segunda-feira, 6 de novembro de 2023

O Edifício América - Centro Histórico de Blumenau - Dossiê para a História.

Localização do Edifício América visto de cima da Ponte Adolfo Konder, na área central de Blumenau, estruturada pelo rio Itajaí Açu. O grande rio se forma em Rio do Sul – no Alto Vale do Itajaí e tem sua foz em Itajaí/Navegantes. O edifício América teve sua construção iniciada próximo à foz do Ribeirão Garcia, no Centro Histórico, ocupado pelos pioneiros na metade do século XIX. Entre a foz do Ribeirão Garcia e o Edifício América, está somente a Praça Hercílio Luz, espaço do antigo e histórico porto, local público por excelência, atualmente, também ocupada por construções privadas.
Local do registro fotográfico da capa deste artigo. Fonte Google Earth.

Registro fotográfico do Edifício América – usado em janeiro de 2022, em Brasília, no documento que apresentou a mudança de lei ambiental no Senado, aprovada, segundo o jornalista da NSC – Machado – no apagar das luzes dos trabalhos em dezembro de 2021. Por quê? Onde está o restante da paisagem – parte do “Meio Ambiente”? Paisagem histórica. Fonte: Machado, 2022.

Achamos importante compreender o imbróglio que envolve o esqueleto de um edifício localizado em um dos pontos mais importantes do Vale do Itajaí, historicamente, sua primeira centralidade, conhecido como Edifício América. Seria possível dizer que se trata de mais uma das histórias relacionadas a espaços importantes de Blumenau e região, geralmente públicos, cujos destinos são decididos por poucas pessoas e o processo, quase sempre, passa desconhecido para sociedade. Dessa forma, a cidade/região herdam suas consequências – quase sempre, não muito boas.
Vejamos a história do Edifício América, localizado em uma das extremidades da Palmenalee – Rua das Palmeiras e ao lado do antigo porto fluvial de Blumenau – que já foi o Alto e Médio Vale do Itajaí quando seu território era parte da Colônia Blumenau, e este local era sua centralidade.

Local do Edifício América no final do Século XIX, com destaque para o porto fluvial – Atual Praça Hercílio Luz.





O Stadtplatz
Stadtplatz da Colônia Blumenau – Centro Histórico de Blumenau. Área nobre sob vários aspectos.
A importância deste espaço para o Vale do Itajaí é de conhecimento público, tratando-se de local amplamente procurado por visitantes e também, por residentes locais. Ao longo de sua história, qualquer intervenção, ou ocupação fora da linha, poderia ter consequências não muito positivas e irreversíveis para projetos de intervenção urbanística no local. Neste mesmo espaço, como contemporâneos, “assistimos” à construção de uma nova ponte na foz do Ribeirão Garcia, e à construção de edifícios privados sobre a praça do porto – Praça Hercílio Luz.
Também houve a tentativa de efetivar a construção de uma loja de departamentos, em uma das extremidades da Palmenalle – rua das Palmeiras, sendo que na outra extremidade encontra-se a estrutura inacabada do Edifício América, desde a década de 1970. No ano de 2021, e na entrada de 2022, o assunto do Edifício América ocupou as manchetes dos principais veículos de comunicação local e regional – e até mesmo nacional – assim como as redes sociais.
Percebemos a presença de um forte lobby para que a obra fosse terminada, ainda que o “grão” seja maior do que tudo que é construído nessa região histórica. Na época, também foi construído um edifício na região, na outra margem do Itajaí-Açu, em área de APP – área de preservação, interrompendo o Skyline da região histórica e do centro de Blumenau.

Skyline, considerando a torre construída na área de Preservação, ao lado da Prainha, na outra margem do Rio Itajaí Açu, oposta aquela onde está localizado o antigo porto fluvial. Fotografia da vista do local que dá acesso à Rua das Palmeiras – Boulevard Hermann Wendeburg, a partir do morro da Igreja Luterana centro.








Registro do ano de 2017.
Outras intervenções questionáveis no local do Centro Histórico de Blumenau. Acima, mapa publicado na coluna do jornalista Francisco Fresard. É "preciso espaço para os automóveis" - para isto se constrói mais uma ponte impactando com a ponte existente sobre o ribeirão Garcia parte do projeto de revitalização da década de 1960 que contava com o destaque de vários caminhos e plástica belíssima. Caminhos, sob esta ponte que margeavam o ribeirão rumo à propriedade de Hermann Blumenau e o Cemitério do Gatos ficamo sob pontes e sem o mesmo caráter. Ponte concluída em março de 2021. 
A história do Edifício América

Em 2022, após exaurir-se o assunto sobre a construção de uma loja de departamentos em uma das extremidades da Palmenalle – Rua das Palmeiras, Centro Histórico de Blumenau, foi resgatado o assunto (antigo) da construção na outra extremidade da mesma rua – o Edifício América, tema de muitas décadas e um impasse. Isto nos impulsionou a fazer esta pesquisa, para compreender como e por que aconteceu o impasse histórico. Compartilhamos a pesquisa aqui.
Como de hábito, vamos apresentar o local histórico e seu surgimento, ou seja, a centralidade da Colônia Blumenau para, após este embasamento, expor o significado do Edifício América.

Centro Histórico de Blumenau

A região do Centro Histórico de Blumenau, no tempo presente, ainda é visada por investidores imobiliários, como sempre foi, ao longo da história, embora, a partir de narrativas, nos queiram fazer compreender que é diferente. Lembramos novamente, que somos guardiões da cidade que estamos deixando para as novas gerações. “Recebemos” o Centro Histórico fundado pelos pioneiros, e deixaremos esse espaço, bem ou mal cuidado, à próxima geração.
A história do Centro Histórico teve início na metade do século XIX. Foi escolhido por sua estratégica localização dentro do projeto regional e, diferentemente do momento presente, pautado em um projeto urbanístico
A estrutura do Stadtplatz, contando com elementos como o rio, ribeirão, Palmenalle, Morro do Aipim, Prainha, … , e o volume do Edifício América.
de colônia na escala regional, com área muito maior que a atual área de Blumenau.


Uma das primeiras imagens do Stadtplatz da Colônia Blumenau com o casario ao longo do eixo onde seria o traçado da Rua das Palmeiras- Palmenalle.
Estrutura histórica do Stadtplatz com a localização do Edifício América. Perspectiva vista da Igreja Luterana Centro.

Vista para a Praça da Prefeitura/Porto apresentando sua movimentação – localizada na Palmenalle – Rua das Palmeiras. Local de chegada, partida e convívio de pessoas, encontros, lazer entre outros. Movimento e uso do espaço. A presença do transporte fluvial, com ponto final na última área navegável do rio Itajaí Açu.
Praça da Prefeitura/Porto, década de 1960, com novos equipamentos e layout integrando paisagens, arquitetura, caminhos com a presença de um paisagismo formal.
O sítio e seu entorno – Formação histórica.

Em 15 de maio de 1850, com a assinatura de contrato aprovado por decreto entre os Príncipes de Joinville e a Sociedade de Colonização de Hamburg, aprovado pelo decreto governamental, foi fundado a Colônia de Dona Francisca, atual Joinville. No mesmo ano, Hermann Blumenau funda a Colônia Blumenau.
O contexto do Centro Histórico de Blumenau Stadtplatz da Colônia Blumenau em sua origem, é resultado de um projeto privado para se instaurar uma colônia agrícola, com uma linha de produção observando o ideário do economista francês Quasnay. Com uma população inicial inferior a 20 pessoas, o embrião urbano construído por estes primeiros pioneiros, nas primeiras décadas de história, contava com uma equipe técnica para organizar, não somente o traçado urbano da Colônia Blumenau – Stadtplatz e sede da colônia agrícola, baseada nas diretrizes de Quasnay, mas também para desenvolver um projeto regional a partir da infraestrutura.
Para isto, as primeiras lideranças, contavam com engenheiros agrimensores para efetuar o levantamento do principal elemento natural estruturador, os cursos d’água. Entre estes: Emil Odebrecht, José Deeke, Heinrich Krohberger, Heinrich Kreplin, Carl August Wunderwald, entre outros.
Bacia do Itajaí que – conforme levantamento de engenheiros agrimensores e técnicos, estruturam a rede de nucleações urbanas da Colônia Blumenau, que deu origem a rede de cidades do Vale do Itajaí, quando estas foram emancipadas do Stadtplatz da Colônia Blumenau. O mapa mostra a localizações das atuais nucleações nos vales e junto aos cursos de água da hidrobacia.
A partir dos cursos d’água e observando sua navegabilidade foi estudado o local em que seria edificada a sede da Colônia Blumenau. No último ponto navegável do rio Itajaí Açu e deste ponto para o interior – observando a estrutura formada por rios e ribeirões formadores da atual Bacia do Itajaí.
A configuração geográfica do Vale do Itajaí, e da região junto à foz do Ribeirão Garcia foi importante para a definição do local do sítio do primeiro núcleo urbano da Colônia Blumenau – Stadtplatz (a centralidade). No local foram observados o rio Itajaí Açu, os ribeirões Garcia, da Velha e outros ribeirões menores, como os ribeirões Bom Retiro e Fresco, os quais estruturaram e foram os guias e caminhos fluviais de penetração na área, e o vale foi, o limitador, através de sua topografia acidentada, quanto ao tipo de apropriação e uso do solo. Neste local, cuidadosamente estudado e escolhido, está localizada a estrutura do Edifício América.
O sítio físico onde foi assentado o primeiro núcleo urbano da Colônia Blumenau está situado na confluência do rio Itajaí Açu com o ribeirão Garcia, último trecho navegável daquele Itajaí Açu. O acesso ao local, pelos primeiros imigrantes, foi feito através de balsas e canoas. A ocupação do sítio foi efetivada com a demarcação dos lotes coloniais a partir da estrutura fundiária desenhada por agrimensores alemães em 1864, embora os primeiros imigrantes já tenham tido posse da terra em 1852. Lembramos que já existiam famílias pioneiras residindo nos arredores e que muito auxiliaram no assentamento da colônia agrícola de Hermann Blumenau, fato muito pouco divulgado.
O Stadtplatz no destaque – a centralidade da Colônia Blumenau – primeira nucleação – onde está parte do Centro Histórico de Blumenau atual. Elementos estruturadores: Porto fluvial, rio e ribeirões e o Boulevard Palmenalle – Rua das Palmeiras batizada primeiramente como Boulevard Hermann Wendeburg.
Foram locados nesse traçado os rios, traçados de picadas, para deslocamentos a pé, a cavalo e estradas carroçáveis. Também foi desenhado o primeiro parcelamento de terras no Vale do Itajaí. Neste primeiro projeto teve destaque juntamente com o porto fluvial, a rua principal que posteriormente recebeu ajustes e paisagismo. Um Boulevard com arborização central, nos moldes dos Boulevares franceses na época da intervenção de Haussmann na cidade de Paris, o Palmenalle – Rua das Palmeiras, atual Alameda Duque de Caxias, onde, em uma de suas extremidades, junto ao porto fluvial – foi irregularmente construída a estrutura do Edifício América, e aí se encontra por mais de 45 anos. O primeiro nome desse Boulevard foi Hermann Wendeburg e residia na casa, depois adquirida pela família de Paul Schwarzer, sogro de Otto Rohkohl, pai de Renate Luise Rohkohl Dietrich, que doou a casa, então a mais antiga da região que foi Colônia Blumenau, à municipalidade de Blumenau, atualmente parte do Museu da família Colonial, localizado no Centro Histórico de Blumenau.











Foram locados neste traçado, os rios, traçados de picadas, para deslocamentos a pé, a cavalo e estradas carroçáveis. Também foi desenhado o primeiro parcelamento de terras no Vale do Itajaí. Neste primeiro projeto teve destaque juntamente com o porto fluvial, a rua principal que posteriormente recebeu ajustes e paisagismo. Um boulevard com arborização central, nos moldes dos boulevares franceses na época da intervenção de Haussmann naquela cidade, conhecida Palmenalle -  Rua das Palmeiras, atual Alameda Duque de Caxias, onde, em uma de suas extremidades, junto ao porto fluvial - irregularmente foi construída a estrutura do Ed América, e se encontra no local por mais de 40 anos.
Vista em direção ao rio Itajaí-Açu, com a presença do Galpão do Imigrante (material usado na construção da Casa São José, Palmenalle) e o Morro do Aipim coberto pela mata, presente no local no momento atual. Destaque para a localização do Edifício América.
Traçado estruturados da centralidade da Colônia Blumenau –
através de estradas, rios e ribeirões, com lotes de testada
pequena e grande profundidade, maneira de muitos terem
 acesso aos cursos d’água.
O traçado dos primeiros lotes urbanos surgiu a partir da localização e orientação do rio Itajaí Açu e ribeirões. Este cuidado estava relacionado à acessibilidade por esses caminhos naturais, e também, a facilidade do livre acesso à água, para fins de uso doméstico na propriedade e para irrigação da plantação.



Rua das Palmeiras no final do século XIX, com a presença do Hotel Brasil - lado direito.

Praça da Prefeitura/Porto com os registros da intervenção recebida na década de 1960, desde iluminação, equipamentos, infraestrutura e caminhos, interligando locais dentro do próprio centro histórico, com o caminho sob a ponte, ornamentado por um arco, que levava ao cemitério dos gatos e na propriedade de Hermann Blumenau. O croqui mostra exatamente o local da ponte construída em 202, para escoar mais veículos através deste local e impactou a ponte histórica e cobriu o caminho, que poderia ser resgata, proposta que apresentamos a Fundação Cultural, Prefeito e Secretários, quando éramos gerente do Patrimônio - em 2012. Ficamos no cargo um mês, quando percebemos que a gerência de Patrimônio de Blumenau era quase algo ornamental.






O porto fluvial e o Stadtplatz com toda a movimentação que tinha a centralidade da Colônia Blumenau em um tempo em que existia, dentro de seu território, a intermodalidade. Observar a presença do “esqueleto” do Ed. América – foto superior e o local do Clube na foto inferior.
História do Edifício América
Contraste do grão na paisagem histórica e precedente para repetir o malfeito.

O Edifício América foi construído no terreno onde já estava instalada a antiga sede do Clube Náutico América, ao lado da antiga Praça do Porto Fluvial da Colônia Blumenau. 
O Clube Náutico América foi fundado, por uma iniciativa de Amadeu Felipe da Luz, em 20 de outubro de 1920, tendo sido local de práticas desportivas de mais de uma geração, ligadas ao remo praticado nas águas do rio Itajaí Açu.
Com uma história que se confunde com a história de Blumenau, o clube inaugurou sua sede ao lado da praça do porto, na frente da municipalidade, na margem direita do Itajaí Açu. A história avalia que passaram pelo clube mais de 5 mil atletas. Registramos seus participantes em alguns desfiles de aniversário da cidade, ostentando equipamentos e troféus.
Antiga sede do Clube Náutico América localizada na Rua XV de Novembro – Fundos – o mesmo local do Edifício América. Fonte: Fundação Cultural de Blumenau.
Udo Teske no desfile do aniversário da cidade,
2 de setembro de 2009.
Atualmente a agremiação faz parte do Programa de Iniciação Esportiva, coordenado pela Secretaria Municipal do Esporte (SME) e oferece aulas de remo para jovens de 10 a 17 anos de idade, de forma gratuita. Há três anos, também passou a oferecer, em parceria com a Associação de Paradesporto de Blumenau (Apesblu) e a Confederação Brasileira de Remo (CBR), aulas por meio do para-desporto às pessoas com mobilidade reduzida.
O Clube Náutico América possuía sua sede própria, localizada ao lado da Praça do Porto – conhecida Praça Hercílio Luz. O seu terreno, de 1408m2, foi emprestado, através de concessão pelo estado de Santa Catarina, ao Clube Náutico América, em 29 de outubro de 1936, por meio da Lei 114/193636.
A documentação do PA 1.33.001.000809/2007-18 assim esclarece: 
(...) em 29/08/1962 foi lavrada escritura pública em que o Estado de Santa Catarina doava ao Clube Náutico América o terreno situado na Rua XV de Novembro, matriculado sob o n°
15.855, 1° Oficio do Registro de Imóveis de Blumenau, conforme descrição na fl. 128 do referido PA. A doação foi feita com a condição de que o donatário, mesmo vendendo o
imóvel, em parte condominiais, conservasse para si a propriedade do porão, do pavimento térreo e do primeiro pavimento (Leis Estaduais n°S 114/1936 - fl. 134; e 3.051/1962 - fl. 133 do PA anexo). Segundo interpretação do signatário (pois o texto da fl. 128 é pouco claro), a parte condominial do Clube Náutico América é intransferível, salvo para entidade destinada aos mesmos fins dos desportos do remo e natação e haverá reversão para o doador Estado de Santa Catarina, desde que o proprietário não corresponda mais à finalidade principal a que está destinado (desenvolvimento dos desportos do remo e natação). 

Portanto, emprestado para o "esporte". Isso aconteceu em solenidade, na Assembléia Legislativa do Estado de Santa Catarina - em 1936, quando foi oficiado o empréstimo do terreno ao Clube Náutico América de Blumenau. Em 1937, o interventor - Governador Nereu Ramos, homologa a concessão e neste mesmo ano, o clube se instala no local
Em 1962 é lavrada a escritura publica, tornando o empréstido, uma doação do terreno e entregue a concessão ao Clube Náutico América. O clube estava com problemas.
E adiantamos que o Edifício América recebeu esse nome porque o terreno, no qual começou a ser construído em 1977, foi cedido pelo Clube Náutico América, neste momento, já proprietário do terreno doado pelo estado de Santa Catarina.
Para esclarecer - em 29 de agosto de 1962 foi lavrada a escritura pública do terreno, onde o Estado de Santa Catarina doava ao Clube Náutico América o terreno localizado na Rua XV de Novembro, matrícula 15.855. A aconteceu sob a condição de que o Clube Náutico América, mesmo comercializando o imóvel em partes condominiais, conservasse para si a propriedade do porão, do pavimento térreo e do primeiro pavimento. No entendimento do Ministério Público Federal, a parte condominial em questão é intransferível e ser for, somente quando seu uso for destinado para os mesmos fins - a prática do remo e da natação. Se assim não fosse, naturalmente haveria a reversão do imóvel para o doador, no caso o Estado.  
Até 1976, o Clube Náutico América, que contava com 56 anos de existência, estava instalado na antiga sede do clube, demolida neste ano de 1976, para que a obra do Edifício América inciasse. Todo esse processo aconteceu, porque, em troca, no projeto do edifício, estavam previstas as novas instalações do Clube Náutico América, distribuídas em três pavimentos, localizadas na parte posterior do edifício, de frente para o Rio Itajaí Açu.
Essa solução surgiu porque, na época em que o projeto foi anunciado, janeiro de 1977, o Clube Náutico América se encontrava  com  dificuldades financeiras, que poderia levá-lo a extinção. O terreno usado pelo clube, que era emprestada sob concessão pelo Estado, deveria, caso isso acontecesse, ser devolvido ao Estado. Por isso, o Estado executou uma alteração no despacho, concedendo permissão para a construção do edifício.
O projeto original contemplava um Programa de Necessidades para um edifício de quinze pavimentos, anunciado como sendo a “primeira torre de vidro de Blumenau”. A previsão era de que a nova sede do Clube Náutico América estaria pronta em outubro de 1978, o que não aconteceu. 
Uma das perspectivas do projeto. Fonte: WITTMANN, 2007.





De acordo com Isabel Wittmann, 2007, na gestão do ex-prefeito Renato de Mello Vianna, a prefeitura, através de um decreto, pediu a desapropriação da área, alegando ser esta de utilidade pública. O objetivo da administração pública era impedir a construção do edifício, com este gabarito de 15 pavimentos, no local, para “preservar o aspecto paisagístico” daquela área da cidade.
A direção do Clube Náutico América da época alegou que tal medida era ilegal e se caracterizava com sendo abuso de poder, além de ferir o direito de uso do terreno concedido pelo Estado de Santa Catarina.

O clube tentou impedir, mas em 1º de novembro de 1978 a obra foi judicialmente embargada. A estrutura da obra já estava erguida até o décimo pavimento. Nessa carcaça abandonada pela prefeitura, o Clube Náutico América reconstruiu sua sede, já que teve negada a autorização da prefeitura de construir uma nova edificação.
Até hoje o subsolo e o térreo do edifício permanecem em uso, com instalações improvisadas e mesmo fechadas com tapumes, enquanto todo o restante está desocupado. Isabel Wittmann, 2007.

Efetivamente, para registro histórico, em 1977, na primeira gestão do prefeito Renato de Mello Vianna, a empresa RB Planejamento recebeu a permuta estadual para construir um edifício residencial no local, iniciando obra desta relevância, no Centro Histórico de Blumenau, sem maiores debates na cidade e sem o consentimento da administração pública de Blumenau, que tentou impedir a construção, movida pela consciência do impacto da presença do edifício no centro histórico da cidade.
A antiga sede do Clube Náutico América foi demolida em 1976. O projeto previsto para o edifício a ser construído para uso residencial teve uma grande campanha publicitária para a época, e propagava requinte, arquitetura arrojada e um gabarito final de 15 pavimentos. Observar o material publicitário apresentado pela RB Planejamento, que prometia, além de um grande hall social com pé-direito duplo, revestimento de mármore nas fachadas, com vista voltada para o rio Itajaí Açu e para a área central, um elevador para automóveis, dando acesso às garagens anexadas ao lado dos apartamentos.

Publicidade do Edifício América de 1977. A única informação que reporta a existência do ambiente histórico do Vale do Itajaí é a indicação da Prefeitura Antiga. Não mencionam a centenária igreja luterana construída com arquitetura no estilo neogótico, a Palmenalle – Rua das Palmeiras, o antigo porto e a casa de Hermann Wendeburg. A apropriação do espaço é plena, utilizando a antiga Praça do Porto, como “jardim” do empreendimento.

Perspectiva do edifício com 18 pavimentos e linhas modernas com paredes envidraças dotadas de brises.
Planta Baixa Humanizada. Chamou-nos a atenção, a presença de longos corredores no interior do apartamento – mostrando uma planta nada funcional. O apartamento contava com duas suítes, dois quartos, banheiro social, cozinha com dependência de funcionário, copa, lavabo, vestíbulo, salas de jantar e estar e escritório. A grande sacada tinha acesso pela suíte máster e pelas salas de jantar e de estar. O apartamento tinha a entrada de serviço e social Apartamento de alto padrão em pleno Stadtplatz de Blumenau.






Parte da propaganda: “Região privilegiada”.

Início da Construção do Edifício América – 1977 – e os impedimentos

No ano seguinte ao da demolição da primeira sede, em 1976, iniciou a construção da estrutura do Edifício América. A obra não seguiu por muito tempo, pois em 1978, foi formalmente embargada mediante ato do MPF – Ministério Público Federal. Neste ínterim, foi encontrada outra irregularidade que poderia impedir a construção deste grande edifício no Centro Histórico de Blumenau. Foi constatado que a sua construção estava irregular também, porque estava sobre a faixa de proteção ambiental ANEA – do Código Florestal, que também registramos, nas proximidades, a construção de uma fábrica de cerveja sobre a praça, localizada ao lado, Praça Hercílio Luz ou antiga praça do Porto de Blumenau, ocorrida na década de 1990.
O Código Florestal Brasileiro – lei federal, estabelece uma faixa ao longo do rio, como Área de Proteção Permanente – APP. No caso do rio Itajaí Açu, que apresenta sua caixa superior a 100 metros, sua APP é de 100 metros – não podendo ser aterrado e nem receber construções, muito menos um edifício de mais de 15 pavimentos, além do fato de este estar sendo construído no Centro Histórico de Blumenau – no Centro Histórico do Vale do Itajaí.

A determinação se dá pelo fato de a estrutura ter sido erguida em um terreno de preservação permanente, que pertence à União. Apesar de o município ter autorizado a construção em 1991, a decisão conflitou com a legislação federal. Após o governo federal e o Ibama não tomarem providências, o Ministério Público decidiu intervir. Kienen, 2021

Todos estes exemplos citados, não são argumentos para justificar a permanência deste edifício no Centro Histórico de Blumenau, cujo “grão” da escala urbana é outro e destoa da paisagem histórica, e também, encobre a vista do rio para aqueles que circulam na PalmenalleRua das Palmeiras e na Igreja Luterana Centro – Espírito Santo, entregue à comunidade totalmente restaurada, em 2022.
Alguns noticiaram o fato de ferir o Plano Diretor – esfera local. Se fosse somente esta questão e somente na esfera municipal – o edifício já estaria terminado. Um exemplo disto, é de como mudaram a Lei municipal para viabilizar uma construção irregular na Praça Hercílio Luz, do porto, ao lado do Edifício América – figura anterior, onde o plano diretor não permitia a construção da fábrica na Zona Patrimônio Histórico – ZPH. Só que nos fez ponderar, que também está sob a mesma Lei Federal, ou seja, sobre área de proteção, não somente do rio Itajaí Açu, mas também do ribeirão Garcia. Somente por estar sob observação de Lei Federal, a obra não foi terminada.
Com isso, em 28 de fevereiro de 1982, o projeto a ser construído no imóvel, foi modificado. A RB Planejamento muda o projeto que passou a ser para o uso de um Hotel de 18 pavimentos. Em 1985, foi readequado o plano diretor de Blumenau, no governo do ex-prefeito Dalto dos Reis. Em 19 de dezembro de 1985, uma primeira construtora recebeu o Alvará N° 4.091/85 do Município de Blumenau para a construção de um edifício sobre o terreno do Clube Náutico América. As obras retornaram no ano seguinte, em 1986, quando em 12 de junho de 1986 houve a promessa de compra e venda do imóvel, a formalização de intenção de construir o Edifício América no imóvel e a incorporação pela empresa. Passaram-se 12 anos até que esta construtora ficou sem recursos. Em 1997, de acordo com o Blog de Adalberto Day, a RB Planejamento suspende os trabalhos no Edifício América.
Para registro, a informação do Site de JusBrasil, diz que a RB Planejamento têm 146 processos nos Diários Oficiais. Desses processos encontrados, o advogado envolvido no caso, foi a parte que mais apareceu, seguindo-se o Município de Blumenau. No interior deste processo deve estar o registro dos fatos históricos, que permitiria uma pesquisa mais bem detalhada. Ainda de acordo com o Blog de Adalberto Day, em 1997, a Itacolomi Incorporações Imobiliárias Ltda se interessou pela obra e pelo projeto, e que tem como um dos sócios, o advogado.
Entre os anos de 1997 e 2006, a obra recebeu alguns avanços, completando 10 pavimentos. Em 29 de junho de 2007, a R.B. Planejamento vendeu o imóvel para Itacolomi Incorporações Imobiliárias Ltda, ocasião em que esta recebeu um novo alvará de construção datado de 18 de março de 2008. Neste tempo de 2008, através da Gerência Regional do Patrimônio da União – GRPU se manifestou, declarando que a construção do imóvel do Clube Náutico América está em área que ligado a marinhas e, portanto, submetido à legislação federal. Seria o que denominamos de ANEA – Área não aterrável e não edificável. A Gerência Regional do Patrimônio da União – GRPU se posicionou, declarando que a construção sobre o imóvel do Clube Náutico América está sobre área de preservação permanente, o que chamamos de APP. Coisas que vemos acontecer com frequência na cidade de Blumenau, nos últimos tempos.
O Município de Blumenau tentou regularizar a construção do Edifício América em 1991, mas havia o conflito com a legislação federal. O Ministério Público Federal alertou sobre a questão, em se tratando de área de preservação permanente – APP, mas não houve iniciativa por parte da União e nem tão pouco, do IBAMA, para impedir a construção irregular na APP. Nas folhas 25-65 do PA há laudo pericial extraído dos autos 2005.72.05.002212-3, relativo ao terreno do Clube Náutico América. Nas folhas 31 e 32 há transcrição do parecer da Gerência Regional do Patrimônio da União, esclarecendo que o terreno está em área da Marinha, que chamamos de APP – Área não aterrável e não identificável. O perito Cássio R. P. Modotte alerta que o terreno do Edifício América está em área da marinha. Na fl. 22, a Gerência Regional do Patrimônio da União declara que a construção erguida sobre o imóvel do Clube Náutico América interfere (12m2), com a área presumidamente da União. Esclarece que os 12m se situam sobre os 33 metros que partem da margem do rio Itajaí Açu e que são os 33 metros mencionados no art. 2° do Decreto-Lei n° 9.760/1946. Esclarece que o Edifício América construído sobre o terreno do Clube Náutico América, matriculado sob o n° 15.855, está na área de preservação permanente prevista na redação original do art. 2°, “a”, 2 da Lei n° 4.771/1965 (Código Florestal) – 75 m, considerando a estimativa do Ministério Público Federal de que a largura do Rio, no local dos fatos, é de 150m.
O Município de Blumenau, no governo do ex prefeito Victor Fernando Sasse, se manifestou em 1991 afirmando ser regular a construção de 18 pavimentos no Centro Histórico de Blumenau. Não lembramos de qualquer debate público nesta época avalizando esta regularidade, sendo que quase nesse mesmo período – década de 1990, existiu o debate sobre a construção na Praça Hercílio Luz – praça do porto, com final da história no tempo presente, com sua irregularidade declarada pelo Ministério Público.
Na época o Ministério Público Federal solicitou que fosse  trocado o nome de Itacolomi Incorporações Imobiliárias por Clube Náutico América, o que não foi aceito. Itacolomi contestou, argumentando que o Estado de Santa Catarina tinha o domínio do imóvel e que como tal, o repassara, a título precário e gratuito, ao Clube Náutico América, constando no imóvel desde a sua fundação, em 1920. Nós afirmamos, que esta situação não significa ser legal – de legalidade – ou signifique estar a construção de acordo com o ambiente do Centro Histórico de Blumenau, com a presença de um edifício de mais 15 pavimentos, considerando-se que novo projeto previa 18 pavimentos.
Em 2008, o Ministério Público acionou a justiça e cobrou a demolição do Edifício América, alegando que o prédio se localiza em Área de Preservação Ambiental. O IBAMA solicitou seu embargo.
Parte do argumento usado pelos interessados em concluir o edifício no Centro histórico de Blumenau no processo:

"(...) o imóvel está localizado em área urbana, devendo ser obedecido o disposto no plano diretor, na lei de loteamento e parcelamento do solo urbano e legislação municipal a respeito, sendo atribuição da Municipalidade a fiscalização. (...) a proteção ambiental perseguida exige que se dê continuidade às obras, porque eventual demolição seria mais grave e drástica do que a sua manutenção, tendo em vista que o imóvel já se incorporou à paisagem." 

Nosso Comentário (1):

Vamos nos manifestar sob a ótica do urbanismo e observar a zona na qual o terreno do Edifício América está localizado. O local é uma Zona de relevância histórica, e não se trata de qualquer “área urbana” disponível à ação de parcelamento de solo. A fiscalização deste local, vai muito além de incumbência da Municipalidade e por certo, também está sob a avaliação do Conselho Municipal do Patrimônio Cultural Edificado – COPE e da Câmara de Vereadores, por se tratar de uma área especial, dentro da cidade de Blumenau – seu Centro Histórico. Antes do foco da legislação federal, existe a estadual e a municipal e é claro que esta estrutura de 10 pavimentos se incorporou a paisagem, como mencionam, mas de maneira muito negativa, diante do impacto que causou à toda a paisagem histórica e natural e que ainda se encontra lá, portanto, meio ambiente, que, efetivamente, é a somatória das duas paisagens.

Meio ambiente é a integração e a interação do conjunto de elementos naturais, edificados, culturais e do trabalho que propiciem o desenvolvimento equilibrado de todas as formas, sem exceções. É o resultado da integração entre as paisagens naturais e construídas; portanto, no Centro Histórico de Blumenau, o meio ambiente pode estar sendo agredido, não como os ecologistas apontariam, mas mediante o impacto da presença de um edifício de alto gabarito na paisagem final – ou no meio ambiente deste centro histórico.
A hipótese é que as relações prevalentes entre sociedade e meio ambiente tão fortemente condicionados pelas relações que predominam no âmbito da própria sociedade. O que é meio ambiente? O que é sociedade? Por que as coisas são assim e não de outro modo? Para todos os efeitos, o meio ambiente não é composto apenas por flores e passarinhos; trata-se de um sistema complexo, cujo funcionamento ainda está sendo desvendado, considerando-se o grau de informação disponível. todavia, meio ambiente com certeza não é natureza (intacta) simplesmente, meio ambiente é natureza modificada.  Ivo Theis

Diante do debate e ao lado dos interessados em concluir o Edifício América, o Município de Blumenau se posicionou (2008) – no governo do ex-prefeito João Paulo Kleinübing, dizendo:

(…)que o Código Florestal se aplica apenas às zonas rurais e que a Lei 6.766/79 atribuiu plena competência para os municípios autorizarem o licenciamento dento da zona urbana desde que obedecidos seus preceitos, estabelecendo-se uma faixa não edificável de 15 metros no mínimo, deixando-se a critério dos Municípios, em sua legislação, a fixação de outros limites. Destacou que a localidade onde se situa o Edifício América, tipo por agredido em seu aspecto ambiental, faz parte de região já povoada há muitos anos, tornando-se uma situação consolidada para efeitos urbanísticos, não caracterizando os prejuízos ambientais alardeados na petição inicial, pois nos arredores já existe ocupação por estabelecimentos comerciais e residenciais. 

Perguntamos – então teríamos arranha céus nas cidades barrocas mineiras e em plena praça do Louvre, em Paris? Afinal tem um tempo de povoação um pouquinho maior. 

Nosso Comentário (2)

Estão analisando a questão com outro foco – aliás, desfocados. O meio ambiente mencionado – é o ambiente resultante da somatória das paisagens naturais e edificadas, sendo esta segunda, neste caso, a paisagem mais histórica do Vale do Itajaí e à exemplo, de conjuntos históricos como Ouro Preto MG, mesmo que sejam consolidadas há muitos anos, as mais antigas existentes devem ser preservadas e cuidadas como conjunto. Há muito tempo estas “forças invisíveis” tentam ocupar o Centro Histórico de Blumenau – algumas coisas já fizerem. O lobby é muito grande apresentado com “jogo de palavras” e narrativas como esta. Estamos listando alguns exemplos na série Arquitetura/Projeto Memorvale. Tanto é assim, como comentamos, que projetos que tentam ser construídos no Centro Histórico, no mínimo, devem ser submetidos ao Conselho Municipal do Patrimônio Cultural Edificado – COPE, formado por representantes de departamentos públicos de Blumenau e da sociedade blumenauense. Quanto à lei federal de marinha, as restrições são para áreas urbanas e rurais. Isto antes desta nova lei que foi alardeada, após aprovação no Senado Brasileiro, em janeiro de 2022.

Tudo isso aconteceu em 2008, quando, também, o Tribunal Federal da 4ª Região anulou o ato e determinou a realização de prova pericial.
A obra do Edifício América ficou parada, quando em 2011 ressurge o debate na cidade sobre seu futuro, mediante a possibilidade da construção de uma nova ponte sobre o rio Itajaí Açu na região do Bairro Vorstadt. Em 10 de outubro de 2011, a Justiça Federal determina a demolição do Edifício América, podendo este processo de demolição durar até 6 anos. Como isso aconteceu?
Neste debate em processo de 2008, foi levantado sobre a legitimidade da doação do terreno ao Clube Náutico América feita pelo Estado de Santa Catarina. Alegou-se que parte do terreno era parte de terras da marinha, portando não era propriedade do Estado e não poderia ser doado, pois era propriedade da União. Mais esta questão, além da ilegitimidade de se construir um edifício de 18 pavimentos no Centro Histórico de Blumenau. Foi concluído que quem não é proprietário não pode transferir validamente, propriedade que não tem. Pautado nestas questões e de que o edifício tem sua construção iniciada em áreas de APP, o TRF – 4° determinou a realização de perícia, para definir: “a existência de dano ambiental e a alternativa mais benéfica ao meio ambiente na equação dos autos – demolição ou não da construção; a existência de dano ambiental, a forma de recuperação deste dano, (…).” Esta é uma das questões, que está sob legislação federal, mas lembramos que temos legislações estadual e municipal na esfera do Patrimônio Cultural quanto a este impacto na Zona Histórica de Blumenau. Deve haver um debate público pautado sobre esclarecimentos.
Como é sabido, a demolição não aconteceu.
A história muda em 2018, quando o Engenheiro Florestal Dagoberto Stein Quadros (Pancho – 2018) assinou um laudo técnico solicitado pela Justiça Federal e foi o único representante técnico a assumir a responsabilidade pela decisão, de que manter a estrutura do Edifício América no local era mais benéfico ao meio ambiente do que demoli-lo.

Nosso Comentário (3)

 Na qualidade de urbanista, percebemos controvérsias e passíveis de revisão sob a ótica legal nesta argumentação. Deveriam ser observados laudos de outras áreas das ciências envolvidas e que fazem parte do debate do meio ambiente, que poderá ser o construído e o natural e, entre estes, está contemplado, também o histórico. Assim a decisão impetrada pela Justiça Federal de Blumenau pela demolição do Edifício América foi anulada pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF4), mediante a apresentação do laudo de um Engenheiro Florestal. No entendimento do órgão regional, faltava uma perícia para avaliar o que traria mais danos ao meio ambiente: (meio ambiente não é composto somente pela paisagem natural): a demolição ou a conclusão da obra.

Onze anos depois, em abril de 2021 a Justiça Federal decide, novamente, pela demolição da estrutura do Edifício América. O juiz federal substituto Leandro Paulo Cypriani da 1° Vara Federal de Blumenau determina, através de uma sentença em ação civil pública movida pelo Ministério Público Federal que aconteça a demolição.
De acordo com a sentença, o Clube Náutico América, a primeira construtora, a segunda e a Prefeitura Municipal de Blumenau foram intimadas a providenciar a demolição da estrutura, a remoção parcial das fundações e a recuperação da área de preservação permanente natural, junto ao rio Itajaí Açu.
Para isso, o grupo envolvido recebeu o tempo de 15 dias para se manifestar. Os envolvidos receberam o prazo de um ano para demolir o edifício e parte da fundação dele, para realizar um serviço de terraplanagem no terreno e emitir um laudo técnico da situação dele para que a preservação da região seja retomada. Os gastos serão dividimos igualmente entre as empresas e o Município de Blumenau.
Recebemos a notícia da demolição do Edifício América no meio da reunião do Conselho do Patrimônio Cultural Edificado – COPE, na qual debatiam a HAVAN no Centro Histórico de Blumenau, anunciada pela Procuradora da República Rafaella Alberici, em 28 de julho de 2021.
O advogado das duas construtoras e também sócio da primeira, disse a um veículo de comunicação, que recorreria ao TRF4, como foi feito na decisão anterior. Segundo ele, a sentença do juiz não levou em conta as duas “perícias” que foram feitas no local nesse período e que teriam deixado claro que o melhor para o meio ambiente (O que é meio ambiente?) seria a conclusão da obra, que não procede.
Meio Ambiente é formado pela paisagem natural e construída – no caso, o ambiente mais histórico do Médio e Alto Vale do Itajaí – Centro Histórico de Blumenau.
Este volume de um edifício de 18 pavimentos, que é o Edifício América é irregular, porque destoa da paisagem histórica predominante no meio ambiente e de seu grão. Nosso parecer é igualmente técnico, da área de Urbanismo e Arquitetura, com mestrado em Urbanismo, História e Arquitetura da Cidade – 2008, UFSC, Florianópolis SC.

As imagens comunicam e o precedente aberto é danoso a Blumenau, do futuro, às gerações futuras, quando estes personagens não estarão mais presentes, mas somente na História, como os responsáveis pelo feito.


“A inobservância dos prazos estabelecidos ao cumprimento das determinações precedentes implicará, a cada um dos demandados, ora condenados, em multa diária de R$ 1.000 em caso de injustificado descumprimento e inicialmente pelo prazo de dois meses”, decretou o juiz.
A reportagem entrou em contato com o escritório de advogados, que representa o Clube Náutico, e com a Prefeitura de Blumenau. Porém, não obteve retorno até esta publicação.
A Prefeitura de Blumenau encaminhou à reportagem uma nota oficial sobre o caso.
Nota Oficial da Prefeitura Municipal de Blumenau

Em relação à determinação judicial que prevê a demolição do Edifício América, a Prefeitura de Blumenau entende que aplicou a legislação municipal vigente à época, não havendo motivos para a responsabilização do município no que tange à demolição. Desta forma, a Procuradoria Geral do Município informa que irá recorrer da decisão. Kilian, 2021.










Percebemos que foram  iniciados lobbies, para o término do Edifício América com argumentos não vistos antes na sociedade de Blumenau, como por exemplo, “Sustentabilidade”. A palavra que possui lastro na Europa, que não promove demolições da história, por valor e respeito à história local, mas também, para não gerar entulhos e “gastar” material novo, que demanda energia. O que, de fato, não acontece em Blumenau, que promove a demolição de sua história paulatinamente. Os lobbies, também chegaram em Brasília, no Senado Brasileiro.
E como disse o repórter Pedro Machado do NSC Total, em publicação de 8 de janeiro de 2022, “uma recente alteração no Código Florestal abriu um novo, e que pode ser decisivo, capítulo na novela que envolve o Edifício América.” O grupo interessado tomou providências e foi para Brasília mexer” na legislação Federal.
Ainda de acordo com o jornalista: – “…Lei federal sancionada no apagar das luzes de 2021 dá aos municípios poder para regulamentar faixas de restrição à beira de rios, permitindo a regularização de edifícios construídos às margens de cursos d’água em áreas consideradas urbanas.” Para ilustrar esta decisão, usaram esta fotografia, apresentando os laços da modificação da Lei Federal com o caso de Blumenau. Agora , “a bola da vez” está nas mãos da Prefeitura. Quem sabe sigam o exemplo dos legisladores da década de 1970.
Senado usa foto do Edifício América, de Blumenau, em post sobre construções próximas a rios. Esta é a fotografia que ilustrava a mudança da lei no Senado brasileiro das áreas de preservação, em Brasília - inicio de janeiro de 2022. O Lobby foi grande.
Não encontramos a matéria com a foto mencionada por Machado, mas encontramos esta notícia.

O Centro Histórico de Blumenau não poderia receber essa “verticalização” por outras questões, não relacionadas somente somente ao ambiente natural e ecológico. Devem ser criadas áreas especiais, projetadas, dentro do território do município para receber áreas com verticalizações, munidas de infraestrutura adequada, como esgoto, abastecimento e escoamento, não esquecendo do transporte público de qualidade. Mas jamais permitir, verticalizar “sobre” o espaço da história de uma cidade.
O Centro Histórico de Blumenau, a exemplo de outros, deveria ser tombado como conjunto, imediatamente.





Referência

• AMÉRICA precisa da sua nova sede, O. Jornal de Santa Catarina, Blumenau 1 agosto. 1979.
• BERTOLI, Bianca. Justiça determina demolição do esqueleto do Edifício América, no Centro de Blumenau. 22/04/2021 – 14h31 – NSC Santa. Disponível em: https://www.nsctotal.com.br/noticias/justica-determina-demolicao-do-esqueleto-do-edificio-america-no-centro-de-blumenau. Acesso em 10 de janeiro – 20:15h.
• DAY, Adalberto. Edifício América. 21 de julho de 2010. Disponível em: https://adalbertoday.blogspot.com/2010/07/edificio-america.html. Acesso em: 10 de janeiro de 2022 – 18:54h.
• JUIZ aprova embargo da nova sede do América. Jornal de Santa Catarina, Blumenau 1 julho. 1978.
• KIENEN, Alice. Justiça Federal decide pela demolição de prédio no Centro de Blumenau. 22/04/2021. Disponível em: https://omunicipioblumenau.com.br/justica-federal-decide-pela-demolicao-de-predio-no-centro-de-blumenau/. Acesso em: 10 de janeiro de 2022 – 15:08h.
• KORC, João Vitor Korc. Clube Náutico América completa 100 anos de fundação. Prefeitura de Blumenau. Secretaria do Esporte. Disponível em: https://www.blumenau.sc.gov.br/secretarias/fundacao-de-desportos/fmd/clube-naautico-amaerica-completa-100-de-fundaacaao86 . Acesso em 10 de janeiro de 2022 – 20:36h.
• MACHADO, Pedro. Prédio de luxo de Blumenau condenado à demolição é candidato a “novo edifício América”.04/11/2023 – 11h05 –  Disponível em: https://www.nsctotal.com.br/colunistas/pedro-machado/senado-usa-foto-do-edificio-america-de-blumenau-em-post-sobre-construcoes . Acesso em: 8 de novembro de 2023 – 08:34h.                        • MACHADO, Pedro. Senado usa foto do Edifício América, de Blumenauem post sobre construções próximas a rios. 31/12/2021 – 08h50 – Atualizada em: 31/12/2021 – 09h19. Disponível em: https://www.nsctotal.com.br/colunistas/pedro-machado/senado-usa-foto-do-edificio-america-de-blumenau-em-post-sobre-construcoes . Acesso em: 10 de janeiro de 2022 – 21:34h.
• PANCHO. Justiça Federal decide pela demolição do esqueleto do Edifício América, no Centro de Blumenau. 22/04/2021. Disponível em: https://pancho.com.br/justica-federal-decide-pela-demolicao-do-esqueleto-do-edificio-america-no-centro-de-blumenau/ . Acesso em: 11 de janeiro de 2022 – 00:27h.
• SENADO BRASILEIRO. Senado aprova projeto que permite edifícios às margens de rios e lagos em área urbana. Fonte: Agência Senado.Disponível: https://www12.senado.leg.br/noticias/materias/2021/10/14/senado-aprova-projeto-que-permite-edificios-as-margens-de-rios-e-lagos-em-area-urbana Acesso em: 11 de janeiro de 2022 – 17:45h.
• THEIS, Ivo M. Desenvolvimento e meio ambiente em Santa Catarina:a questão ambiental em escala local/regional /Ivo M. Theis (organizador). -Joinville : Ed. UNIVILLE, 2006. – 176 p. :il.
• WITTMANN, Isabel. Espaço – Arte em Blumenau. TCC Arquitetura e Urbanismo UFSC – Florianópolis – 2007.

Leituras Complementares

Um registro para a História.

Sou Angelina Wittmann, Arquiteta e Mestre em Urbanismo, História e Arquitetura da Cidade.
Contatos:
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Um comentário:

  1. Sua postagem é uma obra-prima brilhante! Esclarecedora, bem articulada e verdadeiramente valiosa. Obrigado por compartilhar sua perspectiva.

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