza, a diferenciação formal e dos fechamentos, mas de uma forma muito mais madura e sem referências laterais. “(DAUFENBACH, p 43)


A proposta de Broos para a Prefeitura Municipal de Rio do Sul apresenta um burilamento entre elementos verticais e horizontais, cheios e vazios, de maneira equilibrada, que, para a obtenção da harmonia do conjunto existir, teria que ser respeitadas religiosamente as dimensões propostas pelo arquiteto – respeitando suas proporções – característica importante na arquitetura moderna – o que não aconteceu. 
Também, é perceptível a intenção existente no conjunto proposto, no projeto, de desafiar o peso através da justaposição de volumes, quando existe a opção de adoção da presença de grandes panos de vidro na fachada sul, criando o fechamento, portanto com transparência e sem bloqueio visual, integrando as áreas internas e externas. Esta passa a percepção de ser um elemento cristalino, mexendo sensorialmente com aqueles que usariam o local, se assim fosse executado. O bloco horizontal visto na fachada frontal - no segundo pavimento – era para se apresentar quase "suspenso" sobre pilotis, pois se projeta além dos limites frontais da torre, destacando de maneira sutil a partir dos mesmos pilotis. 
Último pavimento - cobertura vazada
No último pavimento era para ser construída uma cobertura parcialmente vazada, quebrando a ideia de um volume hermético e fechado. Contrapondo ao volume com fechamentos opacos, a proposta apresenta duas torres – na frente e nos fundos – com a presença de panos de vidros – mostrando a área de circulação vertical – o que também não foi executado. 
Execução do projeto não respeitou a originalidade da proposta do arquiteto, inaugurado incompleto no ano de 1960.


A proposta original, além de se encontrar inacabada está com muitos de seus ambientes descaracterizados por intervenções feitas posteriormente para usos diferentes daqueles para qual o espaço foi originalmente proposto em projeto. O resultado é uma colagem de materiais e metros de corredores separados por divisória fragmentando o grande ambiente em pequenos e apertados espaços, afastando-se completamente da intensão do arquiteto, que priorizava grande e amplas salas
Grandes beirais em balanço propiciando
profundidade e perspectiva e pilotis que
 deveriam estar "livres".
Para um observador atento e conhecedor da obra do arquiteto, é fácil detectar fragmentos de seu ideário arquitetônico inseridos no contexto, perdidos e desmantelados – muitas vezes com novo uso, como mostram as imagens a seguir.



Rachaduras





















































Ao longo da pesquisa e coleta de dados, soubemos que o edifício da Prefeitura Municipal de Rio do Sul foi tombado como um projeto executado do arquiteto Hans Broos, o que definitivamente, não confere. Não caracteriza uma obra assinada pelo Arquiteto Hans Broos, pois não está de acordo com o projeto original.



Nessa situação, teria mais sentido tombar uma outra edificação, original e executada de acordo com o projeto original do arquiteto. No ano de 2018 foi demolida, desprovida de reflexão, uma residência cujo projeto foi assinado pelo arquiteto Hans Broos - a residência Gottardi. 
As proporções (áureas) do projeto do arquiteto Hans Broos não foram respeitadas no momento de sua execução. Os croquis estão com a mesma escala. 
Residência Gottardi - Demolida em 2018 para a construção de duas torres
A virada do Século XIX para o Século XX foi tumultuada e cheia quebras de paradigmas, inícios de ciclos, mudanças tecnológicas, sociais, políticas e econômicas. Houve reflexo nas artes, como por exemplo, na arquitetura. 
Surgiu a Arquitetura Moderna na Europa, América e também, no Brasil. Período com experimentos de novos materiais - como o concreto armado. Hans Broos, quando veio para o Brasil conhecer e fazer a nova arquitetura, com a nova linguagem e materiais, limpa e cheia de arte nas linhas retas, curvas e na forma, encontrou um universo para desenvolver a sua arquitetura. Eram usados critérios matemáticos para definir a forma e não se poderia aceitar que um projeto não fosse executado como concebido. Le Corbusier e seus contemporâneos buscaram na racionalidade, proporções e limpeza da forma no período clássico da história da arte. 
A volumetria da arquitetura do arquiteto Hans Broos, além de ser conhecida pelos aspectos do brutalismo, podemos afirmar que o mesmo é um dos nomes da arquitetura moderna. O brutalismo - é um dos seus segmentos da arquitetura moderna. 
A arquitetura moderna teve duas tendências: a funcionalista e a organicista. A funcional reflete em seus espaços as imposições e exigências da sensibilidade mecanicista criada pelo ambiente industrial e a orgânica procura atender não somente às necessidades práticas e utilitárias, mas também às necessidades psicológicas do homem, com a humanização da arquitetura, integrando-a na natureza. Hans Broos tinha intimidade e se posicionava muito à vontade nas duas tendências da arquitetura moderna, como é possível observar na obra da Cia Hering – Blumenau onde trabalhou juntamente com o paisagista - Burle Marx.
Jardim suspenso - telhado verde - Arquitetura Hans Broos e Paisagismo de Burle Marx

De uma maneira abrangente - a arquitetura moderna pode ser observada a partir de alguns princípios - sempre, ou quase sempre, presentes nos projetos do Arquiteto Hans Broos
São eles: 
  • · Os pilotis (Quase sempre, descaracterizados em sua obra, para a criação de mais espaço construído - área construída); 
  • · Os tetos jardins (Um exemplo - a obra de Burle Marx - na Hering Blumenau - Projeto Hans Broos); 
  • · A planta livre
  • · Janelas longitudinal; 
  • · Ausência de fachada principal. 
  • · Simplicidade e lógica de formas - ausência do decorativismo; 
  • · Entre outros. 
São questões encontradas no projeto original da Prefeitura Municipal de Rio do Sul e não confirmada no edifício executado a partir deste projeto.
O projeto original da Prefeitura Municipal de Rio do Sul – apresenta o cuidado com a busca da leveza nas composições volumétricas de sua arquitetura, projetadas a partir das proporções áureas - responsável pela forma final da arquitetura. Não poderíamos afirmar que a volumetria da atual Prefeitura municipal de Rio do Sul apresenta esta característica, não somente por que não está alinhada às informações do projeto de Broos, como também foi submetido á uma série de intervenções posteriores que o comprometeram ainda mais - na escala pontual e no quesito materiais, desde mudanças de lay out e revestimentos não adequados e que o arquiteto não usaria – como as divisórias em abundancia no interior do primeiro pavimento. Desde o momento da entrega, o projeto não foi executado de maneira original e sua forma atual, não é somente resultado das intervenções ocorridas posteriormente.

A razão entre a altura, profundidade e largura não são as mesmas da proposta de Hans Broos desde a sua primeira construção.







Tombamento 

Através de um ato político e com a presença de políticos municipais, regionais e estaduais, entre esses, um Senador e também, governador do Estado de Santa Catarina - Luiz Henrique da Silveira, autoridade que autorizou a demolição do Complexo da FAMOSC/PROEB na cidade de Blumenau (exemplar importante da arquitetura moderna nesta cidade), foi assinado o tombamento do Edifício da Prefeitura Municipal de Rio do Sul, com a presença do Arquiteto Hans Broos, que se encontrava doente e com a idade de 88 anos, no dia 25 de maio de 2009. Alguns meses depois, foi vítima de dois derrames.

O então governador do estado de Santa Catarina Luiz Henrique da Silveira, segurando o microfone para o arquiteto Hans Broos.




Texto apresentado pelo Departamento de Comunicação da Prefeitura Municipal de Rio do Sul, sobre o evento:

"Rio do Sul – “Aprendi com um engenheiro da República Tcheca, ao qual chamava carinhosamente de Anjo Gabriel, que devemos sempre colocar a alma em nossos projetos de vida”. Com voz mansa e discurso carregado de emoção ao falar sobre resgate do patrimônio, o arquiteto eslovaco Hanz Bross agradeceu ao prefeito de Rio do Sul Milton Hobus por participar do ato de descerramento da placa que simboliza o tombamento do prédio onde hoje se localiza a Prefeitura de Rio do Sul.
A cerimônia, realizada no Hall da Prefeitura na manhã de segunda-feira (25), contou com a presença do Governador Luiz Henrique da Silveira, além do diretor do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan), Dalmo Vieira Filho.
O arquiteto Hanz Brooz é o autor do projeto de construção do edifício onde hoje se localiza o Centro Administrativo Helmuth Baumgarten, na Prefeitura. Ele comentou da alegria em perceber que após a reforma do prédio, as características arquitetônicas foram mantidas: “não me lembro dos detalhes na época quando elaborei o projeto, mas reconheço que as características principais foram mantidas e modernizadas”. Ele ressaltou ainda a emoção de saber do tombamento do prédio e que fará parte do patrimônio histórico cultural.
Durante a solenidade, o prefeito Milton Hobus agradeceu o empenho da equipe da Prefeitura que tem se dedicado à projetos de preservação do patrimônio histórico e cultural de Rio do Sul. Outros tombamentos já foram realizados na cidade no ano passado, como a Igreja Luterana do bairro Bela Aliança, a antiga escola do Matador e 20 edificações da Estrada de Ferro, como estações, ponte dos arcos, casas do feitor e casas geminadas.
A indicação para o tombamento foi feita pelo Conselho Municipal de Cultura no ano passado e torna o edifício parte do Patrimônio Histórico e Cultural do Brasil, o que possibilita a preservação da originalidade do projeto inicial e a formulação de projetos que viabilizem a captação de recursos para manutenção. O decreto de tombamento foi assinado pelo então prefeito de Rio do Sul, Jorge Teixeira no mês de dezembro de 2008."
Departamento de Comunicação da Prefeitura de Rio do Sul


O edifício da Prefeitura Municipal de Rio do Sul poderia ser denominado uma obra do Arquiteto Hans Broos, quando esta for concluída, de acordo com o projeto
Rio do Sul tem nessa iniciativa, o término da obra, a chance de ser referência nacional de sensibilidade e comprometimento com o verdadeiro e legítimo a partir da arte, arquitetura, conhecimento e respeito à obra e à memória do arquiteto Hans Broos.


Referências

DAUFENBACH, Karine. Hans Broos: a expressividade da forma. - 2006. - 147 f. :il.


Leituras Complementares - Clicar sobre Título escolhido:



























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