sábado, 26 de novembro de 2022

José Bonifácio da Cunha - Médico baiano republicano que sucedeu Otto Stutzer na Superintendência de Blumenau - Entre outras ações - trocou a data de fundação de Blumenau

No final do século XIX aconteceu um dos golpes militares da História do Brasil, quando um grupo de militares, que participaram da Guerra do Paraguai, como muitos de famílias de imigrantes do Vale do Itajaí também o fizeram, por respeito à nova pátria e ao Imperado D. Pedro II, que acompanhava a movimentação da colonização em Blumenau e região. Esse grupo de voluntários da pátria de Blumenau foi liderado pelo Tenente Emil Odebrecht, responsável, juntamente com Gottlieb Reif, por abrir uma rede de caminhos no interior do Estado de Santa Catarina interligando as regiões do Oeste, Serra, Vale do Itajaí e Litoral. Pelos feitos e por participarem da guerra do Paraguai, nunca pediram vantagens pessoais, ao contrário dos militares residentes na capital do Brasil - Rio de Janeiro. Não bastasse as inúmeras exigências para compensar seu "patriotismo" pós guerra, tomaram o poder do Imperador do Brasil, D.Pedro II, com base em Fake News e o embarcaram e sua família, na madrugada, para Europa. Foi criada uma narrativa para o feito, sob o comando do Marechal mais velho e doente, caso algo desse errado, o que não ocorreu.


Para ler tudo sobre - Clicar sobre: Proclamação da República do Brasil - Golpe Militar no Governo Imperial brasileiro

É claro que esta tomada de poder no final do século XIX, não foi muito pacífica. Após o episódio, houve muitas revoltas e motins em todo o Brasil e o surgimento de um novo partido político. Com isto surgiram novas lideranças dentro dos locais e região depondo as lideranças políticas aliadas à monarquia, muitas vezes à força e com mortes. Houve reflexos disto também na Colônia Blumenau. Já efetuamos inúmeros artigos sobre, alguns, listados no final deste. Entre estas inúmeras lideranças estavam alguns nomes, os quais os conhecemos, mas sabemos muito pouco de suas histórias e do seu recorte histórico local, no qual estes estão como atores. Vamos conhecer um pouco sobre a vida de um médico baiano que assumiu a Superintendência de Blumenau, durante estes momentos de mudanças políticas, sociais e econômicos -  (libertação dos escravos  [1888], imigrantes nas senzalas [o início aconteceu na década de 1840], proclamação da república [1889], industrialização e novos modais de transportes [ferrovia - final do século XIX/início do século XX]).
EFSC - Trecho de Subida - inaugurada em 1909.
Neste período mencionado, o médico  José Bonifácio da Cunha nascido na cidade baiana de Santo Amaro, em 7 de abril de 1860. Seu pai foi o capitão José Bonifácio da Cunha e sua mãe foi  Octavia Hahn da Cunha, de família alemã. Com sua mãe, Bonifácio Cunha aprendeu o idioma alemão. Formou-se no Curso de Medicina da Faculdade de Medicina da Bahia, com o Trabalho de Conclusão de Curso: “Diagnóstico diferencial entre as febres intermitentes legítimas”, em 1883. Cunha contava com  23 anos, quando se tornou médico e logo se mudou para o Sul do Brasil.
Cidade natal de José Bonifácio da Cunha, Santo Amaro Bahia. Fonte: IBGE.
Cunha trabalhou na Estrada de Ferro Madeira-Mamoré. Provavelmente, como médico na frente de tentar conter o avanço da malária e de doenças tropicais. Mas não foi por muito tempo, pois de sua formatura até sua chegada em Blumenau transcorreu somente 2 anos. Antes disto, Bonifácio Cunha se mudou para São Francisco do Sul SC, local onde estava um dos portos/entradas dos imigrantes alemães para as regiões do Vale do Itajaí e do Itapocu. Na cidade portuária, observando o fluxo migratório de alemães, em 1885 se mudou para Blumenau. Aprendeu o idioma alemão com sua mãe Octavia, o que facilitou muito a prática de sua profissão. Em Blumenau, atuou como médico e participou dos círculos sociais e culturais
Com um grupo de amigos em momento cultural. Como musicista era um exímio tocador de violoncelo.
da cidade. 
Após a Proclamação da República, em 1889, também passou a participar de círculos políticos, dentro das novas lideranças que surgiam na região dentro do partido Republicano.
O médico se casou com uma jovem de família local: Família Schmidt. Em primeiras núpcias, se casou com Elisabeth Schmidt, e depois, se casou com a sua cunhada, irmã de sua primeira esposa, Margareth Schmidt.

Com família formada, inicialmente, além de sua atuação como médico, ocupou cargos de Delegado de Higiene de Blumenau e Delegado Literário.
Neste novo momento político no Brasil e também, em Blumenau, surgiram nomes republicanos e lideranças estaduais e locais como: o engenheiro civil de Desterro, Hercílio Pedro da Luz, de Paula Ramos e o baiano José Bonifácio da Cunha. Hercílio Luz viveu em Blumenau, substituindo de Paula Ramos que foi transferido para Desterro, na Repartição de Terras e Colonização e foi quando conheceu o médico Bonifácio da Cunha, que foi atraído pela política, junto com os republicanos, fortalecidos após a Proclamação da República. 
Já escrevemos sobre Otto Stutzer em algumas postagens e oportunidades. Ele foi pai do pesquisador Frederico Kilian e bisavô de Bruno Kadletz. Stutzer assumiu a administração, no cargo de Superintendente da cidade (que seria o atual prefeito), em 1895. Ele pretendia continuar no cargo e para isso pretendia se eleger nas eleições para o pleito seguinte, mas não conseguiu. Perdeu as eleições para o republicano baiano José Bonifácio da Cunha. As eleições aconteceram em novembro de 1898, 9 anos após a proclamação da república. O novo partido estava bem solidificado dentro do Estado e dentro de Blumenau, através de novas lideranças políticas. Muitos, mas muitos mesmo permaneciam fiéis a monarquia. O médico venceu Stuttzer por uma diferença de somente 31 votos. Cunha recebeu 809 votos e Stuttzer, 778 votos. Contam as publicações da época, que a campanha foi acirrada. O candidato republicano tinha apoio do estado e também do jornal "Blumenaeur Zeitung", da família Baumgarten (Altona). O "Der Urwaldsbote" (Stadtplatz), jornal das famílias pioneiras e localizado na Rua XV de Novembro, apoiava Otto Stutzer.
Jornal que apoiava Otto Stutzer - "Der Urwaldsbote". Arquivo Histórico José Ferreira da Silva.
Em 1898, quando Otto Stutzer terminou seu mandato e entregou o cargo a Bonifácio Cunha, que o venceu nas eleições, pela diferença de 31 votos,  assumiu o cargo  de tesoureiro municipal, ocupou por treze anos  consecutivos, quando se aposentou  em 1916.
Quando Cunha assumiu a Superintendência, nesta mesma eleição, Pedro Cristiano Feddersen (oposição ao executivo e monarquista), foi reeleito conselheiro municipal e presidente da câmara, onde liderava a oposição que se manteve ativa no decorrer de todo o mandato do médico. 
A câmara, eleita com
Bonifácio Cunha, era formada, além de Feddersen,  por José Notari, Carlos Jansen Júnior, Anton Bernard Haedschen, Richard Holetz, Friedrich Donner (Fundador de Benedito Novo e de Timbó), Richard Voigt, Gottlieb Reif (construtos de estradas e fundador de Pouso Redondo), Karl Rieschbieter (Cervejeiro de Altona - cuja casa está localizado o atual Norden). Fato interessante ocorrido nessa eleição, foi em ter a presença da senhora Clara Donner, (solteira ela assinava Clara Von Oheme Freygang) esposa do conselheiro Friedrich Donner, obtido um voto para superintendente municipal, ocorrência rara, senão inédita no país, naquela época.

Três comentários: 
  • Friedrich Donner, um dos fundadores de Benedito Novo e fundador de Timbó, ocupava uma cadeira do Conselho de Blumenau. Nesta época a área territorial de Blumenau parecia "menor", pois estes homens cobriam estas distâncias de cavalo, ou veículo tracionado a animal.
  • Gottlieb Reif - tão injustiçado dentro da história atual, onde um prefeito conhecia o malfeitor que destruiu sua casa em Itajaí e preferiu se calar. Reif ajudou Odebrecht abrir a maioria das estradas do interior do estado e fundou Pouso Redondo, também ocupava uma cadeira do Conselho de Blumenau. 
  • E por último, acabamos de saber que uma mulher, a Clara Donner, segunda esposa do conselheiro de Blumenau Friedrich Donner (solteira assinava Clara Von Oheme Freygang) concorreu ao cargo de Superintendente de Blumenau. Histórico com certeza. Parabéns igualmente ao seu marido Friedrich Donner, por vê-la como uma companheira dentro da política, muito difícil na tradição e cultura masculina deste período, principalmente entre os latinos. Clara nasceu em 10 de junho de 1855 em Bad Liebenwerda, Elbe-Elster, Brandenburg, Alemanha e faleceu em Timbó, em 7 de novembro de 1916.
Casamento da Filha de Clara e Friedrich Donner.
José Bonifácio da Cunha tomou posse do cargo de Superintendente em 2 de janeiro de 1899, último ano do século XIX, colocando-se como fiel defensor da causa republicana.
 
Marcos do governo  Bonifácio da Cunha em Blumenau
Troca do nome do Palmenalle Strasse

Em 30 de outubro deste ano de 1899, falecia Hermann Blumenau em Brunswick, Alemanha.  Para homenageá-lo tiraram o nome de  Hermann Wendeburg da Palmenalle Strasse, a Rua das Palmeiras para colocar o nome de Blumenau. Errado. Hermann  Wendeburg ficou anos na frente da administração de Blumenau, quando Hermann Blumenau passava períodos na Alemanha. Temos inúmeras correspondências suas, enviadas para Desterro, resolvendo problemas como Diretor Interino da Colônia Blumenau. 
Então foi na administração de José Bonifácio da Cunha que  Palmenalle Strasse deixou de se chamar Boulevard Wendeburg, para homenagear Hermann Blumenau, que durante o período do Nacionalismo passou a ser chamada de Av. Duque de Caxias. Seria muito bom algum vereador de Blumenau atual, impetrar algo formal e resgatar o nome Boulevard Wendeburg.
 Palmenalle Strasse - Boulevard Wenderbur.
Troca da data de aniversário de Blumenau

Também, foi no seu governo que foi trocada a data de aniversário de Blumenau de 28 de agosto de 1852 para 2 de setembro de 1850, quando chegaram os 17 imigrantes para fundar a colônia.
Obra de Élio Hahnemann de 2002 - retratando a chegada dos primeiros 17 pioneiros, desembarcando na foz do Ribeirão da Velha, fotografado na parede da Fundação Cultural de Blumenau, localizada no edifício da antiga prefeitura municipal. 
São os primeiros 17 imigrantes:
  • Reinhold Gaertner - 26 anos de idade, solteiro, natural de Brunsvique, sobrinho de Hermann Blumenau;
  • Franz Sallenthien - 24 anos, solteiro, lavrador, também natural de Brunsvique;
  • Paul Kellner - 23 anos, solteiro, lavrador, igualmente de Brunsvique;
  • Julius Ritscher - 22 anos, solteiro, agrimensor, natural de Hannover.
  • Wilhelm Friedenreich - com 27 anos de idade, alveitar, natural da Prússia, casado com ...
  • Minna Friedenreich - 24 anos de idade, possuindo o casal os seguintes filhos; 
  • Clara Friedenreich - com 2 anos de idade; 
  • Alma Friedenreich - com 9 meses.
  • Daniel Pfaffendorf - 26 anos de idade, solteiro, carpinteiro, natural da Saxônia; 
  • Friedrich Geier - 27 anos de idade, solteiro, marceneiro, natural de Holstein;
  • Friedrich Riemer - 46 anos de idade, solteiro, charuteiro, natural da Prússia.
  • Erich Hoffmann - 22 anos de idade, ferreiro, funileiro, também da Prússia;
  • Andreas Kuhlmann - 52 anos de idade, ferreiro, igualmente da Prússia, acompanhado da esposa; 
  • Johanna Kuhlmann - 44 anos de idade, e das filhas; 
  • Maria Kuhlmann - 20 anos de idade; 
  • Christine Kuhlmann - 17 anos.
  • Andreas Boettcher - 22 anos de idade, solteiro, ferreiro, natural da Prússia.
Foi Hermann Blumenau, como fundador e diretor da colônia, que determinou a data de fundação em 28 de agosto de 1852, dia no qual foram distribuídos os primeiros lotes coloniais, a partir de um leilão que promoveu - negócios privados de sua empresa. 
A chegada dos primeiros imigrantes foi, então, considerada, por caracterizar melhor, o início da colônia e de sua colonização. 
A
câmara de 1899 efetuou a troca da data de fundação e no ano de 1900, festejou o 50° aniversário  com grande solenidade.

Monumento do Imigrante

Foi na administração de Bonifácio da Cunha que providenciado o monumento do imigrante erguido na praça pública do porto fluvial, localizado no Stadtplatz da Colônias Blumenau.
Blumenau em Cadernos - Abril 1962.

Monumento do Imigrante construído para as comemorações dos 50 anos da chegada dos primeiros 17 imigrantes alemães. Construção no ano de 1900.
Álbum Comemorativo

Bonifácio da Cunha também publicou  um álbum com clichês, feito na Alemanha apresentando Blumenau com 50 anos de existência.


Ponte sobre a Foz do ribeirão Garcia

Por iniciativa de Bonifácio da Cunha em sua administração foi trocada a ponte sobre o Ribeirão Garcia - que era de madeira (lindíssima e muito comum na Alemanha - algumas cobertas e existentes até a atualidade), foi substituída por uma de ferro -  com o apoio do Governador de Santa Cararina, Felipe Schmidt. Governo sucessório de Hercílio Pedro da Luz.



Novas eleições e cargos

Em  2 de setembro de 1902 aconteceu eleição para a renovação do governo municipal e o médico pretendia se reeleger - o não aconteceu.
Foi derrotado pelo candidato de Coronel Feddersen, oposição aos republicanos e ligado à política local - monarquistas, que também apoiavam o governo do estado. Foi eleito Alwin Schrader, que permaneceu no cargo por 12 anos consecutivos
Lembramos, igualmente, que foram estas lideranças, as responsáveis pela construção da Estrada de  Ferro Santa Catarina - EFSC, através de intercâmbio com Alemanha, que investiu, através de bancos privados e Cia Colonizadora Hanseática,  na única ferrovia alemã com capital e tecnologia deste país. Tudo isso foi possível a partir da visita do embaixador alemão Friedrich Richard Krauel   na região, em 1897 - link no final da postagem.
Em 1903, tornou-se sócio efetivo do Instituto Histórico e Geográfico de Santa Catarina (IHGSC),

Cunha  foi eleito algumas vezes como Deputado à Assembleia Legislativa de Santa Catarina, na época conhecida como  Congresso Representativo. 
Os pleitos:
  • 1ª Legislatura (1891), eleito com 7.897 votos, foi Constituinte Estadual de 1891 e Suplente de 2º Secretário da Mesa Diretora;
  • 2ª Legislatura (1894-1895), eleito com 5.479 votos, foi Deputado Constituinte de 1895;
  • 3ª Legislatura (1896-1897);
  • 5ª Legislatura (1901-1903), eleito com 4.142 votos;
  • 6ª Legislatura (1904-1906), recebeu 8.386 votos; e
  • 7ª Legislatura (1907-1909), renunciou ao mandato, conforme Relatório do Presidente da Província (1908).
Em Blumenau, ainda exerceu os seguintes cargos:
  •  de juiz entre o período de 16 abril de 1893 até o fim de 1896;
  • chefe escolar de 1900 a 1905;
  • membro da junta de alistamento militar em diversos períodos;
  • médico da Comissão de Terras de 1895 a 1896, data em que foi exonerado pelo governador Hercílio Luz, de quem Cunha passara a discordar politicamente.
Os últimos anos de sua vida foram em Florianópolis, para onde Bonifácio da Cunha mudou-se com a família e onde faleceu em 18 de dezembro de 1915. Trabalhou até o fim. No ano anterior à sua morte, foi nomeado Inspetor Veterinário no Estado de Santa Catarina e integrou a Comissão de Propaganda do Brasil na Europa.

Um Registro para a história.
Referências 
  • Memória Digital: José Bonifácio da Cunha. Disponível em: https://www.blumenau.sc.gov.br/secretarias/fundacao-cultural/fcblu/memaoria-digital-josae-bonifaacio-da-cunha83 . Acesso em 23 de novembro de 2022. 16:00h.
  • Memória política de Santa Catarina. José Bonifácio da Cunha. Disponível em: https://omunicipioblumenau.com.br/registro-para-historia-voce-ja-ouviu-falar-de-paul-august-rudolf-damm-jornalista-poeta-compositor-cantor-tradutor-e-professor-blumenau-seculo-xix/ . Acesso em 23 de novembro de 2022. 14:30h.

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Sou Angelina Wittmann, Arquiteta e Mestre em Urbanismo, História e Arquitetura da Cidade.
Contatos:
@angewittmann (Instagram)
@AngelWittmann (Twiter)


Em breve – Estaremos lançando o livro: “Fragmentos Históricos - Colônia Blumenau”


Sob Revisão!!. 













2 comentários:

  1. Adorei conhecer a historia do meu bisavô, José Bonifácio da Cunha!

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    1. Ah que legal. Também és parente de Carlos Braga Müller então. Assista sua palestra...Abraços.

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