terça-feira, 6 de julho de 2021

Cervejaria de Otto Jennrich - Itoupava Seca - Blumenau SC

Itoupava Seca atualmente é um bairro de Blumenau, mas no final do século XIX e início do século XX, foi uma povoação independente e autossuficiente conhecida como Altona, formada por imigrantes alemães e suas família originários do entorno de  Hamburg. Possuíam grandes estabelecimentos comerciais, um porto de cargas, estação e oficinas da ferrovia EFSC, industrias e como em regiões distintas na Alemanha, tinham uma certa competitividade com o Stadtplatz de Blumenau, cuja razão foi muito bem explicado pelo Pastor Hugo Solano Westphal, que de certa forma tem a ver com a região de origem destes famílias, cujo nome, na maioria dos casos, terminava com "sen". Exemplo: Clasen, Thomsen, Feddersen...entre outros e que foram dominados pelos alemães, no norte, de alguma maneira, seja religiosa ou militar, ao longo da história daquela região.  Nós assistimos as transformações nesta comunidade, quanto ao seu espaço, em função de decisões lamentáveis quanto ao urbanismo, nas últimas décadas, mediante ações tomadas, desconsiderando a história pretérita, o uso do espaço e a comunidade. O que restou se perder de vez, quando o
Bairro foi transformado em um corredor de fluxo rápido de Blumenau, desviado para passar na frente da Escola Municipal Machado de Assis - antiga Escola Alemã. Também outros bairros de Blumenau, como no  Bairro da Velha e Itoupava norte, desconsiderando a história pretérita dos locais, uso do solo e os residentes e comerciantes locais. O local dos interiores destes bairros se transformaram em corredor de fluxo de carro em velocidade rápida, e sem fluxo local e sem opções para estacionar. Registado para a História. 
Neste mês de julho encontramos ruínas de uma edificação da Altona, atual Itoupava Seca, quando fomos alertados por um descendentes destas famílias de Altona/Itoupava Seca, Gunther Ronald Ewald (da família do pioneiro Shönau), que disse:

"Minha prima Karin. Saudades da casa da tia,  onde brincávamos na antiga fabrica de balanças do tio, onde antes era a cervejaria. Meu tio Kielwagen era filho da Frau Max. Daquela construção que pertencia a E.M. Machado de Assis que derrubaram - antigo Hotel Altona
Os Kielwagen tinham Ferraria e faziam carroças e charretes ainda no centro de Blumenau, bem ali onde se sai pela Rua das Palmeiras. Depois compraram ali na Itoupava Seca, onde foi a fabrica da Cervejaria Jennrich. Ainda em ruínas o portal da antiga cervejaria e bem na frente tem vestígios do poço da cervejaria. Ao lado - morava o Farmacêutico Edir Thomsen era a casa do cervejeiro Otto...
Sem querer mencionar nomes do bairro, eram sobrenomes e empresas de muito peso cultural, politico e empresarial. Sempre foram famílias que traziam novidades da Alemanha. A Arquitetura seguia as tipologias no modelo de cidades Alemãs. Grandes construções. Sei onde ficava cada casa e negócios. Tudo por motivo do trem no bairro e do porto. 
Minha vó Frieda fazia calças e camisas no dia, para pessoas que vinham do interior fazer compras no Salinger e já levavam no dia. Quem lhe deu a primeira maquina costura e unica, que tinha a vida toda, foi o velho Fouquet.
Destas famílias que tinham terras que começavam na beira do Rio Itajaí Açú e iam até á  Vila Nova, onde depois, a terceira geração, em 1940, começaram a lotear a Vila Nova. As terras do meu trisavô Heinrich Shöenau eram onde, na rua Bahia, faz a curva, no local que o trem atravessava, vizinho dos Mathes e Reif. Ele faleceu cedo ai ficou a viúva Catharina, nascida de Lukas, sobrinha de Pedro Wagner.
Que pena que você não conheceu as grandes casas de comercio e clubes em enxaimel que tinham em Blumenau. Havia uma enorme na rua Bahia, onde é as Cristal Hering e logo depois tinha outra, mas eram enormes, como há de Jaraguá do Sul. Foi tudo demolido nas décadas de 1960 e 1970
Haviam muitas e muitas e não eram estas pequenas da colonia. Eram de comercio, com dois pavimentos, como havia em Rio do Sul - Südarm. 
Tiveram todas vidas curtas. Veio o "novo País" com a nova Capital Brasilia entrando em outro ritmo. Foi tudo muito rápido aqui no Sul, para retirar o "velho" e vir á nova Arquitetura. Uma verdadeira lástima. Se tivessem aguentado até os anos 90 talvez seria outra historia, mas não tenho certeza. Atualmente a Rua São Paulo é só um corredor de passagem. Acabou tudo, e agora como minha tia e outras famílias vão vender e tudo vai abaixo."
A Prima Karin Kielwagen Zattar em frente da casa da tia de Gunther.

Cabe a administração pública, através de uma equipe técnica "ordenar" o espaço da cidade. Neste período mencionado por Gunther, sobre a retirada de grandes tipologias enxaimel da paisagem, foi quando demoliram o lindo Hotel Holetz e construíram o Grande Hotel no seu terreno, em Blumenau. E até mesmo, construíram a nova igreja de Itoupava Seca, projeto do mesmo arquiteto que assinou o projeto do Grande Hotel. Demoliram a Igreja da Cruz. A Oficina de seu tio, e ruínas, é onde estava locada a antiga cervejaria e, em um tempo atrás, encontraram garrafas antigas no interior de seu muro. 

Cervejaria de Otto Jennrich 

Otto Jennrich. Quem não conhece, depois de passar alguns dias em Altona, ele, o afável e simpático tio de muitos, padrinho de 48 afilhados, que gosta de andar de tamacos sem usar meias, vestindo calça e camisa, e que apenas nos últimos anos, devido à obrigação da moda, nos feriados anda enfiado num colarinho alto? E se um viajante bem vestido também não o conhece, e pergunta para ele mesmo pelo "Otto Jennrich, dono da cervejaria daqui", ele logo passa a conhecê-lo e a estima-lo, e logo se sente em casa em sua tranquila sala da cervejaria, na qual inúmeros outros antes dele já passaram horas agradabilíssimas em conversas animadas e tomando uma boa cerveja, o que atestado pelos inúmeros e amáveis cumprimentos em cartões postais, vindos de todos os países." MAX HUMPL, 1918.

Otto Jennrich nasceu  em 29 de julho de 1868 no Barracão dos Imigrantes no Stadtplatz da Colônia Blumenau, exatamente 14 dias após a chegada de seus pais, que de 8 de abril até 15 de julho fizeram uma viagem penosa em um veleiro partindo do Porto de Hamburg - chegando no porto de Itajaí.
De acordo com relato do Professor Max Humpl, seus pais foram viver em Warnow, até que foram surpreendidos por um ataque de índios. O tio de Jennrich foi morto neste ataque. Após o episódio, mudaram-se para Indaial. Aos 14 anos, Otto Jennrich  foi residir com Carl Friendenreich, para participar do ensino confirmatório em Blumenau, onde só ali havia confirmação, tornando-se comum as crianças residirem em Blumenau ou, em Altona, para tal. De 1883 até 1891, Otto Jennrich  trabalhou na primeira cervejaria de Blumenau - a Cervejaria Hosang, por um salário inicial de 6.000 réis. Na época que Professor Humpl (1918) fez estas anotações, o mesmo salário era 50.000 réis.
Ainda de acordo com a narrativa do Professor Max Humpl, Otto Jennrich tornou-se independente quando comprou, em Altona, um terreno de 10 jeires junto com uma casa de madeira onde montou o museu - de August Daniel Persuhn. Logo construiu uma pequena cervejaria com uma capacidade de produção de 250 garrafas por caldeirada de cerveja. Em 9 de maio de 1891, em Altona/Itoupava Seca, foi servida a primeira "Jennrich"



"Uma pequena e singela casa de madeira abrigava o Museu de Altona, mais um “gabinete de curiosidades”. Seu primeiro proprietário foi August Daniel Persuhn, entre 1873-91. Um pequeno negócio, um comércio de escovas, bar e jogo de Skat. Depois passou para Otto Jennrich que, em 1897, mudou-se para outra casa e o local, além de “Museu”, servia para abrigar até 9 pessoas, aos quais diziam ser a “casa dos pobres”. Alí morou um comediante de nome Aras que também fabricava molduras para quadros. August Franke, enquanto construía seu hotel, também se abrigou neste local. Na virada do século e nos primeiros anos de 1900, muita cerveja foi aí consumida. A enchente de 1911 danificou bastante este “templo das musas”. GERLACH, 2019.
 
Na taberna de Jennrich, quando ainda era um pequeno casebre, descrito pelo Professor Max Humpl, era o ponto de encontro dos amigos, onde se lembravam do Heimat, falavam de política, e bebia cerveja e vinho de laranja. No local também se jogava Skat. Entre os frequentadores estavam: Auerbach (Fundador da Electro Aço), Persuhn, Grassmann, Grahl, Em 1893, após a fundação de Teutônia, atual Ipiranga, a taverna foi fechada.
Em 1897, Jennrich comprou a casa com cozinha dos irmãos Persuhn, onde construiu sua casa, a do postal histórico, com a cervejaria que produzia 2.000 garrafas por caldeirada de cerveja.
Fonte: GERLACH, 2019.
O Museu - Apreciador da história, idealizou e fundou um pequeno museu junto a sua cervejaria onde organizou objetos históricos e etnográficos; exemplares de plantas exóticas, coleções de insetos e de moedas, minerais, fotografias antigas, rótulos de produtos industriais. 
Organizou e coletou uma série objetos relacionados aos primeiros tempos da colônia. O nome do museu ficou conhecido como “Museu Jennrich” ficou tão conhecido quanto a sua cerveja que era comercializada sob vários rótulos, como: “Estrela”, “Polar”, “Kulmbach”. Quando Adolfo Schmalz, Hans Lorenz e Victor Gaertner instalaram um cinema em Altona/Itoupava Seca, a entrada, que custava 1$200, dava direito a três garrafas de “Jennrich-Einfach”, bebidas no próprio salão de projeção.
Fonte: GERLACH, 2019.
Jennrich nunca se casou. Fumava cachimbo e pito de fumo em corda. A cervejaria de Otto Jennrich passou, mais tarde, para a responsabilidade da “Cervejaria Blumenauense”, em sociedade organizada por Schmalz & Thiede e foi, depois, incorporada ao patrimônio da Antartica Paulista.
 “Cerveja do Jennrich e linguiça do Becker acalmam a fome e saciam a sede”.
 
"[...] a Cervejaria Jennrich, de Altona, que por vários lustros, foi o ponto de reuniões alegres dos apreciadores de cerveja daquele bairro. Mesmo de Blumenau, não poucos apaixonados da loura bebida, se reuniam no bar, que Jennrich preparara num compartimento da fábrica, mobiliado a capricho, à moda das tradicionais “Bierstube” da legendária Munique, com os seus jarros e canecões de barro e porcelana lavrada, ostentando figuras e legendas, ora sérias, ora brejeiras, com chifres e cabeças de veado e de outros animais enfeitando as paredes. [...] Ali as horas decorriam céleres, em barulhentas tertúlias, pela noite a dentro, sob o estourar das rolhas bombardeando o teto, donde guirlandas pendiam. Quando a pressão subia além do normal, começavam as cantorias [...]. (Ib.). SANTOS, 2013.




Carta de Paul Hering a Otto Jennrich
Blumenau, 5 de junho de 1902
Senhor Otto Jennrich, proprietário e Diretor do Museu Científico e Histórico-Cultural,
Peço desculpas pela minha letra tremida, mas a excitação, a terrível excitação é a única culpada desse fato. Imagine o senhor: acabei de fazer uma descoberta da maior importância para o mundo científico.
O dilema sobre o berço da humanidade praticamente acaba de ser resolvido. Não foi a Mesopotâmia, e sim Blumenau, o local dos primeiros seres humanos. Como provar tal afirmação? Ora, pela descoberta que eu fiz! Vamos aos fatos, antes mesmo que o senhor fique curioso. Durante a escavação de um poço encontramos um osso, numa profundidade de 10 metros. Este fato em si não teria qualquer significado, já que muitos ossos antigos se encontram abaixo da terra.
O que faz este osso ter tanta importância é um desenho gravado em sua superfície: duas figuras humanas. Se considerarmos que nossas terras foram habitadas há milhares de anos por indígenas, e se compararmos o aspecto e o vestuário reproduzidos neste desenho com a aparência e indumentária dos nossos índios, pode-se constatar imediatamente que esta reprodução nada tem a ver com os mesmos, mas certamente com seres humanos de uma cultura bem mais antiga, que, em termos de inteligência, em nada perde para a nossa atual. Da mesma forma, a sepultura com os restos mortais do homem faz lembrar um sofá ultramoderno contemporâneo. Por outro lado, vê-se a ilustração de um Marabú, pássaro que aparentemente nunca viveu nas Américas. Tudo isso indica uma procedência muito antiga desta peça. Certamente eu não estou equivocado em avaliar a idade deste osso em várias centenas de milhares de anos. Da mesma forma encontram-se palavras gravadas sobre a peça, sem qualquer semelhança com as mais antigas das nossas escritas; mais me parecem tais letras como símbolos
hieroglíficos, das tribos dos Hottentotten ou dos Urang-Otangos. Somente uma palavra tem uma leve semelhança com a expressão “Male”, e este fato me levou a uma reflexão.
O que o senhor acha? Não seria como se o homem, surpreso pelo aparecimento repentino de um ser feminino, exclamasse:
“Será que a minha Male ainda vive?”. Sim, sem qualquer sombra de dúvida, este é o significado deste símbolo, e então o senhor mesmo me diga: Não é maravilhoso que esta canção já exista há tantos milhares de anos, antes mesmo da criação do mundo, não, quero dizer, antes mesmo do dilúvio? O sagrado Ben Akiba não teria razão ao afirmar que: “Tudo já existiu em algum tempo remoto”? Pois então, excelentíssimo Senhor Diretor, eu lhe confio este osso, como uma doação ao Museu, com a única condição de que uma placa com o meu nome seja afixada ao seu lado, e que a mesma peça seja virada a cada meio ano, para que não fique mofada na parte inferior. Além disso, espero que nem orgulho nem vaidade tomem conta de seu coração na função de proprietário de um objeto tão valioso, e que o senhor
mantenha um olho atento aos cachorros da vizinhança, para que nenhum destes seres quadrípedes por engano desapareça com este osso cultural. Peço ao senhor que mostre este importante achado aos seus amigos e conhecidos, chamando à atenção dos estudiosos para o fato de que, já há milhares de centenas de anos, um povo culto viveu exatamente neste mesmo local, conhecedor da bela canção: “Será que a minha Male ainda vive?”.
Seu devoto, Paul Hering. 




A ruínas da Cervejaria de Otto Jennrich em 2021 - em memória à História de sua história.
Registro para a História.















 


Referências

CERVEJARIA Otto Jennrich. Disponível: <http://cervisiafilia.blogspot.com.br/2011/03/cervejaria-ottojennrich.html>. Acesso em: 05 de julho de 2021.

GERLACH, Gilberto Schmidt. Colônia Blumenau no sul do Brasil.  Gilberto Schmidt-Gerlach, Bruno Kilian Kadletz, Marcondes Marchetti, pesquisa; Gilberto Schmidt-Gerlach, organização; tradução Pedro Jungmann. – São José : Clube de Cinema Nossa Senhora do Desterro, 2019. 2 t. (400 p.) : il., retrs.

HUMPL, Max. Crônica do vilarejo de Itoupava Seca : Altona: desde a origem até a incorporação à área urbana de Blumenau 1.ed. Méri Frotschter  Kramer e Johannes Kramer (organizadores). Escrito em 2018. Blumenau: Edifurb, 2015. 227 p. : il.

SANTOS, Rafael dos. As microcervejarias catarinenses: da gênese à dinâmica atual / Rafael dos Santos; orientador, Aloysio Marthins de Araújo Júnior - Florianópolis, SC, 2013. 198 p.

SILVA, José Ferreira da. A História das antigas cervejarias de Blumenau. Blumenau, Revista Blumenau em Cadernos, Fundação Cultural de Blumenau, tomo III, n. 9, set. 1960.
















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