sábado, 28 de dezembro de 2019

Antiga Fábrica de Chapéus Nelsa (Incêndio) e Fachadismo (Projeto) de Simon Gramlich

Edifício  da antiga Fábrica de Chapéus Nelsa - após o incêndio ocorrido em  28 de dezembro de 2019 - às 00:15h, localizado no bairro Victor Konder, Rua São Paulo - Blumenau SC. No local atualmente estavam instaladas as casas comerciais: Herval Móveis e Colchões, Top Festas, loja Maestria, Top Mobile Louças e Metais, e o Consultório Dr. Fabrício Fernandes.


Foto da Fábrica de Chapéus Nelsa apresentando a nova imagem logo após a intervenção na fachada - década de 1950 e após o incêndio em 28 de dezembro de 2019. Fonte da 1° Foto: Arquivo Histórico José Ferreira da Silva.
Simon Gramlich.
A nova fachada do antigo edifício da Fábrica de Chapéus Nelsa seguia as linhas do Art Decó, e foi construída entre as décadas de 1940 e 1950. É um dos edifícios não religioso, que recebeu o trabalho do enigmático "arquiteto das catedrais" Simon Gramlich cuja obra, só na região, ultrapassa a 500 projetos, mas muito poucos o conhecem. 
Gramlich  foi um Engenheiro-arquiteto nascido na cidade de Herbolzheim - estado de Baden Würtemberg - Alemanha, no dia 7 de agosto de 1887. Pouco, muito pouco registro sobre sua vida privada e profissional a não ser sua vasta obra executada em muitas cidades do Sul do Brasil, composta de projetos com características  ecléticas da virada do século XIX para o século XX, Art Decó, neogótico, neoclássico e moderno - que variam de residências de todos os tamanhos, fábricas, escolas, espaços comerciais e muitas igrejas. Em Blumenau, como por exemplo, o prédio da antiga fábrica consumida pelo fogo, no dia 28 de dezembro de 2019 - Fábrica de Chapéus Nelsa, onde o arquiteto executou a fachada no estilo art decó a partir do decorativismo entre outros muitos, ainda presentes na paisagem. Gramlich possui muitos projetos executados em toda a região do Vale do Itajaí. (link sobre no final desta postagem)
Foi durante esta pesquisa que concluímos que o arquiteto só projetou a fachada nova da fabrica. Para confirmar, fomos até o local do incêndio, ainda no dia 28 de dezembro e verificamos que partes do antigo edifício (construído no início da década de 1930) não foi demolido para o construir um "novo" projetado por Gramlich, como se pressuponha. O que vimos, foi uma reforma que recebeu adornos e elementos decorativos na fachada para aparentar "o novo" e atual estilo para época - art decó.
Resultado de imagem para incendio blumenau 28 de dezembro de 2019"
Incêndio - Madrugada de 28 de dezembro de 2019 - início a 00:15 horas.
A Fábrica
Resultado de imagem para Hermann Weege"
A fábrica de chapéus foi fundada em 1925 por August Theodor Rudolph Clasen e Hermann Weege sob a denominação de Clasen e Weege. A primeira sede da fábrica de chapéus foi instalada  em Altona, próximo ao casarão da Salinger e das oficinas da EFSC. Na época contrataram o profissional chapeleiro polonês, profissão praticamente extinta, Rudolf Leder, que  trabalhava em  Limeira - São Paulo.
Fonte: Gabriela Poltronieri Lenzi
De acordo com a pesquisa de Gabriela Poltronieri Lenzi desenvolvida em Salamanca - Memórias de Pessoas e Chapéus Em Blumenau, Brasil, e Florença, Itália - a ideia para a fundação da fábrica de chapéus partiu de um representante da fábrica alemã IG Farben - Herr Staritz em uma de suas visitas à Blumenau, em 1925, quando sugeriu sua ideia a August Theodor Rudolph Clasen e Hermann Weege. No mesmo ano, August Theodor Rudolph Clasen e Hermann Weege montaram a fábrica. Clasen forneceu o espaço físico localizado em Altona e Weege, entrou com o capital. Passando um tempo, a firma assumiu outro sócio, que não permaneceu por muito tempo e era conhecido como Olinger e foi então que contrataram Rudolf Leder.
Cecília Weege.
Em 1931, Friedrich Karl Kurt Lischke, que trabalhava em Florianópolis para Carl Hoepckecasando-se com a filha de Hermann Weege, Cecília Weegeingressou na sociedade de chapéus junto com o chapeleiro Rudolf Leder, passando a fábrica a se chamar Leder e Lischke
Friedrich Karl Kurt Lischke, como genro de Hermann Weege, assumiu a sociedade da fábrica de chapéus com chapeleiro Rudolf Leder.
De acordo com o livro Colônia Blumenau no Sul do Brasil - Tomo I, página 144, Friedrich Karl Kurt Lischke nasceu em Berlin - Alemanha, em 1898 e emigrou para o Brasil em dezembro de 1923, quando foi contratado pela Firma Carl Hoepcke de Florianópolis. Era engenheiro mecânico e casou-se com Cecília Weege de Pomerode em 1929, quando a fábrica de chapéus tinha 4 anos de funcionamento. Quando ingressou para a sociedade já era casado por três anos.
Nós conhecemos esta pesquisadora - no colégio  - Satisfação pesquisar em seu trabalho.
A
Frau Leder, esposa do sócio August Theodor Rudolph Clasen e que tinha o nome de Elsa, auxiliava na costura dos acabamentos dos chapéus ao lado de funcionárias contratadas - que não passavam de cinco. Os acabamentos dos chapéus se resumiam em: aplicação de forro de seda no seu interior, junto com um acabamento  de couro e um laço e uma fita de seda no lado externo. 
Neste mesmo ano de 1931, a fábrica de chapéus se mudou para um prédio novo construído com a presença da mansarda e tipologia característica do imigrante alemão no mesmo local, onde é tido como o local da fábrica de chapéus, nos dias atuais - na Rua São Paulo - no Bairro Victor Konder. Um artigo publicado em um jornal do Rio de Janeiro em 1942, menciona a fabrica e a mostra em uma fotografia inserida neste. Concluímos então, que até esta data - 1942 - da publicação não houve a revitalização da fachada como conhecemos atualmente efetuada pelo arquiteto Simon Gramlich. Também, neste tempo, a fábrica já era conhecida como Fábrica de Chapéus Nelsa. Nesta data, o genro de Hermann Weege foi preso em Florianópolis, pelas forças do Nacionalismo de Vargas e  Ramos.

Foto 1 da matéria do Jornal do Rio de Janeiro "A Manhã"- 1942 - a fábrica de chapéus já era conhecida como Fábrica de Chapéus  Nelsa - desde janeiro de 1940. Foto: Repórter

Nesta fotografia da
matéria do jornal do Rio de Janeiro (acima e abaixo), pode-se observar que a parte dos fundos da fábrica não foi  modificada, após a intervenção coordenada por Simon Gramlich. Fomos até o local para observar o que restou do edifício após o incêndio de dezembro de 2019, para algumas conclusões no final desta postagem. 
Foto 2 da matéria do Jornal do Rio de Janeiro"A Manhã" - 1942, edifício antigo da década de 1930. Foto: Repórter.
Fotografia tirada de dentro da propriedade de Cecília Weege Lischke e depois de  Ellen J. Weege Volmer - repórter menciona no artigo (abaixo) que foi do interior de uma propriedade, desconhecia ele, que era dos proprietários da fábrica.
Matéria do Jornal do Rio de Janeiro"A Manhã" - 1942 - que acompanhou as duas fotos anteriores.
Prosseguindo...

O almanaque  Almanak Laemmert publicado no Rio de Janeiro que apresentava empresas: Administrativo, Mercantil e Industrial (RJ) -  entre as datas de 1891 a 1940, confirma a nova sociedade da fábrica nesta data, onde apresenta a fábrica de chapéus como a firma  Leder e Lischke. Um detalhe que deve ser levado em consideração é que o  Lischke do nome da firma, pode significar Cecília Weege Lischke e não Friedrich Karl Kurt Lischke, como muito deixam entender. Cecília assumiu a presidência da fábrica em 1942 (quando o marido  Friedrich Karl Kurt Lischke foi preso em um campo de concentração em Florianópolis) e esta permaneceu presidente até a Fábrica de Chapéus Nelsa fechar, na década de 1960.
Observando a matéria publicada acima, o jornalista afirma que Friedrich Karl Kurt Lischke, junto com outros membros da diretoria da fábrica, recebeu o repórter em  1942. Então Cecília só pode ter assumido a presidência da fábrica, nos últimos meses de 1942.
Em janeiro de 1940 a fábrica foi transformada em sociedade anônima, e então passou a se chamar de Fábrica de Chapéus Nelsa S.A, como ficou conhecida até os dias atuais.
 Friedrich Karl Kurt Lischke foi preso e sua esposa Cecília assumiu a presidência da Fábrica de Chapéus Nelsa.
A configuração atual do edifício da fábrica, através da intervenção do projeto de adequação  e de fachadismo de Gramlich, refletia os "novos tempos" da fábrica, que além de chapéus, passou também, a produzir boinas e ombreiras de lã.
A "nova arquitetura" a partir do uso do "Fachadismo" se resume em três volumes aparentes integrados com o tradicional telhado feito com estrutura de madeira com dois panos e telhas de barro rabo de castor ou germânica, caracterizado com a inclinação presentes nos telhados das casas alemãs construídas na Alemanha e também, na região, com o acréscimo do elemento frontal, um tipo de  "platibanda" coma forma arredondada que encobriu as empenas destas construções. Estes elementos, platibandas com a forma de meio circulo, munidas  com o acréscimo do decorativismo da linguagem do art decó, formaram a fachada do edifício conhecida atualmente. 

Percebemos estas questões, após uma visita in loco no mesmo dia do incêndio que destruiu a edificação histórica.
As imagens comunicam...



























Quando a Fábrica de Chapéus Nelsa - fechou suas portas?

De acordo com a pesquisa desenvolvida pela arquiteta Silvana Maria Moretti no Programa de pós Graduação em Geografia da UFSC, em 2006, Fábrica de Chapéus Nelsa encerrou suas atividades em 1965.
Outro detalhe curioso que a história oficial não conta é que, de acordo com a pesquisa de Moretti, Cecília (Weege) Lischke, esposa de Friedrich Karl Kurt Lischke, herdeira da Fábrica de Chapéus Nelsa, assumiu a  presidência da fábrica entre os anos de 1942 até 1965 (quando encerrou suas atividades) e também, da Malharia Majú, que fundou em 1953. 
Analisando os dados históricos coletados e organizados de maneira cronológica, concluímos que Cecília Weege Lischke assumiu a presidência da fábrica, porque seu marido foi preso em um campo de concentração em Florianópolis - durante o período do Nacionalismo na região. Não sabemos detalhes deste período, como por exemplo, o tempo que Friedrich Karl Kurt Lischke  permaneceu preso e porque Cecília Weege Lischke ficou no cargo até a fábrica fechar.
Wandér Weege e sua prima (de uma geração anterior) Ellen J. Weege Vollmer, 
sobrinha de Cecília, no dia da inauguração do Museu Hábitos e Costumes, 
em Blumenau. 
A sociedade,  muitas vezes,  esconde informações nas  "dobraduras" da história
Para acessar a fotografia de Cecília Weege Lischke em frente à  Maju, em uma publicação "Memória Digital" - Clicar sobre: Memória Digital: Maju
Lembramos também, que Cecília Weege Lischke foi tia de  Ellen J. Weege Volmer, que residia no terreno onde está localizado atualmente, o Supermercado Giasse, e dona do acervo doado para o museu de Blumenau "Uso e Costumes". Link no final da postagem.
Contribuição importante enviada pelo genealogista catarinense e membro da família de Emil Odebrecht - Marcos Schroeder. Gratidão pelo envio.

Árvore genealógica, fixada na parede do Museu Weege - antiga residencia Weege - Pomerode SC.


Contribuição acervo de Marcos A. Roeck - via redes sociais - Nossa gratidão.
Tudo para ser Chapéus Nelsa
Contribuição acervo de Marcos A. Roeck - via redes sociais - Nossa gratidão. A outra empresa fundada por Cecília Weege Lischke estava no entorno da fábrica de chapéu. Também sua residência poderia ser no mesmo local onde residia sua filha Ellen - casa demolida para construir o supermercado em uma importante esquina de Blumenau.


























Chapéus Nelsa no Museu Weege em memória a Hermann Weege (link abaixo) - Pomerode SC.


Não confere o texto publicado no Blog da NSC no dia 28 de dezembro de 2019.
 "(...) O imóvel foi erguido entre o fim da década de 1930 e o início da década de 1940. (...) o autor do projeto foi o alemão Simon Gramlich, arquiteto que também desenhou as igrejas de Gaspar, Itajaí, Rio do Sul, e foi o responsável por mais de 400 edificações antes da primeira metade do século 20. (...)"
Simon Gramlich interferiu na fachada da fábrica, cujo edifício já existia no local de acordo com a publicação do jornal do Rio de Janeiro, somente a partir de década de 1950, sendo que deixou boa parte da antiga construção da década de 1930, alterando somente a fachada frontal com o acréscimo de elementos do art decó.

Histórias da Colônia Blumenau!
-------------
Primeira reunião do COPE - Conselho Municipal do Patrimônio Cultural Edificado
30 de março de 2022

Em 30 de março de 2022 assumimos uma cadeira de Conselheira como representante da CAU - Conselho de Arquitetura e Urbanismo, no COPE - Conselho Municipal do Patrimônio Cultural Edificado, onde estava em uma das pautas - a "fachada" da Fábrica dos Chapéus Nelsa, parte do Projeto do arquiteto alemão Simon Gramlich. Aparentemente, desde o incêndio, parte deste patrimônio está em pauta no COPE. Existiu projeto para adequar o uso, considerando a presença da fachada integrada à nova edificação, mas encontrou entraves durante os debates e não foi aprovado. Por duas vezes. Todo o processo de aprovação e análise se alongou muito e o resto do patrimônio não pode esperar e ficava com situação pior, quanto a sua patologia da estabilidade. O incêndio aconteceu em  28 de dezembro de 2019 e em março de 2022, ainda se decidia sobre as ruínas dos arcos da fábrica que se encontravam em pé. Demorou muito. 
Ao longo deste processo, foram apresentados 2 projetos e 4 laudos sobre a segurança desta fachada, que se recuperada, demanda um orçamento alto.
De qualquer maneira, pode-se manter os arcos. Tem como manter os arcos no local e expusemos aos interessados, que se conseguirem fazê-lo, estarão demonstrando comprometimento com a cidade, sensibilidade com sua história e estarão possuindo algo inédito e cheio de lastro histórico. Dispensando qualquer custo com publicidade, pois sua própria ação, será uma publicidade que encherá os olhos.
Após debates, ficou deliberado que o proprietário poderá retirar os arcos (que se encontram escorados - construídos com técnica construtiva autoportante com tijolos maciços) seguindo a orientação dos laudos técnicos, que afirmam, estes estão de pé, por conta das escoras colocadas para segurá-los. Esperamos  que repensem e se puderem (investimento), mantenham esta fachada. É sabido e foi debatido que demanda um pequeno capital.
Nosso voto foi contrário à demolição, ciente de que se pode manter, mas também ciente que pode ser algo difícil de se concretizar, em função do alto custo para mantê-lo.
-------------
O Proprietário decidiu retirar os arcos da Antiga Fábrica Nelsa do local e perdeu uma oportunidade.
1° de março de 2022

Vídeo feito por Dieter Altenburg

Se o proprietário optasse em deixar os arcos em seu empreendimento, teríamos grande alegria e prazer em comunicar sobre ele e publicar neste espaço, como um registro para a História. Agora, resta-nos somente colocar um ponto final.





Em construção....

Leituras complementares - Para ler - clicar sobre:
  1. Legado Hermann Weege - Pomerode
  2. Simon Gramlich (Simão Gramlich no Brasil) - Arquiteto alemão com uma obra imensurável no Brasil e vida cheia de mistérios
  3. Livro sobre Altona - Momentos do Lançamento
  4. Um passeio pelo Bairro de Itoupava Seca e um pouco de sua História
  5. Arquitetura - Apresentação e análise da Casa Salinger - Blumenau SC - Sul do Brasil
  6. Carl Franz Albert Hoepcke - Uma personalidade da História Catarinense
  7. Um passeio pelo Bairro Victor Konder - no Espaço e na História - Blumenau
  8. Nacionalismo no Vale do Itajaí - a partir do Governo de Getúlio Vargas
  9. Após finalizar mestrado na Espanha, designer de moda retorna ao Vale do Itajaí
  10. Museu de Hábitos e Costumes de Blumenau - Momentos de sua inauguração

Referências

FROTSCHER, Méri. Da Celebração da Etnicidade Teuto-brasileira à Afirmação da Brasilidade: Ações e discursos das elites locais na esfera pública de Blumenau (1929-1950).Tese apresentada ao Programa de Pós-Graduação em História - UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA CATARINA CENTRO DE FILOSOFIA E CIÊNCIAS HUMANAS PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM HISTÓRIA. Florianópolis, 2003.

GERLACH, Gilberto S.; KADLETZ, Bruno K.; MARCHETTI, Marcondes. Colônia Blumenau no Sul do Brasil. 1. ed. São José: Clube de cinema Nossa Senhora do Desterro, 2019. 

LENZI, Gabriela Poltornieri. Memória de Pessoas e de Chapéus em Blumenau, Brasil e Florença, Itália.Trabalho de Fim de Mestrado Universitário em antropologia de Iberoamerica apresentado à Universidad de Salamanca para cumprimento parcial dos requisitos para o título de maestria em Antropologia de Iberoamerica. Salamanca, 2014.

MORRETTI, Silvana Maria. Fábrica e Espaço Urbano: A Influência da Industrialização na Formação dos Bairros e no desenvolvimento da Vida Urbana em Blumenau. Dissertação de Mestrado - Universidade Federal de Santa - Catarina Centro de Filosofia e Ciências Humanas - Programa de Pós-Graduação em Geografia. Orientador: Prof. Msc. Luís Fugazzola Pimenta.  Florianópolis/SC, janeiro de 2006.
História de vida Sra. Cecília Lischke. Blumenau em Cadernos. Tomo XLIII. N. 07/08. jul/ago 2002. 
SCHROEDER, Marcos - envio de dados de genealogia.














Um comentário: